
Advogado americano Ilya Somin afirma que as tarifas de 50% contra o Brasil violam leis dos EUA, não têm base legal e podem cair
O jurista americano Ilya Somin, autor da ação judicial que suspendeu temporariamente as tarifas recíprocas impostas por Donald Trump a dezenas de países, afirmou que as novas tarifas de 50% aplicadas, exclusivamente, contra o Brasil também são “claramente ilegais” e têm grandes chances de cair na Justiça.
Em entrevista à colunista Mariana Sanches, do UOL, Somin avaliou que a medida assinada por Trump no final de julho se sustenta sobre a mesma base jurídica frágil, a Ieepa (Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional), de 1977, que foi contestada com sucesso em outro caso.
Segundo o jurista, a Ieepa não autoriza o presidente a distribuir tarifas de forma indiscriminada, como vem fazendo o governo Trump desde o início do segundo mandato, iniciado em 20 de janeiro.
A lei exige a existência de emergência nacional que represente ameaça “incomum e extraordinária” à economia ou à segurança dos Estados Unidos — o que, na visão de Somin, está ausente tanto no caso das tarifas recíprocas quanto na imposição de sobretaxas ao Brasil.
NEM EMERGÊNCIA NEM AMEAÇA
“No caso do Brasil, independentemente do que você pense sobre o processo contra o ex-presidente [Jair] Bolsonaro (PL), é muito difícil argumentar que isso seja de alguma forma uma emergência ou uma ameaça para os EUA. Se esse homem for para a prisão, o que talvez devesse mesmo acontecer, isso não causará nada aos Estados Unidos, certo? E, portanto, é simplesmente implausível que argumentemos que se trata de uma ameaça extraordinária e incomum”, argumenta Somin.
A decisão que derrubou temporariamente as tarifas anteriores foi proferida por unanimidade pela Corte Internacional de Comércio dos EUA.
Na ocasião, a juíza Jane A. Restani argumentou que os poderes presidenciais não são ilimitados e criticou o raciocínio jurídico da Casa Branca, que, se aceito, permitiria ao presidente justificar tarifas com base em qualquer motivo “maluco”, como escassez de manteiga de amendoim.
O caso agora tramita no Tribunal de Apelação do Circuito de Washington, que deve emitir novo veredicto entre o fim de agosto e o início de setembro.
QUEDA DA SOBRETAXA DE 50%
De acordo com Somin, eventual confirmação da ilegalidade das tarifas recíprocas implicará automaticamente na queda da sobretaxa de 50% imposta ao Brasil. “Não é 100% certo, mas há 95% de certeza de que isso também ditará o resultado do caso do Brasil”, afirmou.
Paralelamente, empresa americana que importa suco de laranja — um dos cerca de 700 produtos brasileiros afetados — abriu ação específica contra as tarifas para o Brasil, mas o processo ainda aguarda análise em primeira instância.
Trump justificou a nova taxação, sob alegação que o governo Lula representa ameaça à segurança dos EUA, e citou supostas violações à liberdade de expressão e perseguição política ao ex-presidente.
SEM RESPALDO LEGAL
Para Somin, essas alegações não têm respaldo legal e ferem o princípio constitucional da separação de poderes. “Assim como no Brasil, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário são independentes”, disse o jurista.
A Constituição dos EUA estabelece que o poder de impor tarifas cabe ao Congresso. O presidente só pode exercer esse poder em condições muito específicas e com base jurídica sólida. O que está em jogo, segundo Somin, é perigoso precedente de abuso de autoridade:
“O governo está dizendo que o presidente pode impor tarifas a qualquer nação que ele quiser, por qualquer motivo que ele quiser, a qualquer hora que ele quiser, e essencialmente não há limite para esse poder que ele está reivindicando”, disse.
ATAQUE À SOBERANIA NACIONAL
As declarações de Somin reforçam a posição do governo brasileiro de que as tarifas são ataque à soberania nacional.
Desde que a Casa Branca condicionou as negociações comerciais à suspensão do processo judicial contra Bolsonaro, no STF (Supremo Tribunal Federal), o Itamaraty e o Palácio do Planalto vêm reiterando que não aceitarão qualquer forma de ingerência estrangeira sobre o Judiciário brasileiro.
Ao apontar a ilegalidade da medida e prever a derrubada, desse tarifaço, nos tribunais americanos, o jurista estadunidense fornece mais argumento jurídico e político para a contestação do tarifaço de Trump.