
Casa Branca retira o país do órgão de educação, ciência e cultura da ONU sob pretexto de que a entidade “não corresponde aos interesses dos Estados Unidos”
O governo Trump anunciou a retirada dos Estados Unidos da Unesco nesta terça-feira (22), alegando que a continuidade na entidade não corresponde aos interesses do país, e repetindo medida tomada em seu primeiro mandato, em 2018, alegando então “viés anti-Israel” da entidade com sede em Paris, a Unesco foi fundada após a Segunda Guerra Mundial para promover a paz por meio da cooperação internacional nas áreas de educação, ciência e cultura.
A porta-voz do Departamento de Estado, Tammy Bruce, em comunicado, acusou a Unesco de “manter um foco desproporcional nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU” e de promover “causas sociais e culturais polarizadoras”- provavelmente uma referência ao combate ao racismo, xenofobia e desigualdade.
UNESCO SERIA “ANTI-ISRAEL” POR APOIAR CRIAÇÃO DO ESTADO DA PALESTINA
Ela enfatizou, ainda, que a decisão da Unesco “de admitir o ‘Estado da Palestina’ como Estado-membro é altamente problemática, contrária à política dos EUA, e contribuiu para a proliferação da retórica anti-Israel dentro da organização”, segundo a AP.
Bruce asseverou que tal agenda – que chamou de ideológica e globalista – “vai contra nossa política externa America First”. No governo Biden, os EUA haviam retornado à Unesco.
A saída não foi propriamente uma surpresa. “Lamento profundamente a decisão do presidente Donald Trump de, mais uma vez, retirar os Estados Unidos da América da Unesco. (…) Por mais lamentável que seja, esse anúncio já era esperado, e a Unesco se preparou para isso”, disse a diretora-geral, Audrey Azoulay. Segundo ela, a saída dos EUA será efetivada em dezembro de 2026.
Os EUA respondem por cerca de 8% do orçamento total da Unesco, uma queda em relação aos cerca de 20% que financiavam quando Trump retirou o país da agência pela primeira vez.
A atividade mais amplamente conhecida da Unesco é a designação dos Patrimônios Mundiais da Humanidade – atualmente são 1212 -, mas a agência da ONU atua em programas de alfabetização, preservação de línguas, promoção da ciência e tecnologia para o desenvolvimento sustentável e liberdade de imprensa.
Em 1984, em meio à Guerra Fria, quando a Unesco cumpria um papel inestimável na luta contra o racismo e de apoio aos países recém saídos do colonialismo, o então presidente Ronald Reagan retirou os EUA da organização, acusando-a de “viés antiamericano e má gestão financeira”, à qual Washington só retornou quase 20 anos depois, em 2003, sob o presidente George W. Bush.
MARCHA-RÉ E ARROGÂNCIA
Em uma live com o entrevistador Glenn Diesen, o respeitado acadêmico norte-americano e consultor da ONU, Jefffrey Sachs, assinalou que em seu mandato 2.0 Trump tem buscado reagir ao que percebe como o declínio da hegemonia norte-americano e ascensão de um mundo multipolar, retirando os EUA de vários organismos internacionais, acusando-os de “antiamericanos”.
“Os Estados Unidos saíram do Acordo do Clima de Paris. Os Estados Unidos saíram da Organização Mundial da Saúde. Não pagam suas contribuições para as Nações Unidas. Os Estados Unidos disseram: ‘somos contra os objetivos de desenvolvimento sustentável’. Então, quando os BRICS se posicionaram pelo multilateralismo, Trump disse: ‘isso é antiamericano’, porque os Estados Unidos estão se afastando do multilateralismo”, destacou Sachs.
Quando digo Estados Unidos, esclareceu o acadêmico, hoje em dia “quer dizer literalmente Donald Trump, uma pessoa, porque o Congresso não diz uma palavra, é patético. A Suprema Corte está dizendo basicamente que Trump pode fazer o que quiser, e o público americano não tem voz em nada. O público americano apoia as Nações Unidas, como sempre. Uma pesquisa de opinião após a outra tem demonstrado isso há décadas.”
“Ele observou que os países tem governos institucionalizados. Nos EUA, é claro, existe um governo institucionalizado, é o Estado Profundo, é o complexo industrial-militar que realmente comanda o governo dos Estados Unidos. E isso se personaliza com um presidente que não governa por meio de leis ou legislação, mas sim por decretos executivos.”
Trump também suspendeu o financiamento à agência de ajuda aos palestinos, a UNRWA, como parte de seu apoio ao regime genocida de Netanyahu.
Na live, Sachs lembrou a reação do presidente brasileiro, Lula, ao tarifaço de 50%, lembrando que Trump foi eleito para ser presidente dos EUA, não presidente do Planeta.
OS 17 OBJETIVOS SUPOSTAMENTE “ANTIAMERICANOS”
Já quanto aos supostamente “globalistas” e “antiamericanos” objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU denunciados pela porta-voz de Trump, foram aprovados pela Assembleia Geral da ONU em 2015, por unanimidade, por 193 países.
Conhecida também como a Agenda 2030, é constituída por 17 objetivos (e 169 metas), a saber:
1 – Erradicação da Pobreza – Erradicar a pobreza em todas as formas e em todos os lugares;
2 – Fome zero e agricultura sustentável – Erradicar a fome, alcançar a segurança alimentar, melhorar a nutrição e promover a agricultura sustentável;
3 – Saúde e Bem-Estar – Garantir o acesso à saúde de qualidade e promover o bem-estar para todos, em todas as idades;
4 – Educação de qualidade – Garantir o acesso à educação inclusiva, de qualidade e equitativa, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos;
5 – Igualdade de gênero – Alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas;
6 – Água potável e saneamento – Garantir a disponibilidade e a gestão sustentável da água potável e do saneamento para todos;
7 – Energia limpa e acessível – Garantir o acesso a fontes de energia fiáveis, sustentáveis e modernas para todos;
8 – Trabalho decente e crescimento econômico – Promover o crescimento econômico inclusivo e sustentável, o emprego pleno e produtivo e o trabalho digno para todos;
9 – Indústria, inovação e infraestrutura – Construir infraestruturas resilientes, promover a industrialização inclusiva e sustentável e fomentar a inovação;
10 – Redução das desigualdades – Reduzir as desigualdades no interior dos países e entre países;
11 – Cidades e comunidades sustentáveis – Tornar as cidades e comunidades mais inclusivas, seguras, resilientes e sustentáveis;
12 – Consumo e produção responsáveis – Garantir padrões de consumo e de produção sustentáveis;
13 – Ação contra a mudança global do clima – Adotar medidas urgentes para combater as alterações climáticas e os seus impactos;
14 – Vida na água – Conservar e usar de forma sustentável os oceanos, mares e os recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável;
15 – Vida terrestre – Proteger, restaurar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, travar e reverter a degradação dos solos e travar a perda da biodiversidade;
16 – Paz, Justiça e Instituições Eficazes – Promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas a todos os níveis;
17 – Parcerias e meios de implementação – Reforçar os meios de implementação e revitalizar a parceria global para o desenvolvimento sustentável.