
Foto reforça ligação do esquema a Gleisi
Funcionário conta que virou normal entregas acima de 500 mil reais
Depoimentos de funcionários da empresa Transnacional, uma transportadora de valores, revelaram que a Odebrecht usou os serviços dela para pagar propina à senadora Gleisi Hoffmman, presidente do PT, a Ciro Nogueira, presidente do PP e a José Yunes, amigo de confiança e auxiliar de Temer. Também no Rio de Janeiro, a Trans-Expert, como era conhecida, foi utilizada para o transporte de valores envolvendo os esquemas ligados ao ex-governador Sérgio Cabral (PMDB).
A Odebrecht admitiu, através de depoimentos de seus executivos, que se utilizava do doleiro Álvaro Novis para transferir recursos do ‘departamento de propinas’ para políticos. Novis, por sua vez, confessou também, em acordo com as autoridades, que sua empresa, a Hoya Corretora, realmente se utilizava dos serviços da transportadora Transnacional. Ele apresentou à Justiça uma planilha com R$ 260 milhões distribuídos de propina.
Segundo a acusação da Procuradoria Geral da República (PGR), “ao ser identificada a empresa Transnacional, a investigação evoluiu para identificar o responsável, em nome dela, por levar dinheiro da Odebrecht para a Sotaque”.
GERALDO
Em depoimento, no âmbito das investigações, Rogério Martins, da Hoya, “apontou pessoa chamada Oliveira [Geraldo Pereira Oliveira] como contato na Transnacional”. “Com relação ao endereço da rua Gomes de Carvalho, 921, Vila Olímpia, São Paulo/SP, sede da Sotaque, empresa de marketing de Gleisi, o funcionário da Transncional, Geraldo Pereira confirmou em seu depoimento que esteve em tal endereço mais de uma vez em 2014”.
Geraldo Pereira Oliveira foi funcionário da Transnacional entre 2012 e 2015. Ele compareceu à Polícia Federal pelo menos duas vezes – uma para contar sobre o dia em que bateu à porta de um assessor do presidente do PP, Ciro Nogueira para entregar dinheiro, e outra quando deixou seu nome registrado na portaria do prédio onde trabalha o marqueteiro da presidente do PT, Gleisi Hoffmann.
O motorista narra como funcionava o esquema e confirma o que era mencionado também por colaboradores da Odebrecht: a entrega de dinheiro mediante apresentação de senha pelos destinatários. Segundo o ex-funcionário da Transnacional, ‘excepcionalmente, quando algum recebedor solicitava a verificação, era aberto o pacote e contavam as ‘cabeças’ – nome dado a ‘pacotes de 100 cédulas de um mesmo valor’. Geraldo Pereira ainda disse que, inicialmente, o limite de entregas era de R$ 250 mil, mas, em 2014, o montante foi ‘flexibilizado’ e começou a ser ‘frequente’ o transporte acima de R$ 500 mil. Oliveira disse que eles usavam carros descaracterizados para fazer as entregas e que eram orientados a destruir as senhas após a entrega.
Para azar da presidente do PT, a fotografia de Geraldo Pereira Oliveira, o entregador de dinheiro, foi encontrada nos registros de entrada e saída do prédio onde fica a empresa dos marqueteiros de sua campanha. Para complicar ainda mais sua situação, a polícia detectou 13 ligações da senadora para o executivo da Odebrecht, Benedicto Júnior, o ‘BJ’. Além disso, o seu chefe de gabinete, Leones Dall’Agnol, outro denunciado, também fez outras quatro ligações e enviou mensagens de texto ao celular do executivo.
A peça acusatória destaca que a “investigação feita pela autoridade policial coligiu muitos documentos, apreendidos por ordem judicial de busca e apreensão (como planilhas, e-mails), inclusive mediante quebra de sigilo telefônico, requeridas pelo Ministério Público Federal”. Paralelamente aos contatos, a denúncia destaca que o departamento de propinas da Odebrecht providenciava os pagamentos via doleiros. Dados do Drousys, sistema de contabilidade das vantagens indevidas da empreiteira, dão conta de datas dos repasses a endereços de marqueteiros de campanha de Gleisi.
