
Entidades alertam contra projeto de reforma administrativa e convocam mobilizações em Brasília
A tentativa de ressuscitar a reforma administrativa, que reduz direitos dos servidores, precariza o trabalho do funcionalismo e o serviço público, abrindo espaço até para a sua privatização, segue avançando em surdina na Câmara dos Deputados.
No próximo dia 3, a reforma administrativa será tema de uma audiência pública na Casa, no intuito de levar adiante uma proposta que dá nova roupagem à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32, pautada inicialmente pelo governo Bolsonaro. Entidades que representam os servidores públicos vêm denunciando que a nova proposta é, na verdade, “uma PEC 32 requentada”, e temem retrocessos.
Ainda sem texto definido, a reforma administrativa está sendo debatida em um “Grupo e Trabalho” criado pelo presidente da Câmara Hugo Motta, que tem coordenação e relatoria do deputado Pedro Paulo (PSD-RJ).
Estima-se que os dois textos que devem formar o conjunto da nova PEC devem ser apresentados pelo deputado na próxima semana.
Para o presidente do Fórum das Carreiras de Estado (Fonacate), Rudinei Marques, “deram uma nova roupagem à PEC 32, com o objetivo de angariar apoio popular”.
A entidade destaca que, “assim como a PEC 32/2020, apresentada no governo Bolsonaro, o que vem por aí com a reforma administrativa que está sendo preparada na Câmara de maneira açodada, sem ouvir os principais interessados – os servidores, é a relativização da estabilidade e a precarização dos vínculos de trabalho”.
“Vale registrar que essa não é uma discussão corporativa: trata-se da defesa do serviço público como um patrimônio nacional, que atende diariamente milhões de brasileiros em áreas essenciais como saúde, educação, segurança pública, assistência social, meio ambiente e tantas outras”, afirma Rudinei.
Para o diretor do Sindicato Nacional dos Docentes do Ensino Superior (Andes), Diego Marques, um dos retrocessos mais temidos contidos na nova proposta é a previsão da criação de um cadastro nacional para contratação de funcionários temporários, o que seria um risco para a estabilidade do servidor público.
“Mesmo que não exista um dispositivo dentro da legislação que viole a estabilidade dos servidores públicos que estão na ativa, na prática, a tendência é que amplas áreas de serviço público não tenham mais concurso com estabilidade”, disse.
Para ele, ao disciplinar o contrato temporário em lei, haverá o fim “indireto” da estabilidade ao substituir os servidores concursados por empregados temporários “por meio de uma naturalização, como figura de gestão do Estado dos contratos temporários através desse cadastro”.
Ele critica ainda a falta de diálogo com o funcionalismo público. “Não há diálogo. O deputado ouviu representantes, não apenas do Congresso, mas de entidades patronais para pensar a reforma. Porém, não houve interlocução com as entidades de servidores públicos”.
Referindo-se ao principal argumento dos defensores da reforma, de que ele “vem para cortar privilégios e modernizar o Estado, com foco em mérito e eficiência”, como justifica o deputado Pedro Paulo, o dirigente sindical alerta que essas falas “visam ganhar apoio da sociedade sem fazer o debate de todos os outros fenômenos discutidos na reforma. Hoje, na verdade, menos de 0,23% dos servidores ganham os supersalários que estão concentrados, sobretudo, na magistratura”, afirmou. Como afirma Rudinei, “a média salarial do serviço público, se pegar todo o serviço público, não chega a R$ 5 mil”.
De acordo com o Fórum das Entidades Nacionais dos Servidores Públicos Federais (Fonasefe), diversos princípios da PEC 32 do governo Bolsonaro “sobreviveram no atual grupo de trabalho criado sob a presidência de Hugo Motta”. Entre eles, a proposta de um sistema unificado de avaliação de desempenho que, segundo os sindicalistas, “ignora as peculiaridades de cada autarquia e vai submeter os servidores a critérios produtivistas que precarizam o serviço prestado para a população”.
Diego Marques critica ainda o que diz respeito ao bônus de produtividade, que além de achatar a massa salarial do servidor, pioraria a qualidade do serviço em detrimento de critérios quantitativos de avaliação.
“A maioria absoluta dos servidores ganha menos do que 10 salários mínimos. Converter uma parte da remuneração dos servidores em bônus de resultado, na prática, vai tornar o atendimento à população mais precário. As fiscalizações ambientais, por exemplo, serão mais precárias para atender critérios quantitativos”, disse.
Entidades como a Fonasefe, Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (CondSef) e Fonacate vão realizar uma série de mobilização nas próximas semanas, em Brasília e nos estados, contra a reforma administrativa.