
Por 7 a 2, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que normas estabelecidas em acordos e convenções coletivas de trabalho devem prevalecer sobre a legislação no caso de restrição ou supressão de direito não assegurado pela Constituição Federal. O resultado do julgamento cria jurisprudência para outros processos com questionamentos sobre a prevalência ou não do negociado sobre o legislado, visto que o caso foi ao pleno da Corte como tema da repercussão geral.
Em outras palavras, a Suprema Corte mandou “às favas a lei”. Para as excelências, o que vale quando um acordo suprimir um direito legal é o acordo. O ministro Gilmar Mendes, relator do recurso, apresentou entendimento de que as negociações podem restringir direitos, mas ressaltou que as mesmas não devem ferir patamar civilizatório mínimo. O douto ministro deve estar preocupado com os possíveis excessos que, por ventura, os senhores imperialistas, seus executivos nacionais e colonizados em geral, mal-acostumados por 500 anos de escravidão, cometerem, referindo-se, possivelmente, ao uso do chicote.
CLT, JUSTIÇA TRABALHISTA E SINDICATO
Quanto à legislação que os meritíssimos, por ampla maioria, permitiram que seja legalmente vilipendiada, trata-se da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), resguardada pela Justiça Trabalhista e fiscalizada, nos tempos bons, pelos auditores do Ministério do Trabalho. Embora liberada a transgressão da lei pelos magistrados, houve a nobre preocupação em coibir possíveis exageros, originados pelo mau costume das nossas elites.
Além do que, sem querer ensinar “Pai-Nosso” ao vigário, a CLT fortaleceu o mercado interno, criou consumo para a industrialização e, durante 50 anos, de 1930 a 1980, fez o Brasil ter o maior crescimento no Produto Interno Bruto, PIB, (a soma de tudo o que produzido no país) do mundo, na média de 7% ao ano.
DEMOCRACIA
Para o ministro Alexandre de Moraes, “a ferramenta da negociação coletiva é importante direito social do trabalhador no sentido de privilegiar a autonomia de vontade, representada pelo sindicato, para discutir direitos disponíveis”. O mais impressionante é que a decisão foi tomada em nome da democracia, da negociação coletiva e do fortalecimento dos sindicatos.
Mas democracia não pode tratar desiguais com igualdade. Isso tem outro nome: no popular, é botar a raposa para tomar conta do galinheiro. A lei, pelo que sabemos, é feita para proteger os mais fracos. Senão, é a lei da selva.
Parece um pleonasmo que, quanto mais ampla for a legislação, melhor para o trabalhador. Ou negociação é para melhorar o que já foi conquistado ou, então, conquistas de mais direitos é o que fortalece a instituição da negociação coletiva e o sindicato.
Num tempo de bombardeio à democracia, ao Judiciário, de ataques aos direitos dos trabalhadores, de corte no custeio dos sindicatos, ao quase fim do direito à aposentadoria; num tempo de desemprego, recessão e inflação; num tempo de fome para 33 milhões de brasileiros: a Justiça tarda, mas não falha. É como deveria ser.
O agravo em questão (ARE 1.121.633) ocorreu com base na validade de uma cláusula aprovada em negociação coletiva que, na prática, substituiu o pagamento pelo tempo gasto no deslocamento entre casa e local de trabalho, por fornecimento de transporte aos empregados.
CARLOS PEREIRA