Na última segunda-feira, o ministro Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu encaminhar ao plenário do tribunal o recurso de Lula contra o arquivamento do seu “recurso extraordinário”, na sexta-feira anterior.
Ao leitor, deve parecer confusa essa forma de expressão, mas, quanto ao caso de Lula, é assim mesmo: trata-se, realmente, de um recurso contra a recusa de um recurso…
A conduta da defesa de Lula, por sinal, é uma exposição didática do que se pode fazer, no sistema judicial atual, quando se possui dinheiro para pagar advogados caros e fazer recursos, recursos de recursos, recursos de recursos de recursos, e, assim, infinitamente.
Resumindo:
Na sexta-feira, dia 22, o ministro Fachin determinara o arquivamento do recurso de Lula ao STF, pois ele fora considerado “inadmissível” – ou seja, sem fundamento – pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), a quem cabe fazer “subir” para a instância superior as apelações contra suas decisões.
Na segunda-feira, dia 25, Fachin, diante de um recurso de Lula, manteve a sua decisão de arquivamento. A defesa de Lula pedira, também, se Fachin rejeitasse o novo recurso, seu envio para apreciação da Segunda Turma do STF, onde esperava contar com Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli para reverter o arquivamento.
A Segunda Turma, formada por esses três ministros e mais pelos ministros Celso de Mello e o próprio Fachin, é conhecida, entre os profissionais que atuam no STF, como “Jardim do Éden”, devido à leniência de sua maioria com corruptos e outros criminosos.
Fachin, porém, enviou o recurso de Lula contra o arquivamento para votação pelo conjunto dos ministros do STF, em sua reunião plenária, e abriu o prazo de 15 dias para que a Procuradoria Geral da República se manifeste.
O julgamento no plenário terá que ser pautado pela presidente do tribunal, ministra Cármen Lúcia. Como o recesso do STF começa na próxima semana, espera-se o julgamento para agosto – mas a defesa de Lula pediu urgência, para que o recurso seja julgado antes do recesso.
LIMITE
Os ataques dos lulistas ao ministro Luiz Edson Fachin, por sua decisão de arquivar o recurso de Lula, são reveladores do alto critério moral desses indivíduos, a começar pelo seu chefe.
Os insultos têm o seguinte conteúdo: como Fachin apoiou a candidatura do PT em 2010, tendo, inclusive, discursado durante a campanha – e foi indicado, também por Dilma, para ministro do STF -, agora ele seria um “traidor”, porque está seguindo a lei, ao arquivar o recurso de Lula.
Portanto, o ministro Fachin teria obrigação de sustentar as mentiras de Lula e do PT, inclusive passando por cima da lei, por ter apoiado o PT no passado e ter sido indicado para o STF por Dilma.
A única conclusão possível é, no entanto, a oposta: nem Fachin, que apoiou o PT entusiasmadamente, consegue suportar as mentiras do PT.
O ministro é um jurista importante no campo do Direito Civil, professor titular desta cadeira na Universidade Federal do Paraná (UFPR). A tal ponto que as acusações contra ele, na época em que foi indicado para o STF – de que seria um “petista de carteirinha” (sic) -, não fizeram com que sua aprovação no Senado fosse prejudicada.
Mais importante, por tudo o que se conhece dele, Fachin é um homem decente: que não tenha confundido suas posições políticas com seu dever como juiz, é um mérito que, apesar de ser mais comum do que acredita Lula, não é dado a todos no STF – vide o atual ídolo do PT, Gilmar Mendes.
No entanto, é provável que Fachin tenha mudado a sua opinião sobre Lula e o PT. Nisso, não é o único. O mesmo aconteceu com o então procurador Rodrigo Janot, que teve trajetória política algo parecida com a de Fachin – e que, também, foi acusado por Lula, e seus sequazes, de ser um traidor, por denunciar seus crimes.
Mas o que fez com que a opinião de Fachin mudasse, assim como a de Janot, foram as provas, isto é, os fatos coletados em dezenas de processos oriundos da Operação Lava Jato e suas derivadas, que tornaram um escândalo nacional, como jamais houve, a corrupção e a mentira recorrente de Lula e do PT.
Em outras palavras, a posição política do ministro Fachin é inteiramente secundária, porque, no máximo, é uma consequência dos fatos revelados pela Operação Lava Jato. Somente os lulistas para exigir (?) que um ministro do STF ignore a realidade – e se choque com a Nação, que ele jurou, através da Constituição, defender.
Sucintamente, é isso: os ataques a Fachin são porque ele se recusa a ignorar os fatos, se recusa a passar por cima (ou por baixo) da lei, se recusa a varrer para debaixo do tapete a sujeira dos assaltos de Lula, se recusa a ser um fantoche dos ladrões lulistas.
Assim, o vídeo, divulgado pelos lulistas, nas “redes sociais”, em que Fachin defende a eleição de Dilma, somente expõe o tamanho dos crimes lulo-petistas: nem Fachin, que apoiou o PT, consegue aguentá-los.
RECURSO
Fachin decidiu pelo arquivamento do recurso (mais um) de Lula porque o Tribunal Regional Federal da Quarta Região (TRF-4), responsável em segunda instância pelos processos da Lava Jato, enviou o recurso para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) – e não para o STF.