“A Polícia Federal diligenciou junto aos registros de entradas e saídas de visitantes com destino à Sotaque, empresa que prestou serviços à campanha de Gleisi, nos meses de outubro e novembro de 2014. Foi organizada a planilha (anexada nos autos) e nela constam três entradas de Geraldo Pereira Oliveira, da empresa “TRANS”: dias 23/10/2014, 31/10/2014 e 07/10/2014”, diz a denúncia da PGR.
Gleisi foi denunciada na segunda-feira, 30, por recebimento de vantagens indevidas de R$ 5 milhões nas eleições de 2014. Ciro Nogueira é investigado por propinas de R$ 1,6 milhão nos pleitos de 2010 e 2014. Ambos receberam o dinheiro do departamento de propina da Odebrecht. Dos R$ 5 milhões recebidos por Gelisi, R$ 3 milhões foram declarados à Justiça Eleitoral, mas os próprios marqueteiros de campanha da petista contaram à PF que receberam apenas R$ 1,1 milhão desse valor e que, chegaram a receber R$ 170 mil em uma promessa feita a eles de que o restante seria parcelado.
Em outro depoimento à Polícia Federal em fevereiro, o ex-funcionário da Transnacional reconheceu, por meio de fotografia apresentada a ele, Lourival Ferreira Nery Júnior, assessor de Ciro Nogueira. Também disse se lembrar do edifício La Defense, na Rua Ministro Godói, no bairro de Perdizes, São Paulo, em que Lourival morava. Geraldo contou que sempre era autorizado a entrar pelo portão da garagem, seguir pelo elevador de serviço e entrar no apartamento do assessor. Somente uma vez teria ido ao endereço e foi recepcionado pelo pai de Lourival. Ele revela ter feito pelo menos três entregas naquele endereço.
Geraldo Pereira também prestou depoimento no âmbito de inquérito que embasou denúncia contra o ex-presidente Lula, os ex-ministros Paulo Bernardo, Antônio Palocci e a presidente do PT, Gleisi Hoffmann. Eles são denunciados por receberem US$ 40 milhões em propinas da Odebrecht.
ABEL
Um outro funcionário da Transnacional, o policial Abel de Queiroz, em depoimento feito em 28 de março à Polícia Federal, informou ter ido ao menos duas vezes ao escritório do advogado José Yunes, amigo próximo de Temer, em São Paulo, para fazer entregas de dinheiro entre 2013 e 2015. O inquérito sobre repasses da Odebrecht ao MDB investiga se o dinheiro era contrapartida ao atendimento dos interesses da empreiteira pela Secretaria da Aviação Civil – pasta ocupada por Eliseu Padilha e Moreira Franco entre 2013 e 2015. Os dois, além de Temer, são investigados.
Abel de Queiroz falou como testemunha no inquérito que apura pagamentos, pela empreiteira, de R$ 10 milhões a campanhas do PMDB, acertados num jantar com a presença de Temer no Palácio do Jaburu, em 2014. Ele foi levado até o escritório de José Yunes, no bairro Jardim Europa, em São Paulo, e reconheceu o local como sendo o lugar onde ele entregou a propina.
No caso do endereço de Yunes, Abel esteve “em pelo menos duas oportunidades”, conforme o depoimento. Dois colegas teriam feito a entrega do dinheiro. “Não lembra se as pessoas indicadas para receber o dinheiro eram ‘Yunes’ e ‘Shirlei’, pois era o encarregado que tinha mais contato com esses dados”, registra o depoimento.
O depoimento corrobora acusação apresentada em 21 de março pelo MPF (Ministério Público Federal) contra Yunes e outros aliados de Temer, segundo a qual o advogado atuou mais de uma vez como arrecadador de recursos ilícitos para Temer. A denúncia foi aceita pela Justiça Federal em Brasília, que abriu ação penal contra o advogado por organização criminosa.
SÉRGIO CRUZ
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