Reformulando decisão tomada no dia 10, na quarta-feira (24), o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, determinou que a Petrobrás cumpra liminar já concedida pela justiça do Paraná e reabasteça imediatamente os dois navios iranianos parados em Paranaguá há 50 dias, um deles já carregado com 48,8 mil toneladas de milho e o outro aguardando para seguir viagem até Santa Catarina para receber mais 42 mil toneladas.
Na véspera, o embaixador do Irã, Seyed Ali Sagaeyan, havia pedido que o Brasil “resolvesse o problema” e alertado para a questão de que o país, sob pesadas sanções, poderia se ver forçado a ir em busca de fornecedores confiáveis.
O Irã é o principal parceiro comercial brasileiro no Oriente Médio e o principal importador de milho do Brasil, segundo dados do Ministério da Economia, tendo no primeiro semestre comprado quase um terço do total da commodity exportado.
Em carne bovina, o Irã foi o terceiro maior comprador, somente atrás da China e dos Emirados Árabes Unidos.
No ano passado, o Brasil obteve um superávit de US$ 2,2 bilhões no comércio com o Irã, tendo importado apenas US$ 39,9 milhões. No primeiro semestre de 2019, o superávit está em US$ 1,27 bi, com importações de 26 milhões.
Ou seja, a insistência em ir a reboque das sanções dos EUA, sem sequer ser solicitado, estava colocando os exportadores de milho brasileiros sob ameaça de perda de um mercado estratégico, com grande prejuízo econômico, numa reedição do vexame da carne halal destinada aos países islâmicos.
O presidente Jair Bolsonaro havia justificado a recusa em reabastecer navios contratados para atender ao principal parceiro comercial no Oriente Médio, dizendo que havia sido recebido por Trump e queria aumentar os vínculos com os EUA e que a Petrobrás poderia ser sancionada e prejudicada se abastecesse os navios.
A recusa do abastecimento dos navios iranianos contratados para a exportação de milho também causara perplexidade na Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec). Como o diretor-geral da entidade, Sérgio Mendes, enfatizou, “comida está fora dessa história, alimento está fora de qualquer processo de sanção. Tanto que os navios dos nossos associados estão carregando normalmente”. Só este ano, até junho, o Irã importou cerca de 2,5 milhões de toneladas de milho do Brasil.
A liminar permitirá que os navios Bavand e Termeh possam retornar ao Irã com uma carga de milho de 100 mil toneladas. Outros dois navios iranianos enfrentam o mesmo problema. Há 50 dias, o Bavand e o Termeh se encontram ao largo do Porto de Paranaguá, o que a empresa exportadora advertiu, ameaçava a tripulação, o meio ambiente, a carga, as próprias embarcações e as demais no porto, em caso de ficarem à deriva.
A decisão anterior de Toffoli suspendia a obrigação de abastecer, até que a União e a PGR se manifestassem. A alegação da diretoria da Petrobrás para recusar a fornecer o combustível cujo monopólio detém era de que ficaria sujeita a sanções do governo Trump contra o Irã, podendo ir parar na lista negra do Departamento do Tesouro, já que a empresa proprietária dos navios estava sancionada.
A empresa brasileira que exportou o milho rebateu tais alegações, mostrando que até mesmo pela legislação norte-americana existe a chamada exceção humanitária, que evita sanções em relação a comida, commodities agrícolas, remédios e equipamentos médicos – o que se aplicava tanto quanto ao milho e ao fertilizante ureia, um insumo agrícola (também comercializado, aliás, pela Petrobrás).
Além do que, a lei brasileira não admite a extraterritorialidade de legislação norte-americana. Também foi contestada a declaração da diretoria da Petrobrás de que o não-fornecimento de combustível seria meramente uma “decisão comercial” e que existiriam outros fornecedores – quando a estatal tem o monopólio do combustível específico requerido, o IFO 380.
ANTONIO PIMENTA