A comandante guerrilheira sandinista e ex-ministra da Saúde da Nicarágua Dora Maria Tellez – há um ano presa pelo regime de Daniel Ortega – é agraciada com o título de Doutora Honoris Causa pela Sorbonne
A Universidade Sorbonne de Paris, por decisão unânime de seu Conselho Acadêmico e com a aprovação do Ministério da Europa e Relações Exteriores da França, decidiu homenagear a excepcional carreira política e científica da ex-ministra da Saúde Dora María Téllez , que nesta segunda-feira completa um ano de prisão por se opor ao regime de Daniel Ortega, concedendo-lhe o título de Doutora Honoris Causa.
Em carta enviada a Téllez, condenada a oito anos de prisão pelo regime ortequista de quem é oposicionista declarada e atuante, a universidade indica que, com este título, quer homenagear a ex-combatente sandinista “por sua excepcional carreira” e por seu compromisso com as questões sociais.
“Com este título, a Sorbonne Nouvelle quer homenagear sua excepcional carreira política e científica e sua contribuição para o compromisso social internacional”, diz a missiva da universidade, assinada por Jamil Jean-Marc Dark, presidente da instituição acadêmica.
Com este reconhecimento, afirmam, “queremos reconhecer seu compromisso vitalício com a justiça social e a democracia, tanto em seu país quanto em toda a região latino-americana”.
A cerimônia de premiação acontecerá na sede da Universidade Sorbonne em três datas: 28 de novembro, 9 e 14 de dezembro deste ano. A Universidade diz a Dora María Téllez que “seria uma honra se você pudesse comparecer a uma dessas três datas”, aderindo assim à exigência internacional de que ela seja liberada.
DORA, LÍDER DA LUTA CONTRA O DITADOR SOMOZA
A comandante Téllez foi uma das principais guerrilheiras na luta da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) contra a ditadura de Anastasio Somoza nos anos 70. Ela comandou importantes operações de guerrilha, como a ocupação do Congresso Nacional em agosto de 1978 – que conseguiu a libertação de mais de 50 presos políticos do somozismo – e a ocupação sandinista da cidade de León, a primeira a declarar o triunfo sandinista em 1979. No governo revolucionário foi Ministra de Saúde. Téllez saiu da FSLN em 1995, questionando às práticas reacionárias do setor orteguista dentro do partido, e fundou o Movimento de Renovação Sandinista (MRS).
PRESOS POLÍTICOS SUBMETIDOS A MAUS TRATOS
O regime de Ortega, através da procuradoria, usou a acusação de “conspiração” para levar Dora, junto com a líder política Ana Margarita Vijil, a julgamento.
Ambas foram presas em 13 de junho de 2021, no mesmo dia que a Polícia prendeu toda a diretoria da União Democrática Renovadora (UNAMOS), organização que surgiu após a extinção do MRS, aglutinando sandinistas históricos, intelectuais e ativistas de esquerda, opositores a Ortega.
Desde essa data, Téllez permanece isolada numa cela da chamada Direção de Auxílio Judicial (DAJ), em Manágua, um centro de detenção preventiva para “interrogatórios”, mas onde são praticadas diversas formas de tortura, segundo denúncias dos familiares dos presos políticos e do Centro Nicaraguense de Direitos Humanos.
O psiquiatra Ignacio Maldonado, que conheceu Téllez no México na década de 1970, está muito preocupado com a situação que a ex-comandante guerrilheira vive na prisão e pediu ao presidente mexicano Andrés Manuel López Obrador que interceda por ela junto ao governo de Daniel Ortega para que a liberte e permita cuidados médicos adequados.
As denuncias apontam que ela vive no escuro em uma pequena masmorra, sem rações de comida suficientes e com uma anemia que causou manchas brancas em sua pele. Um médico da prisão prescreveu uma pomada, meladinina, para tratar as manchas, o que só piorou o problema e lhe causou queimaduras na pele que não receberam tratamento adequado.
SETE CANDIDATOS PRESIDENCIAIS TAMBÉM MANTIDOS EM CÁRCERES
A acusação de “conspirar contra a integridade e soberania nacional”, é a mesma aplicada a dezenas de pessoas entre ativistas, feministas, líderes universitários, jornalistas e dirigentes políticos, em base a uma lei aprovada pelo orteguismo em dezembro de 2020 contra opositores. Esse foi o mesmo instrumento aplicado para prender também nada menos de sete candidatos presidenciais declarados, apenas meses antes da eleição de fachada de novembro último, ilegalidade que lhe permitiu ser reeleito.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) apontou que a excessiva crueldade com que o regime de Ortega e sua esposa, a vice-presidente Rosario Murillo, tem tratado a Téllez e os outros 182 presos políticos na Nicarágua, transforma o casal governante em “responsáveis por crimes contra a humanidade”.