É preciso investigar e apurar “eventuais dolos”, já que houve derrubada de torres no início do ano. “A privatização da Eletrobrás, no modelo em que ocorreu, fez mal ao sistema”, apontou o ministro das Minas e Energia ao dizer que executivos da empresa são de fora do setor
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, afirmou, nesta terça-feira (15), em entrevista coletiva em Brasília, que não descarta sabotagem como causa do apagão que ocorreu nesta manhã atingindo 25 estados e o Distrito Federal. Silveira também criticou o fato da principal empresa operacional do governo no setor elétrico, a Eletrobrás, ter sido privatizada no ano passado.
MÃO FIRME DO ESTADO
“Eu seria leviano em apontar que há uma causa direta com relação à privatização da Eletrobrás. O que não posso faltar é com a coerência, a minha posição sempre foi essa e não vai deixar de ser, é que um setor estratégico como esse deve ter a mão firme do estado brasileiro”, afirmou o ministro.
“Diferentemente do evento de 2 anos atrás, quando, por falta de planejamento, estivemos à beira de um colapso, agora há planejamento, há segurança, nossos reservatórios estão cheios e o ocorrido hoje nada tem a ver com geração de energia. Um setor estratégico para a segurança do país, como o setor elétrico, em especial em um país com a dimensão territorial do Brasil, na minha visão, não deveria ser privatizado. A privatização da Eletrobrás, no modelo em que ocorreu, fez mal ao sistema”, disse o ministro.
Para ele, o setor é estratégico e deveria estar totalmente nas mãos do Estado. “Primeiro que todos conhecem minha posição com relação à privatização. Um setor estratégico para segurança do país, inclusive para segurança alimentar, energética, como um setor elétrico de um país – em especial com as dimensão territorial do Brasil – na minha visão não deveria ser privatizado”, afirmou Silveira. Segundo o ministro, a Eletrobrás “deveria ter uma função estatal”. “Minha posição é que a privatização da Eletrobrás fez muito mal. Fez mal ao sistema”, declarou.
O ministro informou que pediu ao Ministério da Justiça e, consequentemente, à Polícia Federal, e também à Abin (Agência Brasileira de Inteligência), colaboração na investigação das causas do apagão. Devido ao fato de terem havido ações criminosas de derrubadas de torres de transmissão no início do ano, qualquer tipo de “ocorrência que não tenha caráter de naturalidade deverá ser investigada com muito cuidado pelo Poder Público”.
APURAR DOLOS
O objetivo, diz o titular da pasta, é apurar “eventuais dolos”. “Primeiro é que é um sistema altamente sensível, é um sistema que requer planejamento, requer total e completo monitoramento. Tenho absoluta convicção que o ONS [Operador Nacional do Sistema], até por sua característica técnica, não vai ter condição de dizer textualmente se esses eventos foram eminentemente técnicos, ou se houve também falha humana ou até dolo”, explicou Silveira.
“Por se tratar de um setor altamente sensível, além de determinar as apurações devidas e internas pelo ONS, Aneel e nossas vinculadas, estou oficiando ao Ministério da Justiça para que seja encaminhada à Polícia Federal um pedido de instauração de inquérito policial para que apure com detalhes o que poderia ter ocorrido, além de diagnosticar apenas onde ocorreu. Vamos encaminhar tanto à PF quanto para a Abin a instauração de procedimentos para apurar eventuais dolos nesse ocorrido de hoje”, afirmou o ministro.
Silveira disse que o caso desta terça é “extremamente raro” de acontecer. “O que aconteceu hoje é extremamente raro que aconteça, porque nós temos um sistema redundante. Para acontecer um evento dessa magnitude, nós temos que ter tido dois eventos concomitantes, em linhas de transmissão de alta capacidade. Ou seja, é extremamente raro que aconteça o que aconteceu no episódio de hoje”, argumentou.
EVENTO OCORREU NO NORDESTE
“Foi um fato que causou a interrupção na Região Norte e Nordeste e, por uma contingência planejada do ONS, minimizou a carga das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, para que não houvesse a interrupção total dessas regiões”, disse o ministro na entrevista coletiva. “Um dos eventos já apontados pelo ONS aconteceu no Norte do Nordeste, mais precisamente na região do Ceará. O outro evento possível ainda não está detectado pelo ONS”, completou Silveira.
Ele fez questão de repetir que o apagão ocorrido mais cedo “não tem nada a ver com a segurança energética do Brasil”. “O ocorrido de hoje não tem nada a ver, absolutamente nada a ver com o suprimento energético e a segurança energética do Brasil. Nós vivemos um momento de abundância dos nossos reservatórios”, afirmou o ministro.
O ministro informou que todas as medidas foram tomadas para o restabelecimento da energia e que no Sudeste, Centro Oeste e Sul ela foi restabelecida em uma hora e no Norte e Nordeste a recuperação do sistema levou cerca de seis horas. Ele informou que a situação do reestabelecimento de energia em todas as regiões do Brasil está 100% normalizada, desde às 14h49. Vale destacar que as regiões Sul, Sudeste e Centro Oeste foram restituídas cerca de 45 minutos após o incidente, pela manhã.
O ministro ainda não explicou exatamente o que causou o apagão. Ele fala em “eventos” ocorridos no sistema. “Os dados técnicos serão passados no momento adequado. Serão passados nas próximas 48 horas”, disse ele. O evento resultou em uma redução de 16.000 megawatts (MW) na geração de energia no Sistema Interligado Nacional, impactando principalmente partes das regiões Norte e Nordeste do país.
ONS PROTEGEU O SISTEMA
O epicentro do problema que provocou o apagão em todo o país teria ocorrido, segundo o ministro Alexandre Silveira, no Norte e Nordeste do país, particularmente no Ceará. “Houve sobrecarga no Ceará, o que fez o sistema entrar em colapso na região, com uma perda abrupta na carga. A ONS reagiu, modulou a carga para Sul e Sudeste e fez a carga ser reduzida para proteger o sistema”, afirmou Silveira.
Não há, ainda, segundo o ministro, a certeza absoluta do ponto exato do ocorrido. Silveira fez questão de repetir que o fato da gestão da Eletrobrás ser privatizada dificulta a ação de coordenação do governo no setor elétrico. “Quando ocorre um problema destes, vocês jornalistas estão aqui conversando e cobrando do Ministério de Minas e Energia, não é da Eletrobrás. Por isso, e pelo fato do setor elétrico ser tão sensível, deveria haver maior sintonia entre o governo e a principal empresa energética do país”, disse o ministro.
Segundo Silveira, a gestão da Eletrobrás hoje é feita por pessoas que não pertencem à área do setor elétrico. “São executivos de outras áreas que não estão afeitos aos problemas deste setor tão estratégico para o país”, apontou. Ele criticou, por exemplo, o fato de ter havido uma mudança na presidência da Eletrobrás ontem e ele, o ministro, só ter tomado conhecimento do fato pela imprensa. “Isso acontece com o governo tendo 44%das ações da empresa”, denunciou o ministro, justificando que “é por isso que nós entramos com uma ação no STF para reverter essa situação”.
Durante a entrevista, Silveira estava acompanhado de integrantes do ministério e de representantes da ONS e da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica). Eis a lista: Sandoval Feitosa, diretor-geral da Aneel; Gentil Nogueira, secretário nacional de Energia Elétrica do Ministério das Minas e Energia (MME); Thiago Barral, secretário nacional de Transição Energética e Planejamento do MME; e Gilson Soares, representante do ONS.