Decreto atendia à Rodrimar e à JBS
Caso Rodrimar inclui o deputado da mochila e o laranja da fazenda
O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), quebrou o sigilo das contas bancárias de Michel Temer. A medida fora solicitada pelo delegado Cleyber Malta Lopes, da Polícia Federal (PF), no inquérito que investiga a propina passada a Temer pela empresa Rodrimar, que atua no Porto de Santos, para a emissão do decreto nº 9.048, de 10 de maio de 2017, conhecido como decreto dos portos.
O decreto aumentou de 25 anos para 70 anos o prazo das concessões nos portos brasileiros, de empresas com contratos vencidos, que jamais passaram por licitação. Uma das principais delas era a Rodrimar.
Pela regulamentação anterior ao decreto de Temer, essas empresas, para manter seus terminais – que estão em área pública – teriam que passar por uma licitação. O que ocorreu, com a emissão do decreto, é que elas tiveram seu prazo de concessão ampliado – para até 70 anos – sem gastar um centavo.
Segundo a PF e o Ministério Público, os indícios até agora apurados são de que Temer recebeu propina da Rodrimar, empresa com quem mantém um antigo e profícuo (?!) relacionamento, que atravessou os governos do PSDB, do PT – e, claro, o seu próprio.
Este é o mesmo inquérito que tentou ser abafado por um preposto de Temer na diretoria da Polícia Federal – recentemente enviado para a Itália.
É a primeira vez, em toda a História do Brasil, que um indivíduo exercendo a presidência da República tem seu sigilo bancário quebrado. Nem mesmo Collor conseguiu esse feito.
No pedido da Procuradoria Geral da República para a abertura desse inquérito, pode-se ler:
“Ademais, os interesses privados dos acusados passaram a prevalecer sobre a defesa do interesse público, valor que deveria ser por ele devidamente observado. Em outras palavras: Michel Temer e Rodrigo Loures desvirtuaram as importantes funções públicas que exercem, visando, apenas, ao atendimento de seus interesses escusos”.
O ministro Barroso também quebrou o sigilo de João Baptista Lima, conhecido como coronel Lima, de José Yunes, ex-assessor especial de Temer, de Rodrigo Rocha Loures, o carrega-malas de dinheiro, do dono da Rodrimar, Antonio Celso Grecco, assim como do diretor da empresa Ricardo Mesquita.
Provavelmente, o maior defensor atual de Temer, o sr. Lula da Silva, deve achar que essa foi mais uma tentativa de golpe contra ele (v. matéria nesta página). Mas não foi. O problema é que qualquer investigação da roubalheira contra o país, para Lula, se tornou um “golpe”. Pelo menos, ele sente como um golpe, não só contra Temer, mas contra si próprio…
Apesar de antiga, a relação de Temer com a Rodrimar surgiu publicamente no inquérito que investigava a JBS, quando a PF descobriu que um dos intermediários para receber propinas para Temer – sugerido pelo carrega-malas deste, Rodrigo Rocha Loures – era um diretor da Rodrimar, Ricardo Conrado Mesquita.
Esse diretor da Rodrimar apareceu no encontro entre Ricardo Saud, da JBS, e Rocha Loures, realizado na cafeteria Santo Grão, em São Paulo, no dia 24 de abril de 2017, gravado e filmado pela Polícia Federal.
No mesmo diálogo gravado, Saud e Loures referem-se, também, a Antônio Celso Grecco, presidente da Rodrimar.
A JBS – isto é, a Eldorado, produtora de celulose que pertencia ao mesmo grupo – comprou um terminal em Santos da Rodrimar.
Em seu depoimento na Procuradoria Geral da República, Saud declarou: “Ele (Rocha Loures) veio com a ideia do Ricardo (Mesquita), que é esse rapaz que ele tinha me apresentado. Ele enfiou a mão no bolso, tirou um cartão, e falou, então, você vai entregar [a propina para Temer] ao Ricardo da Rodrimar. Eu falei, não, nós já tivemos um problema com o Celso (dono da Rodrimar), já te falei, eu não vou entregar pro Ricardo”.
Temer controla o Porto de Santos desde o governo Fernando Henrique.
No ano 2000, Érika Santos, ex-esposa de Marcelo Azeredo, que Temer colocara, em 1995, na presidência da Companhia Docas de Santos (Codesp), denunciara o esquema de propinas instalado na administração da estatal. Marcelo Azeredo foi processado por improbidade administrativa ao assinar em 1997 o 9º Aditivo a um contrato de ampliação do Terminal de Containers do Porto de Santos, que só ocorreria no ano seguinte. O Aditivo acrescentou R$ 144 milhões a um contrato de R$ 295 milhões.
Érika Santos copiou documentos que estavam no computador do ex-marido, mostrando que a Libra Terminais Ltda, operadora portuária, pagara uma propina de R$ 640 mil a Temer e outra, evidentemente menor, para Marcelo Azeredo.
No mesmo caso, apareceu o notório coronel João Batista Lima, hoje implicado no caso Rodrimar, também como receptador de propina da Libra, que ganhou dois terminais em Santos.
Em seu depoimento, em maio do ano passado, Ricardo Saud, da JBS, também se refere ao “coronel Lima”: “… eu autorizei o Florisvaldo entregar 1 milhão de reais a mando do Michel Temer, para o Coronel Lima (…). Lá na Argeplan”.
João Batista Lima é proprietário de uma empresa chamada Argeplan Arquitetura e Engenharia.
Sobre o caso da Rodrimar, “os elementos colhidos”, escreveu o ministro Luís Roberto Barroso, “revelam que Rocha Loures, homem sabidamente de confiança do presidente Temer, menciona pessoas que poderiam ser intermediárias de repasses ilícitos para o próprio presidente, em troca da edição de ato normativo de específico interesse da Rodrimar”.
Em gravação de conversa telefônica, Rocha Loures discute o decreto dos portos com Gustavo Rocha, subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil:
GUSTAVO ROCHA: “É uma exposição muito grande para o presidente se a gente colocar isso. Já conseguiram coisas demais nesse decreto”.
ROCHA LOURES: “O importante é ouvi-los.”
GUSTAVO ROCHA: “A minha preocupação é expor o presidente em um ato que é muito sensível. […] Esse negócio vai ser questionado”.
Esse é o decreto que, segundo as palavras de Temer, “moderniza e dá segurança jurídica para os investimentos”.
C.L.