
Referências aos abusos e lutas contra a escravidão estão sendo removidos dos parques norte-americanos a mando do governo Trump
“O governo de Trump ordenou a remoção de placas e exposições relacionadas à escravidão em vários parques nacionais dos Estados Unidos, de acordo com quatro pessoas familiarizadas com o assunto, incluindo uma fotografia histórica que mostra as cicatrizes nas costas de um homem que foi escravo”, denuncia o jornalista Jake Spring, em artigo no Washington Post denominado “Sob ordem de Trump, parques podem ter de apagar referências à escravidão”.
No artigo, Jake aponta a grosseira negação dos fatos históricos que busca retirar dos parques conteúdos considerados por Trump de “negativos” ou que “difamem americanos do passado ou do presente”, quando relatam o drama pelo qual passaram seres humanos e a luta titânica do povo para supera-lo.
A decisão de ocultação dos crimes do período da escravidão está no decreto assinado em março, falsamente intitulado de “Restaurando a Verdade e a Sanidade na História Americana”. Assim, por exemplo, Trump ordena a remoção daquilo que chama de “ideologias impróprias, divisivas ou antiamericanas” da Smithsonian Institution, importante espaço de arte e história responsável pela administração de 21 museus.
“Jonathan Zimmerman, professor da Universidade da Pensilvânia que estuda a história da educação, disse que esse é o capítulo mais recente da interferência sem precedentes do governo Trump nas instituições cívicas do país — uma campanha que também inclui a tomada de controle do Kennedy Center e tentativas de pressionar o Smithsonian, maior complexo de museus e centros de pesquisa dos EUA”, relata Jake Spring no seu artigo.
“Separadamente, funcionários do Serviço de Parques ordenaram a remoção de uma fotografia que ilustra a violência contra escravos, conhecida como ‘The Scourged Back’ (costas açoitadas, em tradução livre)”, em um parque nacional. A fotografia, tirada em 1863, mostra cicatrizes nas costas de um homem, causadas por ferimentos infligidos por seus senhores antes dele escapar da escravidão”, aponta.
“A foto circulou amplamente na época, e o público do norte do país ficou chocado com o que ela mostrava, disse Anne Cross, estudiosa de fotografia do século 19 no Museu de Arte do Bowdoin College”, registra.
“Desde então, a foto se tornou famosa, assumindo um significado maior na luta pela libertação dos negros, disse Cross. A revista New Yorker usou a imagem em uma colagem em sua capa para homenagear George Floyd, um mês após sua morte nas mãos da polícia. No mesmo ano, Viola Davis apareceu na capa da Vanity Fair mostrando as costas, com o fotógrafo Dario Calmese reconhecendo que procurou replicar a foto histórica”, frisa.
” ‘Isso não é apenas um punhado de placas que contam a história da escravidão’, disse Ed Stierli, diretor regional sênior da Associação Nacional de Conservação dos Parques. ‘É um lugar que conta a história completa não apenas da escravidão na América, mas do que foi a vida daqueles que foram escravizados por George Washington’”, afirma Spring.
De acordo com o Washington Post e a Associated Press, funcionários do Serviço Nacional de Parques já foram orientados a identificar e alterar sinalizações que relatam episódios da escravidão ou injustiças raciais. Muitas delas podem ser removidas ou modificadas nos próximos meses.
A seguir, a íntegra do artigo de Jake Spring:
Sob ordem de Trump, parques podem ter de apagar referências à escravidão
O governo de Donald Trump ordenou a remoção de placas e exposições relacionadas à escravidão em vários parques nacionais dos Estados Unidos, de acordo com quatro pessoas familiarizadas com o assunto, incluindo uma fotografia histórica de um homem que foi escravizado mostrando suas cicatrizes nas costas.
As pessoas, que falaram sob condição de anonimato porque não estavam autorizadas a falar com a mídia, disseram que as remoções estavam de acordo com o decreto de Trump, de março, que instrui o Departamento do Interior a eliminar informações que refletissem uma “ideologia corrosiva” que menosprezasse americanos históricos.
Funcionários do Serviço Nacional de Parques estão interpretando amplamente essa diretiva para se aplicar a informações sobre racismo, sexismo, escravidão, direitos LGBTQIA+ ou perseguição aos povos indígenas.
Após o decreto de Trump, o Departamento do Interior determinou que os funcionários da agência relatassem qualquer informação, incluindo sinalização e itens de lojas de presentes, que pudesse estar em desacordo com a diretiva. Funcionários de Trump também lançaram uma iniciativa pedindo aos visitantes dos parques que relatassem materiais ofensivos, mas receberam principalmente críticas ao governo e elogios aos parques.
