O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), pretende privatizar a Fundação para o Remédio Popular (Furp), principal fabricante público de medicamentos da América Latina, que é vinculado à Secretaria de Estado da Saúde. A possibilidade foi ventilada durante uma reunião com deputados estaduais aliados.
No encontro, que aconteceu na segunda-feira (1º), no Palácio dos Bandeirantes, Tarcísio disse também que vai promover mudanças na estrutura da TV Cultura, emissora pública que pertence ao governo do Estado. A ideia é desmontar uma Fundação que tem 67 anos de história e que contribui para ampliar o debate em torno de temas relevantes para a sociedade.
As informações são da Revista Veja. Segundo a publicação, a justificativa para privatizar a Furp é a de que os medicamentos produzidos pelo laboratório oficial são caros em comparação com os do mercado, argumento refutado pelo SindsaudeSP (Sindicato dos Trabalhadores Públicos da Saúde no Estado de São Paulo). “A Furp produz medicamentos a baixo custo e atende mais de 3 mil municípios em todo país”, diz a entidade.
A continuidade da farmacêutica estatal vem sendo ameaçada desde 2019, quando o então governador João Doria (PSDB), anunciou a intenção de privatizar ou extinguir a Furp. “A privatização ou ameaça de extinção da FURP representa um ataque gravíssimo à soberania nacional na área de produção de medicamentos”, diz manifesto lançado naquele ano pela Federação Nacional dos Farmacêuticos e o Sindicato dos Farmacêuticos do Estado de São Paulo.
“Além disso, existem medicamentos que somente a Furp fabrica, pois não há interesse comercial de fabricação por outros laboratórios devido ao baixo retorno financeiro “, continua o texto. “A empresa paulista também é responsável pela produção de inúmeros medicamentos para doenças negligenciadas. Ela é a única fabricante nacional de estreptomicina e de etambutol, que tratam a tuberculose. Também de derivados da penicilina, que, por serem medicamentos antigos e baratos, poucas empresas têm interesse em produzi-los”, justificaram as entidades.
O documento alerta ainda que uma eventual privatização do laboratório público afetará hospitais e postos de saúde. “A privatização ou extinção da FURP resultará em ainda mais falta de medicamentos em hospitais e postos de saúde e em maior dificuldade da população mais carente ter acesso a tratamentos”.
E ainda, “obrigará o Estado a adquirir de indústrias farmacêuticas privadas parte dos medicamentos que deixarão de ser produzidos pela FURP, o que representará uma ampliação dos gastos públicos com medicamentos”, aponta o texto.
Durante o lançamento da Frente Parlamentar em Defesa da Furp na Assembleia Legislativa de SP (Alesp) em julho de 2023, o professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP Leoberto Tavares, defendeu uma política de estímulo à instalação de indústrias produtoras de Insumos Farmacêuticos Ativos (IFAs) no Estado de São Paulo para reduzir a dependência externa.
“Ao longo do tempo, o Brasil, assim como outros países, especialmente da América Latina, tem uma dependência imensa do mercado internacional, apesar de já ter sido um país produtor de insumos e até exportador nas décadas de 60 e 70, o que foi se perdendo ao longo do tempo”, apontou.
“Uma dependência”, continuou, “preocupante, que acaba exalando para uma questão de segurança nacional como o que aconteceu na Argentina, quando entrou em conflito com a Inglaterra, que bloqueou o fornecimento de fármacos e precisou ser socorrida por países vizinhos”, alertou o docente, que é coordenador do grupo de trabalho da Frente.
A Furp, que completa 56 anos de história na próxima terça (9), possui duas unidades, uma em Guarulhos (Grande São Paulo) e outra na cidade de Américo Brasiliense (SP). Atua diretamente no atendimento de prefeituras, consórcio de municípios, secretarias de saúde municipais e estaduais, santas casas, hospitais, sindicatos e entidades filantrópicas.