
Achaque levaria a Coreia do Sul à repetição da “crise financeira de 1997”, disse o presidente Lee Jae Myung
Declaração do presidente Donald Trump de que a Coreia do Sul iria desembolsar “antecipadamente” os US$ 350 bilhões previstos no acordo verbal do tarifaço entre Seul e Washington de julho, levou o presidente Lee Jae Myung a advertir que isso não era viável, já que a economia do país, a quarta maior da Ásia, entraria em um colapso comparável “à crise financeira de 1997”.
Na quinta-feira (25), Trump alardeou a quantia de dinheiro que suas tarifas abrangentes estão trazendo para os Estados Unidos, dizendo: “Temos no Japão US$550 bilhões, na Coreia do Sul US$350 bilhões. Isso é adiantado.”
Lee, recentemente eleito após o impeachment do golpista Yoon Suk Yeol, disse à Reuters no início da semana passada que, sem salvaguardas tipo um swap cambial, a economia da Coreia do Sul, com reservas cambiais de US$410 bilhões, mergulharia em uma crise se fosse obrigada a fazer tamanho desembolso.
“Sem uma linha de swap cambial, se retirássemos US$ 350 bilhões da forma como os EUA estão exigindo e investíssemos todo esse valor em dinheiro nos EUA, a Coreia do Sul enfrentaria uma situação semelhante à crise financeira de 1997,” disse ele.
Desde o acordo firmado em julho para reduzir as tarifas dos EUA de 25% para 15%, a Coreia do Sul afirma que os US$350 bilhões em investimentos seriam feitos na forma de empréstimos e garantias de empréstimos, bem como capital próprio, segundo a Reuters.
No mesmo dia do arreganho de Trump, o Wall Street Journal noticiou que o secretário de Comércio dos EUA, Howard Rutnick, havia exigido que a Coreia do Sul investisse mais do que os US$ 350 bilhões que atualmente detém no Fundo de Investimento dos EUA, intensificando o impasse.
O Wall Street Journal, citando diversas fontes, incluindo assessores do governo sul-coreano, relatou que “o secretário Rutnick discutiu recentemente com altos funcionários sul-coreanos um plano para ‘ajustar o valor final do acordo para um nível que aumente ligeiramente os US$ 350 bilhões e o aproxime dos US$ 550 bilhões prometidos pelo Japão’”.
Ainda segundo o porta-voz de Wall Street, Rutnick também transmitiu informalmente à Coreia do Sul sua posição de que deseja que “uma parcela maior seja fornecida em dinheiro em vez de empréstimos”.
Conforme o WSJ, “muitos acordos, incluindo o acordo comercial com a Coreia do Sul, são meramente acordos verbais, não escritos”, e que “há uma lacuna crescente entre os EUA e seus principais parceiros comerciais sobre o que é necessário para um acordo final”.
O presidente Trump – acrescenta a publicação – parece estar pressionando fortemente a Coreia do Sul, acreditando que uma conclusão favorável às negociações com a Coreia do Sul, após a do Japão, também beneficiará as negociações com outros países, incluindo a China.
De acordo com o Chosun Daily em 22 de setembro, os US$ 350 bilhões que os EUA estão exigindo como investimento de curto prazo nas negociações tarifárias Coreia-EUA excedem o investimento estrangeiro direto (IED) global total da Coreia do Sul nos últimos cinco anos.
“NÃO PODEMOS PAGAR”
Neste sábado (27), o conselheiro de Segurança Nacional da Coreia do Sul, Wi Sung-lac, voltou à questão no canal de televisão Channel A News. “A posição da qual estamos falando não é uma tática de negociação, mas sim, objetiva e realisticamente, não é um nível que somos capazes de lidar”, enfatizou. “Não podemos pagar US$350 bilhões em dinheiro”.
“Objetiva e realisticamente, isso é algo que não podemos permitir”, ele acrescentou. “Este é um fato que todos na República da Coreia reconheceriam. Independentemente do partido político, ninguém pode negar”, disse Wi.
O conselheiro disse que Seul está “discutindo alternativas”, com Seul mirando finalizar o acordo na cúpula de outubro da Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (APEC), que será na Coreia do Sul e deve contar com a participação de Trump.
