
Pesquisadores do projeto descreveram a política do governo federal à época como um “Necrossistema da pandemia”
O Centro de Estudos Sociedade, Universidade e Ciência (Sou Ciência), da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), em parceria com a Associação de Vítimas e Familiares de Vítimas da Covid-19 (Avico), construiu um acervo com 150 registros do que seriam evidências de condutas criminosas e negacionistas na gestão da pandemia de covid-19 pode ser usado para embasar ações judiciais de familiares de vítimas da Covid-19 em busca de reparação.
O Acervo da Pandemia é uma plataforma digital que contém documentos, vídeos, áudios e reportagens sobre a gestão da pandemia de Covid-19 no Brasil com o objetivo de preservar a memória coletiva e permitir uma análise crítica do período, que durou 17 meses no país e vitimou cerca de 712 mil pessoas.
De acordo com a presidente da Associação de Vítimas e Familiares de Vítimas da Covid-19 (Avico), Rosângela Oliveira Silva, o acervo contém um arcabouço de fatos que demonstram a responsabilidade do Estado Brasileiro no período da pandemia. Além dos 150 registros que compõem a coleção, outros 100 deles encontram-se em fase de análise.
“Além de colaborar com a responsabilização de agentes públicos que negligenciaram a gestão da crise, o acervo pode embasar a construção de políticas públicas de assistência, saúde e previdência, a partir das evidências registradas”, disse Rosângela à Agência Brasil.
Os pesquisadores do projeto descreveram a política estabelecida pelo governo, que comandava o Estado Brasileiro no período, de Necrossistema da pandemia “formado por um conjunto de instituições e agentes que atuam de forma articulada para controlar a vida e a morte da população, estabelecendo e ampliando seu poder sobre corpos, comunidades e a sociedade”, diz página do Acervo.
“Estudos mostram que havia um sistema coordenado e articulado, que atuou para desinformar, manipular e expor desnecessariamente as pessoas ao vírus e ao risco de morte, durante a pandemia de covid-19 no Brasil, buscando aproveitar a grave crise para impor narrativas e condutas negacionistas”, dizem os pesquisadores.
Necrossistema, partindo do prefixo necro tem origem no grego nekros e significa morte, faz um diálogo com o conceito de necropolítica, proposto pelo historiador camaronês Achille Mbembe, trazendo a público um conjunto de registros contendo discursos e condutas negacionistas, disseminados no período de 2020 a 2022, contrários à ciência e à defesa da vida, além de irregularidades, fraudes e desvios de recursos.
Os pesquisadores apontam que “os discursos e as condutas anticiência do governo de Jair Bolsonaro e de sua rede de apoiadores contribuíram para a ocorrência de diversos crimes, inclusive contra a humanidade”.
“O Acervo da Pandemia não é apenas um repositório de documentos. Ele é um testemunho do que ocorreu no Brasil durante um dos períodos mais críticos da nossa história. Seu propósito é servir como fonte para pesquisadores, jornalistas, formuladores de políticas públicas e para qualquer cidadão que queira entender os erros e acertos na gestão da pandemia”, afirma Soraya Smaili, coordenadora do SoU Ciência, professora titular da Escola Paulista de Medicina e ex-reitora da Unifesp, à Agência Brasil.
“Do ponto de vista da pandemia e da reparação, eu creio que permitir essa memória e permitir esse dado histórico faz com que o acervo colabore com as pessoas, inclusive com as autoridades. Se quiserem recorrer ao Acervo, encontrarão ali material fidedigno para poder fazer qualquer trabalho, inclusive na área de política pública”, completou a presidente da Avico.
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