Três fatos em paralelo mostram que a implacável caçada para silenciar o jornalista Julian Assange, por ter exposto os crimes de guerra dos EUA no Iraque e no Afeganistão, como no vídeo “Assassinato Colateral”, prossegue a toda carga pelo regime Trump. Assange encontra-se preso em regime de solitária no presídio de segurança máxima perto de Londres, após ser entregue pelo governo Moreno à polícia inglesa em abril.
A Suécia acaba de anunciar que o processo contra Assange, fechado pela segunda vez em 2017, será reaberto e tornou-se público que o governo do Equador irá entregar a Washington no dia 20 celulares e computadores de Assange deixados na embaixada em Londres. A denunciante dos crimes de guerra, Chelsea Manning, depois de ficar presa por ‘desacato’ por se negar a mentir incriminando Assange por dois meses e ser solta, volta a enfrentar novo júri no dia 16.
A declaração sobre a reabertura da “investigação preliminar” foi feita na segunda-feira pela vice-diretora de acusações sueca, Eva-Marie Persson, enquanto o portal de denúncias fundado por Assange, o WikiLeaks, denunciou que a medida foi tomada “sob intensa pressão” sobre Estocolmo.
Numa clara evidência de que é disso que se trata – retomar o linchamento moral de Assange para facilitar sua extradição e entrega à CIA & Pentágono – a própria Persson disse incrivelmente que “gostaria de deixar bem claro o seguinte: minha decisão de reabrir a investigação preliminar não equivale a entrar ou não com uma acusação nos tribunais. Esse é um assunto que teremos de revisitar”.
Em suma, primeiro extradita, depois decide se acusa. A extradição de Assange tem sido defendida por deputados blairistas na Inglaterra, como forma de disfarçar a cumplicidade na entrega da cabeça do jornalista a Washington.
“CONSIDERÁVEL PRESSÃO POLÍTICA”
Como ressaltou o editor que substituiu Assange no comando do WikiLeaks, Kristinn Hrafnsson, desde que o jornalista australiano foi preso em 11 de abril de 2019 “houve uma pressão política considerável sobre a Suécia reabrir suas investigações”.
Ele assinalou que houve “muitas coisas estranhas nesse caso altamente politizado” – como a polícia pressionando as mulheres para manterem as acusações contra Assange. “Não vamos esquecer que a Suécia tem uma ‘má história’ de relações com as autoridades dos EUA quando se trata da extradição de pessoas.
Muitos refugiados foram extraditados para a CIA por Estocolmo.
Tudo pode acontecer, enfatizou Hrafnsson.
O editor relembrou o comportamento atípico da procuradoria sueca, ao se recusar durante anos a questionar Assange na embaixada equatoriana, como o jornalista havia se prontificado.
“Apenas quando foi forçada pelos tribunais suecos que ela viajou a Londres para finalmente questionar Assange”. (Aqui o editor se refere ao interrogatório conduzido na embaixada pela procuradora Ingrid Isgren em junho de 2016). A Corte de Apelação decidiu que a procuradora-chefe Marianne Ny havia violado seu dever, porque uma investigação preliminar deve ser aberta e levar a uma acusação, ou fechada.
“A Suécia queria abandonar seu mandado de prisão para Assange já em 2013. Foi o governo britânico que insistiu em que o caso contra ele continuasse”, ressaltou Hrafnsson. Desde que a investigação foi encerrada em 2017 – acrescentou – “recebemos relatos de destruição de registros e correspondências em nome das autoridades britânicas e suecas, certamente um impedimento para uma investigação completa”.
REVIDE AO VÍDEO DO ‘ASSASSINATO COLATERAL’
A equipe jurídica de Assange tem denunciado como a investigação preliminar sueca foi fechada em 2010, depois que o promotor-chefe de Estocolmo concluiu que “as evidências não revelaram nenhuma evidência de estupro” e que “nenhum crime foi cometido”. O jornalista ficou durante cinco semanas na Suécia e só deixou o país após ser informado pelo promotor que estava livre para fazê-lo, já que não era procurado para interrogatório.
Sabe-se agora, que o júri secreto contra Assange já fora instaurado nos EUA em junho, dois meses após a divulgação do vídeo que mostra um helicóptero Apache massacrando uma dezena de civis, inclusive dois jornalistas da Reuters, e um mês antes do vazamento dos arquivos de guerra do Iraque e Afeganistão.
Conforme o Daily Beast, o Departamento de Estado estava “pressionando a Grã-Bretanha, a Alemanha e a Austrália para considerarem a abertura de investigações criminais contra o fundador do WikiLeaks”. Mais tarde, a então secretária de Estado Hillary Clinton chegou a propor silenciá-lo “com drone”.
Das duas acusações assacadas contra Assange, uma prescreveu em 2015 e a outra prescreverá em agosto de 2020, sobre as quais o jornalista prestou esclarecimentos e declarou que as relações haviam sido consensuais e que era inocente.
SUJEIÇÃO ABSOLUTA
A entrega ao governo norte-americano dos celulares e computadores de Assange, pelo governo Moreno, e inclusive revista do seu quarto na embaixada foi denunciada pelo advogado Baltasar Garzón, defensor de Assange.
Trata-se de “uma violação absoluta da instituição do asilo pelo Equador”, afirmou. “É incompreensível que o país que lhe proporcionou proteção aproveite agora sua posição privilegiada para entregar seus pertences ao país que o persegue”, condenou.
“Esses pertences serão apreendidos sem um mandado judicial, sem proteger os direitos dos refugiados políticos, sem respeitar a cadeia de custódia.”
Documento em que o procurador-geral do Equador autoriza a obscena arbitrariedade está datado do dia 8, concedida no âmbito da submissão do governo Moreno ao regime Trump. Fontes disseram à AFP que o gabinete do procurador-geral equatoriano não se pronunciou sobre o caso nem divulgou o processo, porque se trata de “cooperação internacional de natureza reservada”.
MANNING: “ME RECUSO A RESPONDER”
Nos EUA, e entrevista à CNN, a denunciante Chelsea Manning reafirmou que não se dobrará e não mentirá para incriminar Assange. “Eles me disseram que queriam me fazer as mesmas perguntas (…) Eu vou me recusar a responder”, assinalou. “Não tenho nada de novo para dizer” e “não gosto do sigilo em torno dos grandes júris”, acrescentou. Para Manning, o tribunal terá mais dificuldades para voltar a declará-la em ‘desacato’. “Nós temos um dossiê mais forte sobre objeções legais” do que da última vez.
ANTONIO PIMENTA