As últimas ordens incluem a remoção de informações no Parque Histórico Nacional Harpers Ferry, na Virgínia Ocidental, segundo duas pessoas familiarizadas com o assunto, onde o abolicionista John Brown liderou uma incursão com o objetivo de armar escravos para uma revolta. Os funcionários também foram informados de que as informações no local da Casa do Presidente, na Filadélfia, onde George Washington mantinha escravos, não estão em conformidade com a política, de acordo com uma terceira pessoa.
Jonathan Zimmerman, professor da Universidade da Pensilvânia que estuda a história da educação, disse que esse é o capítulo mais recente da interferência sem precedentes do governo Trump nas instituições cívicas do país —uma campanha que também inclui a tomada de controle do Kennedy Center e tentativas de pressionar o Smithsonian, maior complexo de museus e centros de pesquisa dos EUA.
“Isso representa um enorme aumento no poder federal e no controle sobre o que aprendemos”, disse Zimmerman. “Trazido a você pela equipe que diz que a educação deve ser estadual e local.”
A porta-voz do Serviço Nacional de Parques, Rachel Pawlitz, disse em um comunicado que todas as placas estão sendo revisadas. “Materiais interpretativos que enfatizam desproporcionalmente aspectos negativos da história dos Estados Unidos ou figuras históricas, sem reconhecer o contexto mais amplo ou o progresso nacional, podem distorcer a compreensão em vez de enriquecê-la”, disse Pawlitz.
Em Harpers Ferry, a equipe sinalizou mais de 30 placas, de acordo com uma pessoa familiarizada com o assunto e documentos analisados pelo Post, que destacam informações potencialmente em violação à política de Trump. Elas incluem placas que se referem à discriminação racial e à hostilidade dos brancos em relação às pessoas que antes eram escravizadas.
Os funcionários do Serviço de Parques marcaram a apresentação como “fora de conformidade”, e agora se espera que a equipe cubra partes das placas ou as remova, disse a pessoa.
Separadamente, funcionários do Serviço de Parques ordenaram a remoção de uma fotografia que ilustra a violência contra escravos, conhecida como “The Scourged Back” (costas açoitadas, em tradução livre), em um parque nacional. A fotografia, tirada em 1863, mostra cicatrizes nas costas de um homem provavelmente chamado Peter Gordon, causadas por ferimentos infligidos por seus senhores antes de ele escapar da escravidão.
A foto circulou amplamente na época, e o público do norte do país ficou chocado com o que ela mostrava, disse Anne Cross, estudiosa de fotografia do século 19 no Museu de Arte do Bowdoin College.
“Os corpos de escravos como Peter Gordon revelaram a eles realidades que nunca tinham visto com seus próprios olhos antes”, disse Cross, “e, em muitos casos, isso alterou suas opiniões políticas sobre a necessidade de derrotar a Confederação e preservar a União”.
Desde então, a foto se tornou famosa, assumindo um significado maior na luta pela libertação dos negros, disse Cross. A revista New Yorker usou a imagem em uma colagem em sua capa para homenagear George Floyd, um mês após sua morte nas mãos da polícia. No mesmo ano, Viola Davis apareceu na capa da Vanity Fair mostrando as costas, com o fotógrafo Dario Calmese reconhecendo que procurou replicar a foto histórica.
No decreto, Trump destacou a “ideologia corrosiva” no Parque Histórico Nacional da Independência, na Filadélfia, onde os fundadores assinaram a Declaração de Independência.
Esse parque inclui o local da Casa do Presidente, onde George Washington serviu como presidente antes da capital ser transferida para Washington. A casa foi demolida no século 19, mas uma exposição foi inaugurada lá em 2010 com base em escavações arqueológicas.
Ativistas locais pressionaram para que a exposição fornecesse informações detalhadas sobre a vida de nove pessoas que foram escravizadas por George Washington enquanto ele morava na casa como presidente. A exposição inclui seus nomes gravados em uma parede de granito.
“Isso não é apenas um punhado de placas que contam a história da escravidão”, disse Ed Stierli, diretor regional sênior da Associação Nacional de Conservação dos Parques. “É um lugar que conta a história completa não apenas da escravidão na América, mas do que foi a vida daqueles que foram escravizados por George Washington.”
Tentar retirar a escravidão da exposição da Casa do Presidente mudaria fundamentalmente a natureza do local, disse Cindy MacLeod, que foi superintendente do Parque Histórico Nacional da Independência por 15 anos até 2023. “Esta é apenas uma das muitas exposições. E, para mim, é uma exposição vital.”