Um tribunal de fancaria inglês sentenciou o fundador do WikiLeaks, Julian Assange, a 50 semanas – quase um ano de prisão – por não ter comparecido a uma audiência sobre um caso que já foi até retirado pela Suécia há mais de um ano, o que ocorreu porque ele solicitou, e obteve, asilo político na embaixada do Equador em Londres, de onde foi arrancado há três semanas por um esquadrão especial, após entregue pelo governo Moreno.
Normalmente, a falta a uma audiência seria punida com uma multa, mas isso era só um pretexto para manter Assange encarcerado para que o processo do governo dos EUA contra ele, e que tramitou durante anos em sigilo, de extradição por denunciar crimes de guerra dos EUA no Iraque e Afeganistão, complete seu curso. Manifestantes nas imediações da corte exibiam cartazes, lembrando o famoso poema sobre os tempos nazistas: “primeiro eles vieram atrás de Assange”.
A ‘juíza’ Deborah Taylor cinicamente acusou o editor de usar a fiança para “escapar da lei” e expressar “desdém pela justiça britânica” e até o responsabilizou pelos milhões de libras esterlinas que a polícia gastou para manter o cerco ilegal a ele durante anos. Cerco que só se explicava pela subserviência – e cumplicidade – de Londres com Washington.
Relatores da ONU para direitos humanos haviam considerado Assange como sendo vítima do que era equivalente a um regime de prisão na embaixada e cobrado do governo inglês o fim da perseguição ao jornalista.
Durante esse tempo, o governo inglês pressionou a Suécia para manter a acusação contra Assange. Negou-se a conceder as salvaguardas, normais nesses casos, para que Assange, cujo asilo havia sido aceito por Quito, se deslocasse até o aeroporto para viajar para o Equador. Negou-se a permitir que ele deixasse provisoriamente a embaixada para atendimento médico e odontológico inadiável.
Assange pediu asilo porque estava sob risco de ser extraditado para os EUA, acusado de espionagem, sujeito à prisão perpétua ou à pena capital.
A mais conhecida denúncia do WikiLeaks, “Assassinato Colateral”, mostra como um helicóptero Apache em Bagdá metralha e mata vários civis, inclusive dois jornalistas da Reuters, e depois abate um homem que ia numa van levar os filhos à escola e parou para socorrer as vítimas ensanguentadas.
O WikiLeaks denunciou a sentença como “chocante” e “vingativa”, acrescentando que há graves preocupações se Assange terá um julgamento imparcial sobre a extradição, cuja primeira audiência ocorre nesta quinta-feira.
Durante os anos de guerra suja contra os que queriam a reunificação da Irlanda, a Justiça inglesa pegou uma merecida fama de ser uma pocilga, sempre pronta a fabricar culpados e a ignorar criminosos. Era costume pegar alguns irlandeses inocentes e os condenar por crimes que não cometeram, depois de devidamente torturados. Outra versão disso foi a impunidade que garantiram aos assassinos do brasileiro Jean Charles.
Para facilitar a aceitação do pedido de extradição, a acusação por agora contra ele é de ter tentado ajudar o soldado Chelsea Manning a violar uma senha, para obter documentos do Departamento de Estado mostrando sua ingerência sobre os demais países, preparação de golpes, estímulo da corrupção e outras causas do mesmo quilate.
Juristas, entidades de defesa das liberdades democráticas, associações de jornalistas e personalidades têm denunciado que a extradição de Assange por publicar informações verdadeiras sobre crimes de guerra e atos de intervenção cria um perigoso precedente sobre todos os jornalistas, em qualquer lugar do mundo. Afinal, Assange é australiano e a divulgação foi feita fora dos EUA.
Qualquer um que publicar o que Washington não gostar, pode passar a ter a cabeça na mira. O diretor executivo da Fundação pela Liberdade de Imprensa, Trevor Timm, chamou de “séria ameaça à liberdade de imprensa” as acusações levantadas pelo governo dos EUA contra ele.
O Comitê pela Proteção dos Jornalistas, com base em Nova Iorque, se disse “profundamente preocupado” com o processo e advertiu que as acusações de conspiração contra Assange “poderiam desencadear um precedente perigoso”.
As duas vertentes do establishment odeiam Assange por expor seus crimes. A então secretária de Estado, Hillary Clinton, chegou a propor que fosse silenciado “com um drone”. O ex-diretor da CIA e atual secretário de Estado do governo Trump, Mike Pompeo, chamou o WikiLeaks de “serviço de inteligência não-estatal hostil”, e que não teria direito à proteção da 1ª Emenda da constituição dos EUA.
Manning, que chegou a ser condenado a 35 anos de cárcere e foi libertado por ordem de Obama, no final de seu governo, voltou ao cárcere por se negar a depor acusando Assange.
A.P.