“Verificou-se que o impacto das medidas tomadas até então implica elevado custo para o consumidor”, diz relatório
Um relatório de técnicos do Tribunal de Contas da União (TCU), obtido pelo GLOBO, aponta uma série de falhas na condução do governo Bolsonaro na crise hídrica do ano passado. Na avaliação do TCU, o governo tomou medidas de “maneira açodada e com pouca previsibilidade” porque não teve um plano de contingência para enfrentar o problema. Para o pior período de seca já vivido pelo país em mais de 90 anos, o governo adotou como foco o acionamento das caríssimas usinas térmicas – ação que levou ao encarecimento da energia para os consumidores.
Segundo os técnicos do TCU, a maioria das medidas adotadas pelo governo no ano passado “teve foco no aumento da oferta de energia, sem estudos ou análises detalhadas de impacto que corroborassem essa escolha, negligenciando ações do lado da demanda, havendo pouco incentivo para o deslocamento ou redução do consumo”.
“As medidas tomadas pelas entidades e órgãos relacionados ao setor elétrico, até que houvesse a melhoria nos índices de chuvas, não foram organizadas antecipadamente, de forma transparente e previsível”, diz o texto. O relatório, ainda em caráter preliminar, faz parte de um processo aberto pelo tribunal para acompanhar as ações do governo durante a crise. Ele foi encaminhado aos órgãos responsáveis pela gestão da crise antes de uma conclusão por parte dos ministros do tribunal.
Além do acionamento de todo o parque térmico do país (usinas de gás natural, óleo diesel, carvão e biomassa), o governo Bolsonaro mudou regras de vazão de hidrelétricas para privilegiar a geração de energia.
Os técnicos do TCU destacaram no documento que as medidas adotadas para o enfrentamento da crise hídrica foram implementadas sem a estimativa prévia dos seus impactos tarifários e com custos elevados para os consumidores.
“No que concerne à estimativa de impactos tarifários das medidas adotadas para o enfrentamento da crise, verificou-se que o impacto das medidas tomadas até então implica elevado custo para o consumidor. Além disso, constatou-se que as medidas foram implementadas sem a necessária previsão antecipada dos impactos tarifários aos consumidores”, escreveram os técnicos do TCU.
Para aumentar a oferta de energia, o governo Bolsonaro realizou um leilão de contratação simplificada de termelétricas que, na avaliação do TCU, foi planejado para ser executado em tempo muito curto, muito inferior ao usual ou recomendável para contratações da magnitude desse leilão.
O custo desta medida é estimado em R$ 39 bilhões pelo TCU. Essa soma está sendo repassada aos consumidores brasileiros por meio da bandeira tarifária da “Escassez Hídrica”, em vigor desde setembro, com fim programado para abril. Ela representa um custo extra de R$ 14,20 a cada 100 quilowatts-hora consumidos.
INFLAÇÃO
A má gestão do governo Bolsonaro na crise hídrica, junto com os sucessivos aumentos nos preços dos combustíveis, levou a inflação brasileira – já alavancada pela desvalorização do real frente ao dólar – a fechar o ano de 2021 acima dos dois dígitos, 10,06%, maior alta desde 2015, segundo o IBGE. No ano passado, a energia elétrica acumulou alta de 21,21%.
Para que parte dos impactos deste bandeiraço não seja sentido neste ano de eleição presidencial, Bolsonaro editou uma medida provisória (MP) que permite um empréstimo embutido nas tarifas de energia. Este empréstimo às distribuidoras da ordem de R$ 15 bilhões será cobrado nos próximos anos, com adição de juros. Os técnicos do TCU afirmam que essa medida provisória foi editada sem a realização de uma análise prévia dos custos e consequentemente dos impactos tarifários.