Na ocasião da reunião em que foram enviados dois pacotes de joias de luxo, avaliadas em R$ 16,9 milhões, para Bolsonaro e Michelle, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, conversou com o governo da Arábia Saudita sobre a venda de “ativos da Petrobrás” e sobre a possível entrada do Brasil na OPEP+.
Até agora, foi revelado que Jair Bolsonaro recebeu três pacotes de presentes vindos da Arábia Saudita, que juntos, valem R$ 17,4 milhões. Esses presentes levantam a suspeita dos investigadores de pagamento de propina em acordos que lesaram o Brasil.
A negociação entre Bento Albuquerque e o príncipe saudita Abdulaziz bin Salman Al Saud, responsável pela área energética no país, foi registrada em um telegrama da embaixada do Brasil na Arábia Saudita enviado para o Itamaraty.
O telegrama foi enviado no dia 15 de novembro de 2021, três semanas depois da ida de Bento Albuquerque à Arábia Saudita, e é assinado pelo embaixador Marcelo Della Nina. Nele, não há menção aos “presentes” para Bolsonaro.
O documento foi divulgado pelo site G1, obtido através da Lei de Acesso à Informação (LAI).
Segundo o relato do embaixador, o ministro Bento Albuquerque chamou a Arábia Saudita de “parceiro privilegiado” e pediu que o Brasil fosse convidado formalmente a participar da OPEP+, que é a versão “ampliada” da Organização dos Países Exportadores de Petróleo.
Ele prometeu que levaria o assunto até Jair Bolsonaro, que era presidente.
Bento Albuquerque também “manifestou-se favoravelmente ao adensamento da cooperação bilateral” entre o Brasil e a Arábia Saudita.
No telegrama, o embaixador registrou que o assessor especial de Relações Internacionais do Ministérios de Minas e Energia, Christian Vargas, informou aos árabes que a Petrobrás estava sendo “desverticalizada” e vendendo seus “ativos ‘donwstream’”, ou seja, tendo suas partes privatizadas, e questionou se isso seria compatível com a política dos países da OPEP+.
“A Petrobrás passa, no momento, por processo de desverticalização e de alienação de seus ativos ‘downstream’, como parte de reformas do setor de energia que apontam para a crescente liberalização do mercado, no qual os entes estatais encontram limitações legais para intervir”, falou Christian Vargas.
Ele “indagou à parte saudita a respeito da compatibilização entre o setor de petróleo dos países da OPEP+ e o do Brasil, onde as companhias petroleiras são de capital aberto”.
DIAMANTES DE PRESENTE
Foi durante essa reunião, na qual foram tratados assuntos importantes e sensíveis para o desenvolvimento do país, que Bento Albuquerque recebeu joias avaliadas em R$ 16,5 milhões para entregar, no Brasil, para Jair e Michelle Bolsonaro.
Uma vez que as joias não eram para o estado brasileiro, sua entrada no país só pode acontecer mediante pagamento de imposto. Para evitar isso, Bento Albuquerque e seus assessores não declararam nada à Receita Federal e tentaram entrar com as joias escondidas.
Um primeiro pacote, com peças de ouro e diamante da marca Chopard, conhecida por ser utilizada por famosos no tapete vermelho do Oscar, e uma estátua dourada de um cavalo foi identificado pela Receita Federal e apreendido. O montante é avaliado em R$ 16,5 milhões.
Mais tarde, Jair Bolsonaro tentou retirar, mas sem sucesso, o pacote sem pagar impostos, mobilizando ilegalmente ministérios, funcionários públicos, um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) e a chefia da Receita Federal, Julio Cesar Vieira Gomes, que foi indicado por ele.
Uma última tentativa de liberar as joias aconteceu no dia 29 de dezembro de 2022, um dia antes de Bolsonaro fugir para os Estados Unidos.
Já o segundo pacote, com um relógio, uma caneta, um par de abotoaduras, um anel e um rosário árabe, tudo da Chopard, conseguiu ser levado até Jair Bolsonaro sem o conhecimento da Receita Federal. O estojo vale R$ 400 mil.
Mesmo após ser revelada a existência do pacote retido na Receita Federal, Bolsonaro escondeu que tinha recebido e incluído em seu acervo pessoal o segundo pacote.
Por determinação do Tribunal de Contas da União (TCU), o ex-presidente teve que entregar as peças de luxo ao estado brasileiro.
Além dessas joias trazidas para Bolsonaro em 2021, o ex-presidente recebeu de presente da Arábia Saudita um outro, em 2019, que também foi omitido das autoridades.
Esse terceiro estojo, que continha um relógio da marca Rolex com diamantes encravados, uma caneta da Chopard, um par de abotoaduras, um anel e um rosário árabe, foi avaliado em pelo menos R$ 500 mil.
Bolsonaro trouxe para o Brasil os “presentes” que recebeu quando esteve na Arábia Saudita e os incluiu em seu acervo pessoal. Ele chegou a usar uma fazenda do ex-piloto Nelson Piquet para manter as peças de luxo.
Também por ordem do TCU, teve que entregar as peças que manteve em segredo.
SUSPEITA DE PROPINA
O alto valor dos presentes entregues pela Arábia Saudita ao então presidente Bolsonaro levantou a suspeita de que os pacotes seriam, na verdade, uma forma de pagar propina por acordos que beneficiassem o país do Oriente Médio.
O presidente da Comissão de Transparência do Senado Federal, Omar Aziz (PSD-AM), afirmou que o caso será investigado pela Casa.
“Nunca vi ninguém dar R$ 16 milhões de presente para uma primeira-dama. Isso é a versão do Bento Albuquerque, que será investigada”, disse.
A Polícia Federal também está investigando o caso. Investigadores descobriram que os funcionários da Presidência registraram, no dia 29 de dezembro de 2022, no sistema do acervo pessoal de Bolsonaro, o pacote que foi retido pela RF, indicando que esse seria o destino das peças de luxo após serem retiradas ilegalmente da alfândega.