(HP 30/05/2012)
A nova versão arranjada pelo ex-presidente do STF, Gilmar Mendes, sobre o teor da conversa que teve com o ex-presidente Lula piorou ainda mais a sua situação.
Em entrevista ao canal Globo News, na segunda-feira (28), ele afirmou que não tinha nenhuma relação com o senador Demóstenes Torres a não ser “relação de conhecimento e trabalho funcional…”. Mas, em seguida descreve a estranha viagem feita pelos dois à Europa. Vejam que explicação inusitada Gilmar teria dado a Lula sobre o encontro no Velho Continente.
“Então eu esclareci essa viagem de Berlim, que era uma viagem que eu fizera, a partir de uma atividade acadêmica que eu tivera na Universidade de Granada, me encontrara com o senador em Praga, isso foi agendado previamente, ele tinha também uma viagem para Praga, então nos deslocamos até Berlim, onde mora a minha filha”, disse o ex-presidente do STF.
Ora. Gilmar estava na Espanha, encontrou-se com Demóstenes em Praga e foram juntos para Berlim. Um tanto estranho esse itinerário, não acham leitores? E isso tudo, segundo Gilmar, sem ter “nenhuma relação com o senador”. Imagine então o que fariam se fossem mais íntimos. O fato é que, depois dessa entrevista, Gilmar Mendes se complicou e terá muito o que explicar ao país.
E mais ainda depois do diálogo abaixo, gravado pela Polícia Federal, com autorização da Justiça, onde Cachoeira aparece autorizando Wladimir Garcez, seu assessor e ex-presidente da Câmara Municipal de Goiânia, a preparar um jatinho para buscar Demóstenes e Gilmar Mendes que chegavam em São Paulo, vindos de Berlim, em 23 de abril de 2011.
Encontraram-se em Praga, foram juntos para Berlim e voltaram para São Paulo. Vejam os diálogos:
Ligação feita em 23/04/2011 19:31:40 23/04/2011 19:34:38 00:02:58:
Cachoeira diz a Wladimir que Demóstenes está em Berlim.
Wladimir diz que o Professor (Demóstenes) está querendo vir de São Paulo no avião do Ataíde [senador Ataídes de Oliveira, do PSDB de Tocantins; suplente, exerceu o mandato no período de 03/05/2011 a 31/08/2011], mas só localizou o piloto e não localizou o Ataíde, daí pergunta se pode autorizar.
Cachoeira responde que pode autorizar.
Wladimir diz que está ele e o Gilmar
Cachoeira diz que vá preparando o Avião enquanto acha o Ataíde.
Diante da dificuldade de conseguir o avião do senador Ataíde, eles seguem tentando resolver a viagem de Demóstenes, agora com o avião de um tal Rossini:
Wladimir: Eu já conversei com o Rossini, tamo organizando já com o Rossini sabe. Por que o piloto num quer fazer, sem autorização do Ataíde, por que depois, o Ataíde num tá … num chega né. Ai eu já liguei pro Demóstenes é … amanhã, o Rossini já tá organizando, ai eu pego ele lá.
Cachoeira: qual que é o avião do Rosssini?
Wladimir: é um jatinho né, ele tem um que é um jatinho que ele falou, um King Air.
Cachoeira: um pequeno, né?
Wladimir: é … ai eu peguei falei com ele, ele falou não, não preocupa não que eu organizo. Porque tá vindo ele e o Gilmar né, por que não vai achar vôo, sabe?
O que já se sabia na CPMI era que Demóstenes e Gilmar tinham se encontrado em Berlim. O detalhe do encontro em Praga só apareceu agora, trazido pelo próprio Gilmar. Da Espanha para Berlim não precisa passar em Praga. Então, por que Gilmar fez esse itinerário? Ele foi se encontrar com Demóstenes em Praga? Que assunto tão importante fez Gilmar sair de Granada para Praga para encontrar Demóstenes?
E mais, surgiu também esse diálogo que já estava circulando por aí, mas ainda não tinha recebido a devida atenção. Um avião acertado por Carlinhos Cachoeira para pegar Demóstenes e Gilmar no aeroporto, vindos de Berlim. Daí foi para Goiânia. Será que esse jatinho parou em Brasília? Tudo isso, agora, tem que ser esclarecido pelo ex-presidente do STF. A versão da tal “conversa bombástica”, em que Lula o teria pressionado, foi um tiro no pé. Acabou complicando ainda mais a vida de Gilmar. Dá para entender agora o motivo da armação de Gilmar, tentando lançar a história de que Lula fez chantagem para adiar o julgamento do mensalão. Gilmar e Veja se anteciparam com um desastrado ataque contra Lula porque a CPMI já sabia da viagem dos dois a Berlim.
Pode ser coincidência, mas, em uma outra conversa entre Demóstenes e Cachoeira, gravada pela PF, aparece que tipo de assunto eles vinham tratando. O senador afirma a Cachoeira ter trabalhado junto com Gilmar para levar ao STF uma ação bilionária envolvendo a Companhia Energética de Goiás (Celg). No diálogo, que durou pouco menos de quatro minutos e ocorreu no dia 16 de agosto de 2011, Demóstenes demonstra intimidade ao tratá-lo apenas como “Gilmar”. Leia o diálogo:
Demóstenes falando, parece prestar contas a Cachoeira: “Conseguimos puxar para o Supremo uma ação da Celg aí, viu? O Gilmar mandou buscar. Deu repercussão geral pro trem aí”, contou o senador, referindo-se a um instrumento processual que permite aos ministros escolherem os recursos que vão julgar de acordo com a relevância jurídica, política, econômica ou social. Enfim, agora não é só a Veja, mas Gilmar também tem que ser investigado.
SÉRGIO CRUZ