Vinte Câmaras industriais da Argentina, de distintos setores produtivos, exigiram do governo de Mauricio Macri acabar com os aumentos abusivos dos serviços públicos, conter as importações e investir no crescimento do mercado interno. Segundo informações do Instituto de Energia Scalabrini Ortiz (IESO), a conta de gás nos dois últimos anos subiu em média 600% e a de eletricidade o fez em 1000%. É verdade que a inflação não foi pequena, em 2016 o índice anual chegou a 40,3% e em 2017 ficou em 24,8%. Nada que justifique, porém, o aumento descontrolado das tarifas de serviços, que também se estende aos transportes.
As entidades, representantes de pequenas e médias empresas do país, estiveram reunidas na terça-feira, 17, no Hotel Castelar de Buenos Aires, local próximo da sede da União Industrial Argentina (criticada pelas pequenas e médias empresas por sua inação – e cumplicidade – frente à política antinacional do governo) centenas de empresários e especialistas se reuniram para debater a crise gerada por esses preços. Andrés Repar, especialista do IESO, indicou na abertura do encontro que “não se entende por que os preços do gás na boca do poço e da geração elétrica são superiores aos internacionais. As petroleiras até recebem subsídios”.
“Não pode haver mais aumentos tarifários. A indústria nacional não está em condições de trasladar os incrementos das contas aos preços porque não há demanda, com o que muitas empresas se endividam, se apequenam ou fecham. E isso é um efeito dominó, quando uma empresa anda mal, transfere seus problemas a seus fornecedores, que também são pequenas e médias empresas”, frisou Daniel Rosato, presidente da entidade Pequenos e Médios Industriais Argentinos.
“A tarifa elétrica não é nossa única reclamação, também há outras questões como os custos logísticos. Acredito que as empresas nacionais não estão na agenda do governo”, disse Antonio Paolini, da Câmara do Plástico. “Temos menores vendas, maiores custos creditícios, de impostos, de tarifas e ainda aumentam as importações de produtos que produzimos aqui com muita qualidade. Todas essas mudanças se realizaram de forma muito abrupta e não deram tempo às nossas empresas para se adaptar. Aliás, mesmo que dessem tempo é difícil subsistir nessas condições. Nos pedem que sejamos competitivos mas pagamos tarifas altíssimas”, indicou Marco Meloni, da Fundação ProTejer, que reúne empresários da indústria têxtil.
As câmaras industriais advertiram ao governo que se não se reverterem as linhas centrais da política tarifária, monetária e de contenção da demanda interna empresas no setor continuarão fechando as portas. As importações de produtos agropecuários de produção tradicional no país, tipo carnes para consumo, legumes, grãos, aumentou em até 127%, e de produtos têxteis em 282%, segundo dados da Confederação Argentina da Média Empresa, CAME.
“Aranguren – ministro de Energia – tem a teoria pela qual se remunera cada ator do mercado de gás segundo o preço mais caro de importação, quando a lógica deveria ser pagar um preço médio. Além disso, não existe contraprestação nesse preço. O custo de gás em 2014 estava em 2,6 dólares, o mesmo nível que nos EUA. Já estamos no dobro desse valor em dólares, mas os custos internos medidos nessa moeda não se modificaram, enquanto que o custo de extração, segundo os balanços das petroleiras, está em 1,8 dólares. A produção de cru vai barranca abaixo e o leve avanço da produção de gás não se justifica pelo fabuloso incentivo de preços”, denunciou Andrés Repar. O especialista citou o titular da empresa técnica, Techint, Paolo Rocca, que disse que o gás na boca do poço deveria estar entre 3 e 4 dólares. “Isso implica que a conta de gás teria que baixar imediatamente pelos menos em 30%”, concluiu.
As denúncias com exemplos das consequências do ‘tarifaço’ se multiplicam. “Na minha empresa, a conta de luz subiu 1014% em dois anos e o gás, 853%. Ao mesmo tempo, os salários no meu setor subiram 57%. Os aumentos de tarifas também nos afetam pela baixa do consumo. Como a incidência desses serviços passou de 2 a 25% no orçamento familiar, se reduz o dinheiro disponível para o consumo. Ainda por cima sobem as importações”, disse Rodolfo Liberman, da entidade Apyme. “A conta de luz passou de 2 mil para 32 mil pesos na minha empresa, onde somos vinte pessoas”, assinalou Sergio Panossian, da Câmara do Calçado. “Quando a conta aumenta em 50%, os preços nas prateleiras crescem 10%. Ou seja, afeta a toda a sociedade”, disse Rosato.
SUSANA SANTOS