Com o dia final da suspensão provisória do ‘shutdown’ [fechamento do governo federal] chegando – 15 de fevereiro, a próxima sexta-feira – e sem que seja resolvido o impasse nas negociações no Congresso, o presidente Donald Trump voltou ao seu ofício preferido, o Twitter, para ameaçar os norte-americanos com mais uma temporada com servidores sem salário, filas nos órgãos federais operando a meia boca e programas sociais cortados, se os US$ 5,7 bilhões que quer para seu muro da vergonha na fronteira com o México não lhe forem entregues. Na “primeira fase”, foram 35 dias de fechamento, um recorde de todos os tempos.
“Estão oferecendo muito pouco dinheiro para o muro na fronteira desesperadamente necessário”, chiou o “real Donald Trump” – como ele se identifica nas suas tuitadas.
Eles postou ainda não achar que os líderes democratas estivessem permitindo a seus representantes no Comitê de Fronteiras “fecharem um acordo”. E tentou jogar a responsabilidade sobre os democratas, jogo no qual, na vez anterior, foi a presidente da Câmara, Nancy Pelosi, quem se saiu bem. “Com as ofertas terríveis que estão sendo feitas por eles, eu realmente acredito que querem o ‘shutdown’”.
O que, acrescentou, se deveria à necessidade de “mudar o assunto” do público, atualmente focado nos escândalos dos democratas no estado da Virginia, em que o governador, o vice e o procurador-geral foram flagrados ou no “blackface & KKK” ou no #MeToo. Nesta segunda-feira, Trump foi a El Paso, no Texas, na fronteira, para descarregar sua bílis e sua xenofobia e alegrar seus eleitores, no primeiro comício pró-muro do ano.
Integrantes das negociações pelos dois lados não pareciam otimistas. “Acho que as negociações estão paralisadas agora”, disse o senador republicano Richard Shelby no Fox News Sunday. “Não estou confiante de que chegaremos lá”. “Não estamos no ponto em que podemos anunciar um acordo”, concordou o senador democrata John Tester. Os dois integram o chamado comitê interpartidário das fronteiras, que debate uma saída e é composto por 17 parlamentares.
Se não há entendimento sobre o tamanho da verba, outra questão aprofundou o fosso que separa na questão democratas e republicanos. Como forma de atenuar as blitzes da Gestapo da Fronteira de Trump sobre imigrantes ilegais que levam a vida trabalhando, que têm infernizado a vida de muitos deles nos últimos meses, e estimular a que capturem os que são de fato criminosos, e não gente multada no trânsito, os democratas exigiram que o teto máximo de leitos nos cárceres da imigração fosse de 16.500.
Atualmente, os fundos alocados permitem 40.520, que os republicanos queriam ampliar para 52.000. Dois altos assessores republicanos disseram à CNN que o teto exigido pelos democratas forçaria as autoridades da imigração a tomar “decisões impossíveis” sobre quais imigrantes seriam detidos, supostamente forçando a liberação de “criminosos violentos”.
“Esse limite forçará o governo Trump a priorizar a prisão e a deportação de criminosos sérios, não de imigrantes cumpridores da lei”, retrucaram os democratas em comunicado.
Ainda segundo a CNN, o líder da maioria democrata na Câmara, Steny Hoyer, afirmou que o máximo que os democratas estariam preparados para autorizar seria “até US$ 2 bilhões” – o que é considerado muito aquém daquilo que Trump acredita que possa ser brandido como o cumprimento, por ele, da sua principal promessa de campanha eleitoral.
Como se sabe, a proposição da construção do muro foi o artifício encontrado pelos marqueteiros da campanha de Trump para empurrá-lo para a questão que eles achavam essencial para a vitória na eleição: o medo contra os imigrantes.
O muro é uma encenação. O dobro dos que entram, passando pela fronteira do sul, simplesmente chegam pelos aeroportos e portos, com visto de turista, e continuam no país ilegalmente, 600 mil a cada ano.
Mas o muro cumpre exemplarmente o objetivo de buscar um bode expiatório em um país que quebrou em 2008 por causa da especulação e só socorreu os banqueiros, e das décadas de fechamento de fábricas, que deixou tantos ex-colarinhos-azuis no desespero no que já foi o cinturão industrial do Rust Belt.
O impasse foi confirmado ao “Meet the Press”, da NBC, pelo chefe de gabinete interino da Casa Branca, Mick Mulvaney: “Você me fez uma pergunta: o desligamento está totalmente fora da mesa? Eu diria que não”.