EXTORSÃO
Segundo o jornal sul-coreano Hankyoreh, há uma diferença significativa de opinião sobre a implementação dos US$ 350 bilhões. “A Coreia do Sul propôs que o investimento direto em ações (capital próprio) representasse aproximadamente 5% do valor total do fundo, sendo o restante composto principalmente por garantias de crédito (sem movimentação de caixa), e alguns empréstimos. No entanto, os EUA estão exigindo um ‘acordo de cheque em branco no estilo japonês’, segundo o qual a Coreia do Sul receberia dólares em investimentos em ações, decidiria sobre os destinos dos investimentos e ficaria com 90% dos lucros do fundo após a recuperação do investimento.”
“Em resposta, a Coreia do Sul tornou a garantia de uma rede de segurança no mercado cambial por meio de um ‘swap cambial ilimitado’ com os Estados Unidos uma ‘condição necessária’. A Coreia do Sul detém atualmente reservas cambiais de aproximadamente US$ 416,3 bilhões, e o volume anual de dólares disponível no mercado cambial é de aproximadamente US$ 20 a 30 bilhões. Investir diretamente uma grande quantia em dólares, conforme exigido pelos Estados Unidos, pode levar a uma perturbação significativa no mercado cambial e a uma grave crise econômica para todo o país.”
Em entrevista ao mesmo jornal no dia 19, o Ministro das Relações Exteriores, Cho Hyun, declarou: “Se analisarmos os termos do acordo que o Japão firmou com os EUA, há algumas coisas que podem se tornar bastante problemáticas posteriormente. Portanto, se os EUA fizerem exigências semelhantes (ao Japão), será difícil chegarmos a um acordo.” Ele acrescentou: “Priorizaremos nossos interesses nacionais e lutaremos (por um acordo melhor), mesmo que isso leve algum tempo.”
Hankorieh registrou, ainda, que o impasse no acordo final do tarifaço está repercutindo no mercado cambial. A taxa de câmbio won-dólar atingiu a faixa de 1.410 wons no dia 26, seu nível mais alto em quatro meses. Prevê-se que a demanda americana por US$ 350 bilhões (aproximadamente 486 trilhões de wons) em investimentos em ações durante o mandato do presidente Donald Trump poderia desestabilizar o mercado cambial sul-coreano, e isso está dando sinais de que se tornará realidade. Em editorial, chamou os EUA a “cessar imediatamente com exigências e declarações excessivas que ameaçam as economias de seus aliados.”
Para o jornal, a “instabilidade no mercado cambial” parece ter sido alimentada pelas declarações de Trump de “pagamento antecipado”. Declarações “ainda mais intrigantes porque ocorreram apenas um dia após o presidente Lee Jae-myung se reunir com o secretário do Tesouro dos EUA, Scott Besant, no dia 24, e dizer: “Espero que as discussões (sobre as negociações tarifárias) avancem em uma direção que atenda aos interesses de ambos os países com base na racionalidade comercial”.
“Especialistas concordam que as exigências dos EUA são impossíveis, dada a escala da nossa economia e as atuais condições do mercado cambial. Muitos cidadãos, lembrando-se do pesadelo da crise cambial de 28 anos atrás, também estão indignados, achando-as difíceis de entender. Não importa o quão urgente o governo Trump acredite que sua economia precisa ser reconstruída, ele não deve fazer exigências absurdas que colocariam aliados em risco. Isso é desrespeitoso com os aliados e certamente não é do melhor interesse dos Estados Unidos. Se a economia sul-coreana, a maior fonte de investimento industrial dos EUA e oitavo maior parceiro comercial, entrar em dificuldades, a economia americana também será afetada negativamente.”
O jornal conclui recomendando “não interromper as negociações” mas, ao mesmo tempo, aconselha o governo Lee a “preparar um Plano B para o pior cenário. A política tarifária opressiva de Trump tem grande probabilidade de piorar os objetivos de redução do déficit comercial e revitalização da indústria, observou, o que poderia, em um ou dois anos, provocar uma revisão dessa política. “O governo sul-coreano deve apoiar as empresas afetadas pelas tarifas e perseverar o máximo possível. Esta é uma opção melhor do que permitir o colapso da economia nacional.”
Decisões que o governo Lee terá de tomar, mas a partir da dura realidade de que a Coreia do Sul está sob intervenção do Pentágono há sete décadas, a ponto de o comando de suas forças militares caber a um general norte-americano.
