O ex-ministro da Justiça de Bolsonaro, Anderson Torres, tentou tirar o corpo fora e disse à Polícia Federal que sua subordinada, a ex-diretora de Inteligência, Marília Alencar, mapeou os locais onde Lula foi mais bem votado no primeiro turno por iniciativa própria.
No entanto, a ex-diretora foi ouvida pela PF no dia 13 de abril e afirmou expressamente que o levantamento foi feito a pedido de Torres, seu chefe à época.
Torres também falou que não passou o documento para a Polícia Rodoviária Federal (PRF), que teria realizado, segundo ele, as blitze no dia do segundo turno sem sua interferência.
Em seu depoimento à Polícia Federal, que o site G1 teve acesso e divulgou, sobre o escândalo da tentativa de fraudar o segundo turno das eleições, Anderson Torres se esforçou para fingir que não tem nada a ver com o caso e que tudo é culpa de seus subordinados, inclusive do então chefe da PRF na época, Silvinei Vasques.
Entre o primeiro e o segundo turno, Marília Alencar produziu uma planilha mapeando os locais onde Lula recebeu mais de 75% dos votos.
Anderson Torres falou que “a iniciativa partiu da própria Marília [Alencar]”, sua diretora de Inteligência e que “o intuito era relacionar crimes eleitorais” e “fomentar tais discussões”.
O documento, disse Torres, foi apresentado em uma reunião com membros da Secretaria de Operações Integradas (SEOPI), mas ele não se lembra se estavam presentes policiais federais e policiais rodoviários federais.
Novamente visando jogar a culpa em Marília, o ex-ministro falou que “não sabe explicar o número em questão e que não havia visto tal métrica antes”.
Sobre as blitz realizadas pela PRF no dia do segundo turno, Anderson Torres disse que tratavam-se de “atuações normais em todo território nacional”. Ele ainda disse que chegou a conversar com o chefe da corporação, Silvinei Vasques, que reforçou que “a atuação da PRF era normal”.
O ex-ministro de Bolsonaro citou Alexandre de Moraes, que garantiu, em coletiva de imprensa realizada no dia do segundo turno, que todos os eleitores tinham conseguido chegar a seus locais de votação.
O que Anderson Torres não citou é que as operações foram encerradas por determinação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Caso Silvinei Vasques não cumprisse a determinação de interromper as operações, seria aplicada uma multa pessoal de R$ 100 mil por hora, ele seria afastado do cargo e seria preso em flagrante por desobediência e crime eleitoral.
Anderson Torres negou que tenha levado o mapeamento feito por seu Ministério até a PRF e que “não tem conhecimento se Silvinei [Vasques] direcionou a atuação da PRF”.
Um dia antes das eleições, Vasques publicou em suas redes sociais uma imagem pedindo votos para Jair Bolsonaro, o que é ilegal para que está chefiando a Polícia Rodoviária Federal.
A Polícia Federal descobriu que Anderson Torres viajou, durante o período eleitoral anterior ao segundo turno, para a Bahia. A avaliação é que ele tenha discutido com os chefes regionais da PF a adesão ao plano de bloquear estradas no dia da votação.
Torres falou que foi até a Bahia em um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) para visitar uma obra.
Anderson Torres está preso desde janeiro por ter, enquanto Secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, ajudado os terroristas que invadiram Brasília no dia 8 de janeiro. Em sua casa, a Polícia Federal encontrou a minuta de um decreto que alteraria o resultado das eleições para manter Jair Bolsonaro no poder.
