
ISO SENDACZ (*)
A quase centenária Ópera dos Três Vinténs, de Bertolt Brecht, traz a personagem Jack Navalha, um veterano ladrão de gado focado então no roubo a bancos. Prestes a mudar de ramo, ele declara solenemente aos seus asseclas:
“Afinal, o que é roubar um banco, perto de fundar um?”
A cena, da idade da própria conceituação de capital financeiro, tem muito a ver com a notícia jornalística do último domingo, veiculada no Estadão:

Muitos enxergam uma melhora excepcional do país no ano que se encerra e creditam o sucesso ao “trabalho honesto” do governo, especialmente da equipe do Ministro da Economia. Afinal, cai a desocupação, as vendas crescem, as contas públicas entram nos eixos e até o custo da dívida pública cai. Mas a realidade, mesmo travestida de boa nova na manchete do Estadão, teima em desdizer a fantasia do desejo de alguns.
Dispensável, por óbvio, dizer que cresceu a informalidade e a pobreza, o efeito do saque do FGTS é efêmero e as contas públicas não estão sendo suficientemente direcionadas às obrigações constitucionais do Estado brasileiro.
Mas vejamos em detalhe o que dizem as pequenas letras do fac-símile acima:
A dívida mobiliária cresceu. Em um mês, foram adicionados ao estoque R$ 85 bilhões, indicando uma majoração em novembro último de R$ 4,115 para R$ 4,200 trilhões. Mas o custo não caiu, cresceu também. Embora a taxa anual do principal componente da carteira tenha diminuído de 6,22% para 6,10%, o montante mensal de juros foi acrescido de R$ 250 milhões!
Entre outras habilidades, os banqueiros em geral e o Ministro em particular sabem fazer contas. De há muito que a queda da taxa Selic – o juro básico – não implica na redução do custo da dívida. Ela só tem crescido, e acima da inflação internacional. Às vezes, penso se a conta não é feita de trás para a frente, considerando primeiro quanto a economia pode separar de si para essa, que é a verdadeira despesa primária. Mas sempre estive seguro que um ato assim é inconsciente por parte da autoridade.
Todos sabem que o capital financeiro não é remunerado só pela taxa de juros, tem também a especulação em torno dos índices os mais diversos e a cobrança pelo serviço de intermediação do capital de terceiros. Mas este ganho, que sai diretamente dos cofres públicos, merece atenção de todos, para que os mais espertos da sala não levem vantagem em tudo sem o consentimento geral da Nação.
(*) Especialista aposentado do Banco Central, diretor do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central, do Instituto Cultural Israelita Brasileiro e membro da direção estadual paulista do Partido Comunista do Brasil. De São Paulo, mora em Santos.