AS VIÚVAS DO GOLPISTA YOON
Quanto a esse dilema, um delirante artigo da Ásia Times se disse na torcida para que os “investimentos” de US$ 350 bilhões “não ceguem Trump para o fato de que Lee não gosta muito dele ou dos Estados Unidos”.
Segundo o articulista, Grant Newsham, oficial aposentado da Marinha dos EUA, ex-diplomata dos EUA e provável admirador do golpista impichado, Yoon Suk Yeo, o presidente Lee “é um esquerdista de longa data com afinidade com a República Popular da China e a Coreia do Norte, e não tem grande amor pelos Estados Unidos.”
“Ele se referiu às tropas americanas na Coreia do Sul como ‘ocupantes’ e disse que a China deveria fazer o que quisesse com Taiwan.”
“Lee aparentemente gosta da Coreia do Norte o suficiente para colocar dinheiro. Ele foi indiciado sob a acusação de enviar US $ 8 milhões para a Coreia do Norte enquanto era governador da província de Gyeonggi. Seu vice já foi condenado”.
“Ele também se opôs à implantação de defesa antimísseis THAAD dos EUA.” E recentemente teria elogiado “o Vietnã por lutar contra potências estrangeiras e se reunificar. Potências estrangeiras? Os americanos. E as forças sul-coreanas também estavam no Vietnã.”
Ele alegou, ainda, que o golpista Yoon foi tratado “como o próprio Trump” após a invasão do Capitólio.
“No entanto, desde que foi eleito, Lee falou sobre a aliança EUA-Coreia do Sul e a cooperação de segurança de três vias EUA-ROK-Japão. Assim, muitos observadores americanos afirmam que Lee é um pragmático e centrista, e governará como tal”.
Sobre novo primeiro-ministro de Lee, Kim Min Seok, Mr. Newsham asseverou que foi “um líder estudantil radical da Universidade de Seul na década de 1980 e se juntou à ocupação ilegal do Centro Cultural Americano de Seul em 1985. Ele foi preso por três anos devido às suas atividades anti-Estado e pró-Coreia do Norte. Os americanos uma vez se recusaram a lhe dar um visto, e ele teria alegado que os americanos estavam por trás da Covid”.
“E considere Jung Chung Rae, o chefe do Partido Democrático da Coreia de Lee Jae Myung. Ele liderou a ocupação da residência do embaixador dos EUA em Seul em 1989 e passou dois anos na prisão. Ele ainda é um radical radical”, concluiu Newsham.
SUL-COREANOS SEQUESTRADOS PELO ICE
Nas relações Seul-Washington pesam, ainda, novo fator de tensão: a invasão pela Gestapo da imigração de Trump de um canteiro de obras na Geórgia, em que está sendo erguida uma fábrica da Hyundai, do qual seqüestrou 300 trabalhadores sul-coreanos, provocando comoção em Seul.
Trata-se de um projeto de US$ 4,3 bilhões da Hyundai Motor e da LG Energy Solution para fabricar baterias para carros elétricos.
“Nossos negócios que entraram nos Estados Unidos provavelmente estão em um estado de grave confusão”, afirmou o presidente Lee Jae-myung em uma coletiva de imprensa no dia 11, que marcou seus primeiros 100 dias no cargo.
Nesse mesmo dia, um avião fretado decolou de Atlanta levando os trabalhadores sul-coreanos de volta para casa. Apenas um quis ficar, depois das negociações, que incluíram que ninguém fosse conduzido algemado até o avião. Eles foram levados de ônibus desde o centro de detenção, cercado de cercas de arame farpado.
Segundo a CNN, parlamentares na capital Seul reconheceram que pode ter havido alguma ultrapassagem dos limites de um programa de isenção de visto de 90 dias ou de um visto temporário de negócios B-1.
Mas as empresas sul-coreanas também reclamam há anos que têm dificuldades para obter vistos de trabalho de curto prazo para especialistas necessários em suas fábricas de alta tecnologia nos EUA e passaram a depender de uma zona cinzenta de interpretação mais flexível das regras de visto sob governos americanos anteriores.
Para a Gestapo da imigração de Trump, tais detalhes são muito complicados, o negócio deles é enjaular e deportar imigrantes e cumprir a cota de deportação diária do vice-guru, Stephen Miller.