STF determina “preservação rigorosa” de provas da chacina do Rio

Ministro Alexandre de Moraes durante conferência mundial sobre Justiça Constitucional na Espanha (28/10) (Foto: Divulgação - STF)

O despacho garante que o Ministério Público fiscalize o caso e assegura à Defensoria Pública acesso integral às provas

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, determinou, neste domingo (2), que o governo do Rio preserve todos os vestígios do massacre na Penha e no Alemão, na última terça (28), incluindo fotos das necropsias e cadeias de custódia.

“DETERMINO a preservação e documentação rigorosa e integral de todos os elementos materiais relacionados à execução da referida operação, como perícias e respectivas cadeias de custódia, para o exercício do controle e averiguação a cargo do Ministério Público, devendo ser facultado o acesso desses elementos à Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro”, diz o ministro em seu despacho.

“O Governador do Estado do Rio de Janeiro deverá ser intimado para garantir o respeito à presente decisão”, prossegue Moraes.

Mais que protocolo, trata-se de blindar a possibilidade de investigação independente em operação que terminou com 121 pessoas assassinadas, entre elas 4 policiais: 2 do Bope/PM e 2 da Core/Polícia Civil.

Leia aqui a íntegra:

O despacho garante que o Ministério Público fiscalize o caso e assegura à Defensoria Pública (DPU) acesso integral às provas —direito inicialmente negado, 2 do Bope/PM e 2 da Core/Polícia Civil.

PEDIDO DA DPU

O pedido foi feito pela DPU (Defensoria Pública da União), após os defensores fluminenses serem impedidos de acompanhar os exames.

A decisão resgata obrigações fixadas na ADPF das Favelas, que o STF aprovou para conter práticas recorrentes de remoção de corpos sem perícia adequada, ocultação de provas e falta de protocolo em ações de altíssimo risco em áreas de vulnerabilidade.

Como foi o caso das ações realizadas nos complexos da Penha e no Alemão, na Zona Norte do Rio, região apontada pelo secretário de Polícia Civil como ‘QG’ do CV (Comando Vermelho) no Brasil.

PRESSÃO

Moraes também convocou, para quarta-feira (5), audiência com entidades públicas e civis.

São essas as entidades:

Conselho Nacional de Direitos Humanos; Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro; Instituto Anjos da Liberdade; Associação Direitos Humanos em Rede – Conectas Direitos Humanos; Associação Redes de Desenvolvimento da Maré – Redes da Maré; Educação e Cidadania de Afrodescendentes Carentes – Educafro; Justiça Global; Instituto de Estudos da Religião – ISER; Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência; Coletivo Fala Akari; Coletivo Papo Reto; Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial; Movimento Negro Unificado – MNU; Centro pela Justiça e o Direito Internacional – CEJIL; Laboratório de Direitos Humanos da UFRJ – LADIH; Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular Luiza Mahin – NAJUP; Instituto de Defesa da População Negra – IDPN; Movimento Mães de Manguinhos; e Instituto de Advocacia Racial e Ambiental – IARA.

Essas instituições deverão indicar seus representantes à chefia de gabinete do ministro até as 15h do dia 4 de novembro de 2025.

O objetivo desta é dar transparência, ouvir especialistas e sinalizar que o Judiciário não ficará inerte diante de operações com altíssima letalidade, marca histórica da política de segurança do Estado.

A iniciativa mira, ainda, o discurso do governador Cláudio Castro (PL), que vem atacando a ADPF sob o argumento de que a decisão teria “engessado” o combate ao crime.

Gilmar Mendes, do STF, rebateu publicamente, e lembrou que o STF não proibiu operações, apenas exigiu planejamento, proporcionalidade e dispositivos básicos de integridade, como câmeras e ambulâncias em ações de risco.

ENCONTRO

O ministro Alexandre de Moraes se encontra com o governador do Rio nesta segunda-feira (3). O encontro está marcado para as 11h, no Centro Integrado de Comando e Controle (CICC) da Polícia Militar, localizado no Centro da cidade.

Também devem participar da reunião o secretário de Segurança Pública, Victor Santos, o comandante da Polícia Militar, coronel Marcelo de Menezes, o chefe da Polícia Civil, delegado Felipe Curi, e o diretor da Superintendência-Geral de Polícia Técnica Científica, Waldyr Ramos.

À tarde, Moraes tem outra reuniões, incluindo encontros com representantes do Judiciário e com o prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD).

BLINDAGEM

Em nota, a Polícia Civil escreveu que os laudos serão anexados ao processo e acompanhados pelo Ministério Público.

A promessa — recorrente em investigações que envolvem letalidade policial — agora será aferida sob vigilância do STF e de organismos independentes.

VELHO CICLO

A decisão reacende o debate sobre o modelo de segurança fluminense, historicamente baseado em operações ostensivas que produzem números alarmantes, mas poucos resultados estruturais efetivos contra o crime organizado.

O exemplo disso é que uma semana depois da ação das forças policiais nada demonstra que as áreas conflagradas naquela terça-feira sofreram qualquer intervenção do Estado, a fim de ocupar espaços com políticas públicas estruturantes. Isso revela que não houve planejamento de longo prazo na ação policial.

Muita pirotecnia do governador Cláudio Castro e pouco ou nada de mudanças que possam iniciar melhorias nas vidas daquelas populações, cujo medo e o terror são cotidianos.

DIREITO

Enquanto o governo estadual, sob o comando do bolsonarista Cláudio Castro, aposta no discurso da força irrestrita, o STF procura impor regras do Estado Democrático de Direito, que são a transparência, controle externo, preservação de provas, respeito à vida e responsabilização.

No pano de fundo, está a disputa entre 2 projetos:

• Segurança como política pública monitorada, com métricas e limites legais; e

• Segurança como espetáculo bélico e eleitoral, cujo efeito colateral é sempre suportado pelas populações pobres e negras, nas regiões periféricas do Estado, ignorando a presença majoritária da população civil inocente.

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