Sobre isso, a decisão da desembargadora Maria de Fátima Freitas Labarrère, vice-presidente do TRF-4, é arrasadora, ao examinar ponto por ponto as alegações da defesa.
Eis um trecho:
“Como é cediço [notório, conhecido], o acesso às chamadas instâncias extraordinárias [STJ e STF] detém a precípua finalidade de estabilização e uniformização do sistema, pela adequada aplicação e interpretação das normas legais e constitucionais. Desta forma, o discurso retórico, sem a precisa indicação das violações aos dispositivos supostamente violados, não perfaz a imprescindível tecnicidade demandada pelos recursos excepcionais, fazendo incidir o óbice previsto na Súmula 284/STF, segunda a qual ‘é inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia‘.”
Realmente, os recursos de Lula são, no conjunto, tão retóricos e confusos quanto vazios, desprovidos de fundamentação – ou, para usar a palavra mais precisa, mentirosos.
Por exemplo, a alegada infração à “paridade de armas”: Lula não teria tido a mesma oportunidade de se defender do que os procuradores tiveram de acusar, durante o processo no TRF-4 e na 13ª Vara Federal de Curitiba.
Isso é mentira para qualquer um que tenha acompanhado o processo, mesmo pela televisão. Jamais um réu teve tanta oportunidade de se defender quanto Lula. Se não conseguiu, foi porque seus atos são realmente indefensáveis.
Além disso, os recursos de Lula pretendem reexaminar questões de mérito (ou seja, anular provas) que já foram julgadas duas vezes – tanto pela 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba quanto pelo TRF-4. É completamente ilegal esse reexame no STJ ou no STF, tribunais que somente examinam questões de Direito, ou seja, se as regras jurídicas foram respeitadas nos julgamentos anteriores.
Por fim, o recurso extraordinário (ao STF) de Lula pretende contestar questões que dependem da lei não-constitucional, sem que, antes, estas tenham sido julgadas pelos tribunais próprios para isso (o STF somente julga questões constitucionais, o STJ é a última instância no que se refere às leis abaixo da Constituição).
Assim, a decisão da desembargadora Maria de Fátima Labarrère, ao não admitir o recurso de Lula ao STF, mas admitir o recurso ao STJ, foi mais do que flexível.
A rigor, Lula queria entrar com o mesmo recurso, e ao mesmo tempo, no STJ e no STF, apenas dando ao último uma tintura “constitucional”.
ISONOMIA
A decisão de Fachin foi, como dissemos, uma consequência da decisão tomada pela vice-presidente do TRF-4.
Tanto isso é verdade que o presidente da Segunda Turma do STF, Ricardo Lewandowski, notoriamente identificado com o PT e com a defesa de Lula, retirou imediatamente o recurso da pauta.
Mais ainda: tanto isso é verdade, que as acusações feitas pelo PT, em seu site, contra Fachin – diz o PT que ele “manobrou” para não colocar o recurso extraordinário em pauta no STF – são desmentidas pela “carta de juristas” que eles apresentam, em protesto, encabeçada pelos srs. José Eduardo Cardoso e Tarso Genro.
Essa carta é inteiramente centrada em dizer que não se pode prender alguém que foi condenado em primeira e segunda instância, ou seja, antes que todos os recursos de esgotem, o que quer dizer, para quem tem dinheiro, nunca (v. nosso artigo Por que a prisão após a segunda condenação é legal, justa e necessária).
O mais significativo é como foram poucos os que assinaram essa carta – basta compará-los com os milhares de juristas que, em abril, firmaram abaixo-assinado pela execução da pena após a condenação em segunda instância (v. 5 mil juízes e promotores entregam manifesto pela prisão após segunda condenação).
Todo esse suposto apego do lulismo à prisão somente após o “trânsito em julgado” (isto é, após o esgotamento de todos os recursos) só vale para Lula e outros bandidos da casa (da casa deles, bem entendido).
Na prática, isso significa que nenhum corrupto, enriquecido pelo roubo ao dinheiro do povo, jamais seria preso.
Enquanto isso, nos governos do PT, o número de presos, no Brasil, aumentou de 239.345 pessoas (2002) para 726.712 pessoas (junho de 2016), um aumento de 204%.
Temos, atualmente, o terceiro maior número de presos do mundo, em termos absolutos, acima, por exemplo, da Índia, que tem uma população que é mais de seis vezes a nossa.
Nada menos que 40% desses presos não foram julgados nem ao menos em primeira instância.
São pobres, jovens (74% deles têm de 18 até 34 anos). São negros e mulatos (64% dos presos em penitenciária são negros ou mulatos). E 51% deles não completaram o ensino fundamental (todos os dados são oficiais: cf. MJ/Infopen, Brasília, 2017).
Durante 13 anos de governo, a preocupação do PT com essa gente foi colocá-los na cadeia – sem nenhum “transitado em julgado”.
Mas, quando Lula foi condenado por roubo – e roubo do dinheiro do povo -, no primeiro dos processos a que responde, descobriu-se que alguém só pode ir para a cadeia depois de esgotados todos os recursos…
C.L.
Na lavagem de dinheiro, o bem ou direito não precisam estar necessariamente no nome do acusado.