(Com muita honra)
CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE
Bandeira de uma república visionária
branca branca branca branca
república nunca proclamada
branca
rubra
do sangue do único republicano
em triângulo multiângulo de membros repartidos.
Lá vem o Liberdade pela Rua da Quitanda
lá vai o Liberdade, o Corta-Vento,
vai armando sua teia
que 100 anos não desfazem.
Cavaleiro boquirroto,
cavaleiro apaixonado,
com a garra da paixão
semeando rebelião:
— Despotismo
pobreza
beata ignorância
no chão de ouro das minas
riqueza mísera entre ferros.
Palavra cochichada, brasa oculta,
conversa bêbada na estalagem,
na casa de rameiras,
no varandão da fazenda,
no quarto de dormir do Coronel,
no morro-sobe-desce-toda-vida.
(Ai Minas, que mil distâncias na distância
de ti a ti, peito enfurnado.)
— Se todos fossem do meu ânimo…
Mas lá está a mão de Deus.
Pensamento-rastilho
ideia fixa
prego pregado no futuro:
liberdade
americana.
Semelhantes traças nem pensar se deve.
Frioleiras
disparates
parvoíces.
Fujam deste homem que ele está doido.
O demônio o tentou para tramar escândalos
que lhe hão de custar a prateada cabeça.
Quer os frutos da terra divididos
entre mazombos pretos índios
escolas fábricas no país florente
de livres almas
americanas.
Solta a linguagem
dos insubmissos, a arenga
dos desatinados
e até nas fábulas
que vai urdindo,
a louca palavra
dos verdadeiros.
Aluado
de jogar pedra,
de ser pateado
na Casa da Ópera,
de morrer na forca
morte infamante,
despedaçar-se
distribuir-se
pelos caminhos
e consciências
viver na glória.
(O perdido latim, a insensível trindade,
a desfeita esperança?
O constante lembrar.)
Lá vem, lá vai
o Corta-Vento pelas serranias
mantiqueiras.
No chão queimado
ainda retine
o tropel rosilho
de seu cavalo
enchendo o vale,
o plaino, o espaço
americano.