Ministro do STF ignorou a confissão de corrupção da empreiteira. Meses atrás ele já havia livrado a J&F do pagamento de R$ 10,3 bilhões do acordo de leniência
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, suspendeu nesta quarta-feira (31) o pagamento de multas pela empreiteira Novonor, antiga Odebrecht, definidas no acordo de leniência firmado pela própria empresa com o Ministério Público em 2016, após os escândalos de corrupção envolvendo a empresa no âmbito da Operação Lava Jato.
O ministro classificou como imprestáveis as provas obtidas a partir das confissões dos 77 executivos da empreiteira e do acesso aos sistemas usados pelo Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht – o chamado “departamento de propinas” da companhia.
A Odebrecht assinou, em 2016, um acordo de leniência em que se comprometia a pagar R$ 8,5 bilhões para que fossem suspensas todas as ações que envolviam a empreiteira e a Braskem, uma das empresas do grupo. Fatos vindos à tona em 2019, na operação Spoofing, da Polícia Federal, embasaram a nova posição de Toffoli.
Nesta nova decisão, o ministro suspende a multa e também permite que seja aberta uma nova negociação sobre os termos do acordo com a Procuradoria-Geral da República (PGR), a Controladoria-Geral da União (CGU) e a Advocacia-Geral da União (AGU).
Após as alegações de Dias Toffoli, chamado por Marcelo Odebrecht, em e-mails internos, de “amigo do amigo do meu pai”, a empreiteira, que havia assinado o acordo e confessado o pagamento de subornos em mais de 10 países da América Latina, alegou que “uma simples análise parcial do material obtido a partir da Spoofing” permite corroborar as suspeitas de que foram praticados excessos, em relação a ela, pelos membros da força-tarefa da Lava Jato, que visavam coagi-la a assinar um acordo.
O acordo, assinado pela Odebrecht com o Ministério Público Federal, a Controladoria-Geral da União e a Advocacia-Geral da União, previa que a empreiteira pagasse um total de R$ 8,512 bilhões em um prazo de 23 anos. Com a decisão tomada por Toffoli, que já havia liberado também os irmãos Batista, da JBS, de pagarem suas multas, a empreiteira estará liberada destes compromissos.
Toffoli afirmou em sua decisão que, “diante das informações obtidas até o momento no âmbito da Operação Spoofing, no sentido de que teria havido conluio entre o juízo processante e o órgão de acusação para elaboração de cenário jurídico-processual-investigativo que conduzisse os investigados à adoção de medidas que melhor conviesse a tais órgãos, e não à defesa em si, tenho que, a princípio, há, no mínimo, dúvida razoável sobre o requisito da voluntariedade da requerente ao firmar o acordo de leniência”.
Baseado nesta avaliação, o ministro, que já havia dispensado o pagamento de R$ 10,3 bilhões do acordo de leniência da J&F, liberou também a empreiteira para interromper os pagamentos da multa acertada no acordo de leniência.
Toffoli argumentou, ainda, que, mesmo tendo havido confissões, sua decisão busca “assegurar a efetividade da ampla defesa e do contraditório aos réus”. “Deve-se oferecer condições à requerente para que avalie, diante dos elementos disponíveis coletados na operação ‘spoofing’, se de fato foram praticadas ilegalidades”, concluiu Toffoli.
Toffoli, que havia impedido Lula, então preso, de comparecer ao velório de seu irmão, Vavá, determinou, agora, que a suspensão do pagamento da multa pela Odebrecht seja mantida até que a Novonor – novo nome da Odebrecht – consiga analisar todo o material relacionado à Operação Spoofing.
O objetivo, segundo o pedido da empresa, é para que possam “ser empregadas as providências devidas frente às fundadas suspeitas de vício na celebração das referidas avenças, decorrente de atos praticados por autoridades”.
CGU QUER CONTINUIDADE DOS PAGAMENTOS
O ministro-chefe da Controladoria-Geral da União (CGU), Vinicius Carvalho, disse nesta sexta-feira (2), em entrevista à Globonews, que não há perspectiva de suspensão dos acordos firmados pelo órgão com empresas no âmbito da Lava Jato, após o ministro Dias Toffoli, do STF (Supremo Tribunal Federal), suspender os pagamentos no âmbito do acordo de leniência firmado entre a Novonor, antiga Odebrecht com o MPF (Ministério Público Federal).
“Não há nenhuma decisão hoje sobre revisão ou anulação, qualquer coisa desse tipo, ou suspensão de pagamentos dos acordos celebrados com a CGU”, disse Carvalho. “Da nossa perspectiva, nossos acordos são hígidos e estão sob vigência, estão valendo. Não tem nenhuma perspectiva nossa de suspender os acordos, porque de fato não há nenhuma decisão sobre os nossos acordos”, acrescentou o ministro-chefe.