“O voto da FCC para rasgar a neutralidade de rede é um golpe para os consumidores e para todos os que se preocupam com uma internet livre e aberta, afirmou o procurador-geral de Nova Iorque Eric Schneiderman
Tratando de avançar a agenda Robin Hood às avessas do governo Trump, a Comissão Federal de Comunicações dos EUA (FCC, na sigla em inglês) aprovou quinta-feira (14) por 3 votos a 2 anular a chamada neutralidade da rede, que exigia que os provedores de serviços de internet (ISPs) – isto é, as gigantescas operadoras AT&T, Verizon e Comcast – tratassem todos os dados na internet igualmente e que proibia limitar ou bloquear o acesso dos usuários aos sites e serviços.
O que a FCC votou foi que, ao contrário da equiparação com a lei de telefonia criada pelo governo Roosevelt, a banda larga fixa será classificada como “serviço de informação” e a internet móvel, como “serviços de interconexão”. Com a cínica mudança, as teles vão poder faturar muitos bilhões a mais.
Assim, os serviços de internet absurdamente deixaram de ser considerados serviços de utilidade pública – como a telefonia e a eletricidade – e acabou o veto à manipulação da rede pelas operadoras para que dados de determinados serviços corram mais rápido ou passem na frente de pacotes de outros.
O ato deverá gerar enorme indignação nos EUA, com a maioria da população considerando o acesso à internet um direito social básico e indispensável na vida moderna, que deve estar livremente disponível para todos. Manifestantes na porta da FCC em Washington exigiam: “Não me censure”.
A decisão revoga resoluções anteriores da FCC que desde 2005 garantiam esses direitos aos usuários e que desde 2015 estavam formalizados como “neutralidade de rede”, que proibia cobrança diferenciada por tráfego de dados – veloz ou mais lenta – ou censura.
Como denunciou a conselheira Jessica Rosenworcel, que votou contra, “eles terão o direito de discriminar e favorecer o tráfego de internet daquelas companhias com as quais fecharam acordo de pagamento e direcionar todos os outros para uma rota lenta e atribulada”.
Em suma, AT&T, Verizon e Comcast estão liberadas para “bloquear” e “degradar” a distribuição do conteúdo da internet à vontade. Outra conseqüência é que o cartel das operadoras poderá estabelecer uma lista negra de sites progressistas e anti-guerra, na prática bloqueando o acesso a eles para a imensa maioria dos norte-americanos.
Procuradores gerais de 20 estados iniciaram articulação para inquirir judicialmente a decisão da FCC em favor das teles. Entre os estados, estão Massachusetts, Nova Iorque, Havaí, Mississipi, Maine, Vermont e Illinois.
Também será criada uma censura por poder econômico. O fim da neutralidade da rede permitirá que as operadoras aumentem as taxas cobradas, introduzindo vários níveis de serviço, com a maioria dos usuários forçada, por esse mecanismo, a planos restritos e de conteúdo limitado. O tráfego de dados veloz na internet e o intercâmbio aberto e livre de idéias ficará apenas para quem tiver condição de pagar.
A FCC fez de conta não saber o quanto é monopolizado o serviço de internet nos EUA e que sua garantia de que “as leis de mercado” não permitiriam uma lista negra não passa de completa falácia. 50 milhões de americanos contam com apenas um provedor de banda larga para escolher, e a maioria do resto tem apenas dois.
A revogação da “neutralidade de rede” e dos serviços de internet como utilidade pública ocorre em paralelo à campanha da mídia e dos democratas contra a liberdade de expressão na internet, sob alegação de barrar as “fake news” e a “ingerência russa”. A decisão da FCC por assim dizer foi antecipada pelo Facebook, YouTube e Twitter ao contratarem dezenas de milhares de censores para proibir e bloquear conteúdo “ofensivo” e “falso”, enquanto o Google modificou seu algoritmo de busca para bloquear sites progressistas.
Naturalmente, é de se esperar certa oposição das gigantes da internet, como o Google e o Facebook, devido a que podem ser obrigadas a pagar mais pelas velocidades premium. No entanto, podem chegar a algum nível de acomodação, como o acordo de 2010 que a Google trabalhou com a Verizon para privilegiar seu próprio conteúdo (incluído o YouTube).
Setores democratas também se manifestarão em defesa da neutralidade de rede – e dos interesses do Google e do Facebook -, mas foi o então presidente Obama que nomeou para a FCC Ajit Pai, agora chefe da manobra pró-teles. Já o conluio das operadoras com a NSA e a CIA, e apoio de democratas e republicanos, para grampear a comunicação no mundo inteiro seguirá incólume.
Procuradores gerais de 20 estados iniciaram articulação para inquirir judicialmente a decisão da FCC em favor das teles. Entre os estados, estão Massachusetts, Nova Iorque, Havaí, Mississipi, Maine, Vermont e Illinois. “O voto da FCC para rasgar a neutralidade de rede é um golpe para os consumidores e para todos os que se preocupam com uma internet livre e aberta, afirmou o procurador-geral de Nova Iorque, Eric Schneiderman. Assembleias estaduais – como a Califórnia e Washington – poderão por em votação medidas em defesa da internet livre, apesar das ameaças do governo Trump de “ser vigilante na identificação e perseguição” dos estados que tentarem manter a neutralidade de rede.
ANTONIO PIMENTA