
Luiz Fux ficou isolado e ofereceu o único voto (4 a 1) contrário às medidas cautelares impostas por Alexandre de Moraes
O presidente da Primeira Turma do Supremo tribunal Federal (STF), Cristiano Zanin, e os ministros Flávio Dino e Cármen Lúcia confirmaram a decisão do ministro Alexandre de Moraes, e formaram maioria a favor da manutenção das medidas cautelares impostas contra a obstrução à Justiça cometida por Jair Bolsonaro. Todos apresentaram o voto ainda na última sexta-feira (18).
Por 4 votos contra 1, prevaleceu a decisão de Moraes pelas medidas cautelares contra o ex-presidente, que a todo tempo desrespeita o chamado “devido processo legal”. Leia mais em “Bolsonaro é alvo de busca e apreensão da PF e usará tornozeleira, decide STF”.
Último a votar, o ministro Luiz Fux ficou isolado e apresentou a posição dele, na noite desta segunda-feira (21), na undécima hora, cujo encerramento estava previsto para às 23 horas e 59 minutos, contra as medidas cautelares impostas pelo ministro Alexandre de Moraes ao ex-presidente. Entre as medidas, estão o uso de tornozeleira eletrônica, recolhimento domiciliar noturno, veto às redes sociais, entre outras.
As medidas foram tomadas porque Bolsonaro estava atuando para atrapalhar o processo em que responde no STF por tentativa de Golpe de Estado. Além de tramar com governo estrangeiro, o governo Trump, contra a Justiça brasileira. Ele mesmo confessou que enviou R$ 2 milhões para seu filho Eduardo Bolsonaro, nos Estados Unidos, agir contra o Brasil e o STF para atrapalhar a Justiça.
Além do mais, segundo a Polícia Federal, havia indícios de que Bolsonaro preparava sua fuga do Brasil para não ser preso.
Leia a decisão de Alexandre de Moraes para decretar as medidas contra Bolsonaro:
Fux foi o último dos 5 integrantes da Primeira Turma do STF a se manifestar no plenário virtual da Corte — e o único a divergir de Moraes. A plataforma digital permite a análise de casos sem que os ministros precisem se reunir pessoalmente ou por videoconferência.
VOTO CONTRA O STF
“Verifica-se, na ação penal a que responde o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, que este apresenta domicílio certo e passaporte retido. Ao mesmo tempo, a Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República não apresentaram provas novas e concretas nos autos de qualquer tentativa de fuga empreendida ou planejada pelo ex-presidente, de sorte que carece a tutela cautelar do preenchimento dos requisitos do periculum in mora (o perigo da demora) e do fumus comissi delicti (a fumaça da prática do delito) para fundamentar o decisum que, com expressiva gravidade, baseia-se em ‘possível prática de ilícitos’”, escreveu Fux, ao não referendar a decisão de Moraes.
“Verifico que a amplitude das medidas impostas restringe desproporcionalmente direitos fundamentais, como a liberdade de ir e vir e a liberdade de expressão e comunicação, sem que tenha havido a demonstração contemporânea, concreta e individualizada dos requisitos que legalmente autorizariam a imposição dessas cautelares. À luz desses requisitos legais, não se vislumbra nesse momento a necessidade, em concreto, das medidas cautelares impostas”, defendeu o ministro.
No voto de 5 páginas, depositado no plenário virtual, Fux também frisou a “importância da soberania nacional” e ressaltou que o Supremo tem “demonstrado de forma inequívoca a sua independência e a sua impermeabilidade às pressões dos setores que manifestam desagrado com as suas decisões”.
CONTRA INGERÊNCIA AMERICANA
Fux é um dos 3 ministros que não foi sancionado pelos Estados Unidos. Os outros 2 são André Mendonça e Kassio Nunes Marques. Estes últimos, porque são considerados aliados de Bolsonaro na Corte. E Fux, porque diverge, ainda que pontualmente, de Moraes. E assim foi preservado das sanções sofridas pelos outros 8 ministros do Supremo.
Embora tenha sido 1 dos 3 ministros da Corte a ter o visto poupado, Fux supostamente compartilha da visão crítica à ingerência americana na Justiça brasileira. Entretanto, nesse voto, conciliou com a ingerência americana, já que Trump alega que a imposição de tarifas 50% sobre produtos brasileiros é devido a uma suposta perseguição a Jair Bolsonaro.
O ministro tem sido o único na Primeira Turma do STF, onde é julgado o inquérito da tentativa de golpe de Estado, a divergir, pontualmente, de Moraes, Cármen Lúcia, Zanin e Dino.
DIVERGÊNCIAS NO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA
As divergências entre os ministros vieram à tona no julgamento sobre o recebimento da denúncia contra os acusados de articular plano para manter Bolsonaro no poder após a vitória de Lula (PT) nas eleições de 2022.
Embora a denúncia tenha sido recebida por unanimidade, Fux registrou ressalvas pontuais e sinalizou que pode acolher, ainda que parcialmente, algumas teses da defesa no julgamento do mérito.
Ele apontou, por exemplo, ser contrário à ideia de punir a tentativa de golpe como se fosse crime consumado e defendeu que é necessário distinguir atos preparatórios da execução propriamente dita.
Além disso, em contraste com seus colegas, expressou reservas quanto à colaboração premiada do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.
PRIMEIRA INSTÂNCIA OU PLENÁRIO
Ele também defendeu que os processos deveriam ser remetidos à primeira instância ou ao plenário do STF. Essa divergência, no caso, é inócua, porque houve mudança no Regimento Interno da Corte que determinou que o processo fosse examinado pela Primeira Turma.
Quanto à apreciação do processo no Supremo, isso se dá em razão de a Corte ter sido atacada e também pelo fato de o processo envolver autoridades com foro privilegiado. Portanto, pode-se afirmar que esta divergência em particular não passa de tergiversação.
DÉBORA DO BATOM
Posteriormente, ele defendeu pena de 1 ano e 6 meses para a cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos, bolsonarista que escreveu com batom a frase “Perdeu, mané” na estátua da Justiça, em frente à sede do STF, durante os atos de 8 de janeiro.
Fux considerou desproporcional a pena proposta por Moraes, que votou por condená-la a 14 anos de prisão em regime fechado. Contudo, prevaleceu o voto de Moraes.
A divergência de Fux levou Moraes a apresentar adendo ao voto no plenário virtual da Primeira Turma, em que rebateu Fux. Moraes sustentou que a situação da cabeleireira “não apresenta diferenças significativas” em relação aos 470 réus já condenados pelo STF por participação nos atos golpistas.
NÃO FOI SÓ PELA PICHAÇÃO
Um dos equívocos mais comuns nas críticas ao julgamento é ignorar o conjunto de crimes imputados à ré.
Débora não foi processada, virou ré e condenada “por pichar estátua”, como querem fazer crer a propaganda bolsonarista. Se fosse apenas por isso, a pena seria simbólica: o crime de deterioração de patrimônio tombado tem pena máxima de 3 anos, e permitiria inclusive sanção alternativa à prisão.
Na realidade, ela respondeu e foi condenada por 5 crimes:
· Abolição violenta do Estado Democrático de Direito – art. 359-L do CP;
· Tentativa de golpe de Estado – art. 359-M;
· Dano qualificado com violência – art. 163, parágrafo único, I, III e IV;
· Associação criminosa armada – art. 288, parágrafo único; e
· Deterioração de patrimônio tombado – art. 62, I da Lei 9.605/98.
A pena sugerida e acatada — 14 anos — decorre do concurso material entre estes delitos acima citados, todos descritos como resultantes de “obra comum”.