Na reunião de delegações russa e ucraniana em Istambul, na Turquia, nesta terça-feira (29) houve uma sinalização de avanços, com o lado ucraniano passando a aceitar a neutralidade – isto é, não expansão da Otan e sem bases militares estrangeiras – enquanto Moscou anunciava uma desescalada no entorno da capital Kiev
No domingo, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky disse pela primeira vez que seu país estava “pronto” para a neutralidade.
Aliás, esse é o status oficial do país – neutro, não alinhado e não-nuclear – desde a formalização do Estatuto de Budapeste.
Status que passou a ser assediado desde 2008, quando o então presidente dos EUA W. Bush, ‘convidou’ a Ucrânia (e a Geórgia) a aderirem à Otan e ao cerco à Rússia – apesar dos compromissos assumidos com Moscou durante a reunificação alemã e do manifesto do presidente Putin de 2007, em Munique, contra a “ordem unipolar” e contra a expansão da Otan até às fronteiras russas.
Depois da vitória do golpe CIA-nazis em Kiev em 2014, durante o governo de Obama, cinicamente o objetivo de W. Bush foi ilegalmente inscrito na constituição ucraniana, já durante o governo Trump.
“MUNDO ESPERA BOAS NOTÍCIAS”
As duas delegações foram recebidas pelo presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, que lhes disse: “O mundo inteiro espera boas notícias”. “As partes têm preocupações legítimas, é possível chegar a uma solução que seja aceitável para a comunidade internacional. A prorrogação do conflito não interessa a ninguém”, afirmou.
Para o negociador russo Vladimir Medinsky, a reunião foi “construtiva” e o lado ucraniano formalizou uma posição “claramente delineada” sobre o que Kiev busca alcançar.
“As conversas que acontecem agora focam em questões importantes. Uma delas são as garantias internacionais de segurança para a Ucrânia e a segunda é o cessar-fogo para que possamos resolver problemas humanitários que se acumularam no país”, disse o conselheiro político de Zelensky, Mykhailo Podolyak.
DESESCALADA PARCIAL
O vice-ministro russo da Defesa, Alexander Fomin, anunciou que “devido ao fato de que as negociações sobre a preparação de um acordo sobre a neutralidade e o status não nuclear da Ucrânia, bem como sobre o fornecimento de garantias de segurança à Ucrânia, estão entrando em prática, a fim de aumentar a confiança mútua e criar as condições necessárias para novas negociações e alcançar o objetivo final de concordar com a assinatura do acordo acima, foi tomada a decisão de, por vezes, reduzir radicalmente atividade militar na direção de Kiev e Chernigov”.
Anteriormente, o Ministério da Defesa russo havia anunciado que, concluída a primeira fase da operação militar especial, iria concentrar os trabalhos em libertar o Donbass. Em Mariupol, as forças russas e do Donbass estão vasculhando tudo à cata de neonazis.
INTENSIFICAÇÃO DAS NEGOCIAÇÕES
As negociações entre as duas partes “continuarão online 24 horas por dia, 7 dias por semana”, acrescentou Podolyak, assinalando que a Ucrânia precisa de “redação legal clara”. “A delegação russa é construtiva e consciente. Isso não significa que as negociações sejam fáceis. São muito difíceis. Mas o lado russo está atento às propostas ucranianas”, concluiu.
Medinsky disse que a Rússia concordou em se encontrar com Kiev “no meio do caminho”, aceitando que uma reunião Putin-Zelensky possa vir a ser realizada se um tratado de paz finalizado e pré-aprovado pelos ministros das Relações Exteriores de ambas as nações for apresentado simultaneamente.
Podolyak disse que o lado russo recebeu o posicionamento por escrito de Kiev e agora irá elaborar suas contrapropostas.
Em razão dos vídeos mostrando neonazistas torturando prisioneiros de guerra russos, Medinsky instou a Ucrânia a “observar estritamente as Convenções de Genebra” e a tomar “medidas exaustivas para excluir essa prática”. Em paralelo, a RT informou que um grupo de torturadores ucranianos foi capturado e será levado aos tribunais.
SEM OPOSIÇÃO AO INGRESSO NA UE
Pela proposta ucraniana, a Rússia não se oporia ao ingresso da Ucrânia na União Europeia e, quanto ao status final do Donbass e da Crimeia, ficaria em suspenso por 15 anos, sem hostilidades militares, e sob conversações bilaterais.
“É fundamental para nós que nada nestas disposições negue a nossa adesão à UE”, afirmou outro membro da delegação ucraniana, David Arakhamia. As garantias de segurança precisam de um tratado internacional, “assinado por todos os garantes de segurança, que será ratificado”, apontou.
Para Podolyak, agora há uma “probabilidade” de que os dois presidentes possam se encontrar. “Temos documentos preparados agora que permitem que os presidentes se reúnam em bases bilaterais”, disse.