A imediata concordância do presidente Donald Trump, após ser informado em Washington, pelos altos assessores sul-coreanos que foram a Pyongyang, da disposição do líder da Coreia Popular, Kim Jong Un, por uma reunião face a face em maio para discutir a desnuclearização da península coreana, pegou de surpresa até mesmo o Departamento de Estado e pôs em polvorosa os círculos mais belicistas dos EUA, que não escondem sua torcida pelo fracasso.
Sobre os preparativos para a reunião, o New York Times a classificou “de tão arriscada e aparentemente exagerada” que alguns dos assessores de Mr. Trump acreditam que “nunca acontecerá”. Em suma, o segundo ouro olímpico da diplomacia de Kim Jong Un pegou essa gente de surpresa. Ao que parece, eles acreditaram nas próprias caricaturas do líder do norte que propagam.
Em abril, haverá uma cúpula intercoreana entre Kim – que em seu discurso do Ano Novo convocou à “reconciliação nacional” – e o presidente do sul, Moon Jae-inn. O chamado ‘ouro na diplomacia’ da Coreia Popular nos Jogos de PyeongChang se deu com a participação do norte na Olimpíada de Inverno e a visita de Kim Yo Jong, irmã do líder, isolando a intransigente postura dos EUA de sanções incapacitantes, intensificação das provocações armadas e chantagem nuclear.
O enviado de Seul a Pyongyang, Chung Eui-yong, conselheiro de segurança nacional do presidente Moon, relatou a Trump na quinta-feira (8) que Kim se dispôs, como manifestação de boa vontade, a suspender os testes de mísseis e nucleares enquanto durarem as conversações, e a relevar as manobras militares previstas para abril.
Segundo o NYT, foi Trump que teve a iniciativa de ouvir Chung, que viera se reunir com seu conselheiro general McMaster, e de pedir a Chung que fizesse, logo após, o anúncio da reunião de maio. No mesmo dia, o secretário de Estado, Rex Tillerson, havia asseverado que os dois países estavam “longe” de negociações diretas. Há notícias de que o chefe do Pentágono, ‘Cachorro Doido’ Mattis, também foi pego de surpresa.
Trump precisou ligar ainda para o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, para tranquilizá-lo. Rússia e China expressaram seu apoio à realização dessa cúpula, como um “passo no caminho certo”. A notícia foi recebida com alívio em Seul.
Segundo Chung, a “desnuclearização” seria possível “com garantias de segurança” a Pyongyang. Pelo Twitter, Trump disse que Kim falara em “desnuclearização” e não apenas “congelamento” e, portanto, havia um espaço novo para negociações. No dia seguinte, tuitou que o encontro “estava bem encaminhado” e que se houvesse acordo “seria bom para o mundo”.
A proposta de Kim jogou ao chão a política ianque em curso para a Coreia, como admite o NYT: “embarcar em uma negociação de alto nível representará um duro desafio para o governo, que construiu sua política para a Coreia do Norte em torno de sanções incapacitantes, apoiadas pela ameaça de ação militar”. Há “pouco planejamento” sobre como uma negociação com o norte se desdobraria, diz o jornal.
Mas “desnuclearização” provavelmente não é entendida da mesma forma em Washington e Pyongyang. A Coreia Popular sempre foi favorável à desnuclearização da península coreana, isto é, retirada total das armas nucleares do norte e também do sul, o que pressupõe o fim da ocupação e das bases dos EUA. Só formou sua força de dissuasão nuclear após ser ameaçada explicitamente de destruição. A pequena força nuclear da Coreia Popular é exatamente para isso: para deter as ameaças nucleares dos EUA, não está dirigida contra o sul, que é parte da mesma nação, embora sob ocupação, nem contra nenhuma outra nação que respeite a soberania coreana.
Se alguém levou Trump a achar que pode negociar com a Coreia Popular e obter sua rendição, ou seja, seu desarmamento nuclear unilateral, sem nada em troca, deveria repensar o assunto. A Coreia antecipou em dez anos a débâcle ianque no Vietnã e não caiu quando o sistema socialista mundial desabou. Quando foi ameaçada de ‘ataque nuclear preventivo’ por W. Bush, depois que este rasgou o acordo que Bill Clinton assinara, a Coreia Popular construiu em tempo recorde sua força de dissuasão nuclear e de mísseis.
Para quem conhece a Coreia, não há nada de “misterioso” ou “recluso” no que quer: o fim da divisão imposta pela ocupação militar americana desde 1945, apesar de ser uma nação milenar, e a reunificação pacífica. Para isso, desde o patriarca da libertação, Kim Il Sung, tem buscado um tratado formal de paz com os EUA, que dê fim à guerra da Coreia, e proposto a reunificação pacífica. Por etapas ponderadas e por meio do aumento da confiança mútua entre as duas partes, a Coreia unificada teria uma estrutura confederal, sob o lema “um Estado, dois sistemas”.
ANTONIO PIMENTA
Depende do ponto de vista, eu já acho que Trump tá conseguindo dobrar seus adversários sem dar um só tiro, só com palavras, no qual faz lembrar Ronald Reagan, que dobrou até a União Soviética na época, sem dar um tiro sequer, só com palavras.