Leia o depoimento de Torres na íntegra publicado pelo G1:
“Questionado sobre a atuação da Polícia Rodoviária Federal – PRF no segundo turno das eleições de 2022, o declarante afirma que as informações que Ihe foram passadas via Secretaria de Operações Integradas do MJSP – SEOPl eram de atuações normais em todo território nacional;
QUE o declarante chegou a conversar com o ex-Diretor Geral da PRF, SILVINEI VASQUEZ, questionando acerca das notícias que estavam sendo divulgadas na mídia no dia 30/10/2022, segundo as quais a PRF estaria realizando abordagens nas rodovias federais, tendo SILVINEI afirmado que a atuação da PRF era normal, chegando, inclusive, a escoltar veículos que estariam sem condições de trânsito para garantir o direito de voto;
QUE, no mesmo dia 30/10/2022, SILVINEI informou por telefone ao declarante que estaria se dirigindo a uma reunião com o Presidente do TSE, Ministro ALEXANDRE DE MORAES, para tratar do referido assunto;
QUE, depois da reunião, quando já havia sido encerrada a votação, mas ainda não a apuração, o declarante assistiu a uma entrevista do Ministro, o qual afirmou que nenhum eleitor havia deixado de votar em razão da atuação da PRF e, no mesmo contexto, o Ministro afirmou que pela primeira vez na história a abstenção no segundo turno havia sido menor que no primeiro;
QUE SILVINEI também informou ao declarante que o procedimento da PRF no segundo turno havia sido praticamente o mesmo que no primeiro turno; QUE o planejamento operacional da PRF, assim como o da PF e o das 27 Secretarias de Segurança Pública dos Estados, foi apresentado ao MJSP, via SEOPI;
QUE os planejamentos operacionais em questão eram apresentados com autonomia pelas instituições, sendo que a função da SEOPI era fomentar ações integradas para consecução de determinados objetivos, dentre os quais a OPERAÇÃO ELEIÇÕES 2022;
QUE o declarante não tinha atribuição para vetar o planejamento operacional de qualquer instituição;
QUE o fomento exercido pela SEOPI consistia em descentralizar recursos para o custeio das ações em questão; QUE o declarante confirma ter recebido da então Diretora de Inteligência – DINT da SEOPI, DPF MARILIA ALENCAR, um Bl contendo informações acerca dos locais nos quais ambos os candidatos a Presidente da República concorrentes ao segundo turno das eleições de 2022 tiveram mais do que 75% dos votos no primeiro turno, sendo que a iniciativa partiu da própria DPF MARILIA, haja vista ser uma das atribuições da DINT;
QUE o intuito do Bl era relacionar crimes eleitorais, mas o declarante não levou a informação adiante haja vista não entender que os dados contidos no Bl eram indicativos de crimes eleitorais;
QUE outra informação levada ao conhecimento do declarante pela DINT foi referente a uma possível atuação de facções criminosas no Estado do Rio de Janeiro, as quais estariam agindo de forma a coagir eleitores a votar em determinado candidato, sendo que a DINT atuou para tentar confirmar a veracidade das informações, mas isso não foi confirmado; QUE, com relação ao “Bl dos 75%”, o declarante afirma não tê-lo levado ao conhecimento da PRF, acreditando que não houve sequer difusão pelos canais de inteligência:
QUE, questionado sobre a ação da PRF no segundo turno das eleições de 2022 a princípio ter sido mais enfática nos locais onde o então candidato LULA teria recebido 75% ou mais de votos no primeiro turno, o declarante afirma que SILVINEI VASQUEZ Ihe informou que a ação foi praticamente a mesma do primeiro turno, não tendo havido qualquer direcionamento;
QUE a PRF tinha autonomia operacional, como já dito, e as informações da ação da PRF foram repassadas ao declarante por SILVINEI; QUE o declarante afirma que, salvo engano, o local onde houve mais abordagens da PRF foi o Estado de Alagoas – AL, onde o candidato LULA obteve mais votos, sendo que o segundo local com mais abordagens foi o Estado do Mato Grosso do Sul – MS, onde o candidate BOLSONARO foi o mais votado; QUE questionado pelo Promotor de Justiça acerca das abordagens nos Estados de Alagoas e Mato Grosso do Sul, se a classificação das mesmas foi em números proporcionais a quantidade de habitantes ou números totais afirma não saber esclarecer;
QUE não houve qualquer determinação do declarante para que a PRF agisse de forma mais contundente no Nordeste;
QUE o Advogado SMANIOTTO solicita que seja consignado que também não houve a determinação para que a PRF agisse de tal forma em qualquer outro Estado da Federação QUE a gestão do declarante no MJSP foi técnica e as determinações eram de coibição a todos os crimes eleitorais, independente do partido de quem os cometesse;
QUE não tem conhecimento se SILVINEI direcionou a atuação da PRF, sendo que o mesmo Ihe disse que havia uma determinação do TSE, já contida no planejamento operacional da PRF, de não abordar ônibus no dia das eleições;
