O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder da oposição no Senado, criticou a postura do ministro do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, de impedir, a pedido do senador Flávio Bolsonaro, que o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) entregue para integrantes do Ministério Público informações sobre movimentações financeiras suspeitas detectadas pelo órgão. Randolfe comparou Dias Toffoli a um “monarca absolutista”.
Para o senador, além de impedir as investigações, o ministro Toffoli, numa afronta ao Estado democrático, decidiu requisitar todas as informações constantes em relatórios financeiros sigilosos do Coaf. “Requisitar uma montanha de relatórios financeiros sigilosos do Coaf e da Receita Federal é medida ofensiva ao próprio Estado democrático que o Supremo deve preservar e defender”, observou o senador.
No início da noite de segunda-feira (18/11), Dias Toffoli revogou a decisão dele mesmo sobre acesso de dados sigilosos de 600 mil pessoas.
A defesa do senador e filho de Bolsonaro, Flávio Bolsonaro, entrou com um pedido no STF para que fossem suspensas todas as investigações que tivessem utilizado informações entregues pelo Coaf sem autorização judicial.
O ministro Dias Toffoli atendeu ao pedido e, desde julho, 935 investigações – sobre tráfico de drogas, corrupção, sonegação e outros delitos – estão paradas somente no Ministério Público Federal.
Ao todo, apontou o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), em documento enviado a Toffoli, foram paralisadas “dezenas de milhares de investigações envolvendo organizações criminosas em todo o país, envolvendo não somente casos de corrupção, mas também de tráfico de entorpecentes, tráfico de armas e milícias, dentre vários outros delitos nos quais corriqueiramente se promove o intercâmbio de informações entre autoridades com poder de investigar e a unidade de inteligência financeira“.
“A prevalecer tal entendimento, mesmo investigações que já estejam submetidas ao crivo do Poder Judiciário, com o deferimento de medidas cautelares em curso (abrangendo não somente afastamentos de sigilo bancário e fiscal, mas também interceptações telefônicas ou telemáticas), haveriam de ser paralisadas, bastando para tanto que o procedimento estivesse instruído com um RIF (de ofício ou de intercâmbio) encaminhado pelo COAF em data anterior à decisão judicial (cf. MPRJ, Manifestação ao Excelentíssimo Senhor Presidente do STF no Recurso Extraordinário nº 1.055.941/SP, p. 3, grifo no original) .
A decisão final está prevista para ser tomada pelo plenário do STF na próxima quarta-feira (20).
Em janeiro deste ano o Coaf detectou uma movimentação irregular na conta de um ex-assessor de Flávio Bolsonaro, Fabrício Queiroz. Foram movimentados R$ 1,2 milhão entre 2016 e 2017 e um total de R$ 7 milhões na conta de Queiroz entre 2014 e 2016.
Também foram descobertos depósitos de vários funcionários do gabinete na conta do assessor, além de um cheque nominal deste para a primeira dama, Michelle Bolsonaro, no valor de R$ 24 mil.
Também foi flagrado que vários funcionários eram fantasma, ou seja, estavam lotados no gabinete do senador, mas nunca tinham comparecido à Assembléia Legislativa. Alguns deles residiam até no exterior. A Polícia Federal iniciou a Operação Furna da Onça e prendeu dez deputados estaduais acusados de lavagem de dinheiro.
O Ministério Público do Rio deu início então à investigação do gabinete de Flávio Bolsonaro com a suspeita de malversação de recursos públicos, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Durante as investigações descobriu-se também íntimas ligações entre o gabinete de Flávio Bolsonaro e as milícias do Rio das Pedras, na Zona Oeste do Rio.
A mãe e a mulher do ex-policial e miliciano, Adriano Nóbrega, chefe do Escritório do Crime, espécie de central de assassinatos por encomenda das milicias, trabalhavam no gabinete do filho de Bolsonaro.
O então deputado chegou a homenagear o miliciano, que atualmente está foragido, com a Medalha Tiradentes, maior honraria do estado. Quando Adriano recebeu a medalha de Flávio Bolsonaro, ele estava preso por assassinato. Adriano era chefe de Ronnie Lessa, vizinho de Bolsonaro no condomínio da Barra, que está preso, acusado de assassinar a vereadora Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes.
Logo após tomar posse, Jair Bolsonaro iniciou uma cruzada contra todos os órgãos que investigavam seu filho. A primeira vítima foi a Superintendência da Polícia Federal do Rio. Bolsonaro criou uma crise com a corporação ao anunciar a demissão do superintendente da PF no Rio, Ricardo Saadi. Era uma vingança contra a investigação do filho.
Ele pretendia nomear um delegado do Amazonas, amigo da família, para a vaga, mas, a reação dos delegados à intromissão do Planalto acabou barrando a indicação, mas não a exoneração de Saadi.
Em seguida, Bolsonaro começou a perseguir o Coaf. Primeiro tirou o órgão do Ministério da Justiça e colocou-o no Ministério da Economia. Quando seu diretor presidente, Roberto Leonel, criticou a decisão de Toffoli de suspender as investigações calcadas em informações do Coaf, Bolsonaro imediatamente anunciou sua demissão.
Não satisfeito, ele praticamente extinguiu o Coaf, criando um outro órgão, com outro nome e transferiu-o para o terceiro escalão do Banco Central.
A partir de então, Bolsonaro partiu para cima da Receita Federal, que havia quebrado, a pedido da Justiça,o sigilo fiscal de Flávio, de Queiroz e de outras pessoas envolvidas no esquema. A cabeça do secretário da Receita, Marcos Cintra, foi cortada. O pretexto foi a volta da CPMF, mas o motivo real foi a resistência em trocar agentes que investigavam Flávio.
A última medida tomada por Bolsonaro para acobertar os crimes do filho foi costurar com Gilmar Mendes e Toffoli – que chegaram a ser recebidos no Palácio sem agenda pública – um acordão que consistiu em afrouxar a pressão pela prisão após condenação em segunda instância em torca da manutenção das restrições às investigações envolvendo informações do Coaf. Até o fechamento desta reportagem, o acordo está sendo cumprido à risca.