O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, determinou nesta segunda-feira (9) a obrigatoriedade do uso de câmeras corporais pelos policiais militares do estado de São Paulo. A decisão também obriga o uso de equipamentos com gravação ininterrupta.
A decisão foi tomada diante de um pedido feito pela Defensoria Pública estadual para obrigar a Polícia Militar a utilizar o equipamento. O pedido tramitava na Corte desde dezembro do ano passado.
Na decisão, Barroso citou casos recentes de violência policial contra pessoas que não ofereciam risco ou resistência e de desligamento proposital das câmeras.
“Diante da ausência de demonstração da viabilidade técnica e operacional dos novos dispositivos e do significativo aumento da letalidade policial em 2024, é indispensável manter o modelo atual de gravação ininterrupta, sob pena de violação à vedação constitucional ao retrocesso e descumprimento do dever estatal de proteção de direitos fundamentais, em especial o direito à vida”, decidiu Barroso.
A decisão que obriga a utilização das câmeras foi determinada após governo de São Paulo enviar ao Supremo novas informações sobre o cronograma de implantação dos equipamentos.
Na sexta-feira (6), Barroso recebeu 17 documentos detalhados sobre o andamento dos contratos para implantação dos dispositivos.
No entanto, o presidente do STF considerou que as informações não suficientes para a implementação prática dos equipamentos. O ministro citou “falhas reiteradas” no uso das câmeras em operações e o descumprimento dos protocolos de acionamento.
“Nesse contexto, entendo que o agravamento do cenário de violência policial no estado de São Paulo e os indícios de ineficiência na implementação da política pública de uso de câmeras corporais tornam necessária uma atuação mais rigorosa no âmbito deste processo. Há falhas reiteradas no uso das câmeras em operações e descumprimento dos protocolos de acionamento dos dispositivos”, justificou o ministro.
Confira as determinações da decisão de Barroso:
- – Uso obrigatório de câmeras por policiais militares envolvidos em operações policiais;
- – Divulgação, no portal da Secretaria de Segurança Pública (SSP/SP), do número dos batalhões e tropas equipadas com câmeras corporais;
- – Recomposição do total de câmeras no patamar mínimo de 10.125 em operação;
- – Uso do modelo ininterrupto de câmeras;
- – Prestação de informações sobre processos disciplinares abertos pelo descumprimento do uso correto de câmeras corporais.
O governo de São Paulo se comprometeu com o STF, em abril deste ano, a usar câmeras corporais em operações policiais no estado e apresentou cronograma que estabelecia a implementação do sistema. O estado previa nova licitação e aquisição de novas câmeras.
Em setembro, o governo anunciou assinatura de contrato com a empresa Motorola para a compra de 12 mil câmeras corporais. A compra foi criticada, no entanto, por prever mudanças na forma de acionamento do equipamento. Pelas regras do edital, o acionamento do equipamento de gravação poderia ser feito pelo próprio policial ou por uma central de operações da Polícia. Dessa forma, a gravação pode ser interrompida durante as operações.
O modelo previsto no contrato não faz gravação ininterrupta, ou seja, o policial, ou a corporação, acionará o equipamento quando desejar, ponto criticado por entidades de direitos humanos. Segundo a Secretaria da Segurança Pública (SSP), isso é compensado por outras funcionalidades, como o acionamento automático, por software, à distância pelo Centro de Operações da PM (Copom) e o acionamento manual pelo próprio policial.
Meses antes, em maio, a Defensoria Pública de São Paulo e entidades de direitos humanos pediram ao STF mudanças no edital da compra.
No mês seguinte, Barroso indeferiu o pedido, mas decidiu que o governo de São Paulo deveria seguir os parâmetros do Ministério da Justiça e Segurança Pública na licitação para compra de câmeras corporais.
Em seguida, a Defensoria Pública pediu a Barroso a reconsideração da decisão. Nesta segunda-feira, a decisão que obriga utilização das câmeras foi proferida.
IMPUNIDADE GERA DESCONTROLE
A escalada da violencia policial é exponencial. No período de um mês, 45 policiais militares foram afastados de suas funções e outros dois foram presos por abuso de autoridade e violência em São Paulo.
Os dados são compilados pelo Grupo de Atuação Especial da Segurança Pública e Controle Externo da Atividade Policial do Ministério Público (Gaesp-MPSP).
Durante uma abordagem, o policial militar Luan Felipe Alves Pereira foi flagrado arremessando um homem de uma ponte, na última segunda-feira (2), no bairro Cidade Ademar, na zona Sul de São Paulo.
O policial militar Vinicius de Lima Britto, acusado de matar de o jovem negro Gabriel Renan da Silva Soares com tiros pelas costas, foi preso na manhã desta sexta-feira (6) em São Paulo.
O caso aconteceu no mercado Oxxo, na Avenida Cupecê, zona Sul de São Paulo, em 3 de novembro deste ano. Após tentar furtar alguns produtos de limpeza da unidade, Gabriel foi alvejado com 11 disparos pelo PM que estava de folga.
O estudante de medicina Marco Aurélio Cardenas Acosta, de 22 anos, foi baleado dentro de um hotel na Vila Mariana após uma abordagem policial.
No boletim de ocorrência, a versão apresentada pelos policiais militares foi a de que Acosta tentou pegar a arma de um deles, momento em que um agente disparou. Os agentes envolvidos na morte estudante foram afastados de suas atividades operacionais até a conclusão das investigações sobre o caso.
Ryan da Silva Andrade Santos, de 4 anos, foi morto com um tiro em 8 de novembro, em Santos, no litoral de São Paulo. O menino estava brincando na frente de casa quando um confronto entre policiais e criminosos começou. Ryan foi atingido por uma bala perdida em seu abdômen.
Os sete policiais envolvidos na ação que ocasionou na morte de Ryan foram afastados e encaminhados ao Programa de Acompanhamento e Apoio da Polícia Militar por estarem abalados com a morte da criança.
Após um período de acompanhamento psicológico, o comando da PM vai avaliar se os agentes devem – ou não – retomar o trabalho de campo.
No início de novembro, imagens da câmera corporal de um polícia militar de São Paulo viralizaram nas redes sociais após registrarem o agente acelerando intencionalmente com a viatura que dirigia e, posteriormente, colidindo com outro veículo.
O caso ocorreu em 13 de julho deste ano, em Interlagos, na zona sul da capital paulista.
Ao todo, quatro agentes estavam dentro da viatura. De acordo com a SSP, todos foram acusados de direção perigosa. Além da acusação, eles foram afastados do serviço operacional e respondem por processos administrativos.