QUE não se recorda ao certo se a determinação era de fato não abordar ou não apreender veículos ou ainda de não impedir eleitores no dia das eleições;
QUE, com relação a outro fato, o declarante havia se dirigido a Juiz de Fora/MG no dia em que o ex-Deputado Federal ROBERTO JEFFERSON atentou contra Policiais Federais em sua própria residência, sendo que, quando chegou a tal cidade, a situação já estava controlada pela PF, não havendo necessidade de qualquer atuação do declarante:
QUE o declarante estava na companhia de várias pessoas do Governo em São Paulo/SP, sendo que, foi sozinho, com sua segurança pessoal para Juiz de Fora/MG;
QUE os fatos ocorreram em uma cidade do Estado do Rio de Janeiro próximo a Juiz de Fora/MG;
QUE o declarante estava em São Paulo/SP, de onde se dirigiu a Juiz de Fora, onde na noite daquele dia, encontrou o então Diretor-Geral da PF, MARCIO NUNES, e o Secretário Executivo do MJSP, Brigadeiro ANTONIO RAMIREZ LORENZO:
QUE, no dia seguinte, todos foram até o Rio de Janeiro/RJ a uma reunião no Arquivo Nacional, sendo que na viagem, o DPF MARCIO convidou o declarante para irem até Salvador/BA, onde visitariam a obra da SR/BA, haja vista que o declarante tinha o intuito de fazer a entrega de tal obra;
QUE na SR/BA. no dia 25/10/2022, foram recebidos pelo então Superintendente Regional da PF, DPF ALMADA, em uma reunião, na qual foi tratado da obra e do trabalho das eleições;
QUE o declarante não solicitou que a PF trabalhasse de forma conjunta com a PRF, mas sim que, visando aumentar a capilaridade da atuação das forças federais, o declarante e o DPF MARCIO sugeriram que nas cidades nas quais a PF não conseguisse atender, fosse solicitado que a PRF o fizesse;
QUE não houve uma resposta se tal sugestão seria acatada; QUE ressalta que não houve determinação para que uma instituição exercesse a atribuição da outra;
QUE, na mesma reunião, o DPF ALMADA informou que notícias semelhantes as de atuação de facções no Estado do Rio de Janeiro estariam ocorrendo na Bahia, mas que a PF havia checado e isso não se confirmou; QUE a viagem para Bahia se deu em avião da FAB;
QUE questionado pelo Advogado RAPHAEL se além da planilha do 75% o declarante recebeu alguma outra planilha, o declarante respondeu que também recebeu estudos referentes a possíveis interferências de facções criminosas no primeiro turno das eleições, o que não se confirmou na prática;
QUE questionado pelo Advogado RAPHAEL se levou o Bl dos 75% em sua viagem à Bahia para apresentar ao DPF ALMADA, afirma que não, sequer se recordando se ficou com tal planilha:
QUE questionado pelo Advogado RAPHAEL sobre a forma como o Bl dos 75% foi apresentado, ou mesmo se o declarante sabe o porquê de tal número (75%) bem como se já havia visto tal métrica, o declarante afirma que o Bl foi apresentado em uma reunião com outros membros da SEOPI, mas que não sabe explicar o número em questão e que não havia visto tal métrica antes, mas que a função da DINT era exatamente fomentar tais discussões;
https://bc1c0155b9af9ecea3f357733b3fff0e.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-40/html/container.html QUE não se recorda se havia Policiais Federais ou Policiais Rodoviários Federais na reunião;
QUE questionado pelo Advogado RAPHAEL a quem competia a difusão das informações de inteligência, o declarante afirma que competia à própria DINT, que era o órgão central de inteligência de segurança pública no Brasil;
QUE questionado pelo Advogado RAPHAEL se o declarante interferiu em qualquer ação operacional da PF ou PRF (blitze, abordagens etc.), o declarante afirma que sua atuação era estratégica, jamais tendo interferido em qualquer ação operacional;
QUE questionado pelo Advogado RAPHAEL se, com relação ao convite do DPF MARCIO ao declarante para a ida à Bahia, havia mais algum motivo além da visitação da obra, o declarante afirma que também tinha o intuito de tratar de vídeos divulgados na Internet, nos quais determinado grupo criminoso alegava ter o controle dos eleitores do local, sendo que o DPF/VLMADA afirmou que tinha tal notícia, a qual, porém, não foi confirmada em checagem;
QUE questionado pelo Advogado RAPHAEL qual foi o período em que foi realizada a visitação da obra da SR/BA declarante afirma que foi no período da tarde, sendo que foram visitados todos os andares da obra e foram tiradas fotografias, salvo engano, até publicadas na Intranet;
QUE questionado pelo Advogado SMANIOTTO se a preocupação com a atuação de facções criminosas em crimes eleitorais se restringiu aos Estados da BA e RJ, o declarante afirma que não, tendo tal preocupação sido com todos os Estados da Federação, tendo inclusive havido uma ação geral do MJSP em todos os Estados”.