“Não é um acordo de cooperação, é uma venda”, denunciou o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e região sobre a compra da Embraer pela multinacional norte-americana Boeing. Os termos do acordo foram confirmados nesta segunda-feira (17).
Para o sindicato a venda da Embraer para a Boeing fere a lei e representa uma entrega criminosa da soberania nacional. “É crime de lesa-pátria”, alertou o sindicato em nota.
De acordo com o comunicado das empresas, será criada uma joint-venture (uma terceira empresa) para a comercialização de jatos comerciais de pequeno e médio porte – segmento este que a Embraer é líder mundial atualmente.
Nesta nova empresa, a multinacional norte-americana deterá 80% do capital, enquanto os 20% restantes serão da brasileira. Pela participação acionária, a Boeing repassará US$ 4,2 bilhões à Embraer.
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Apesar de manter os 20% de ações, a Embraer não deterá qualquer capacidade de intervenção ou de decisão na nova empresa. E mais, não possuirá nem mesmo diretores dessa joint venture.
As tratativas do contrato deixam claro que não há qualquer possibilidade deste se tratar de um “acordo de cooperação”, mas sim da venda da área de aviação comercial da Embraer, o principal setor da empresa e, por sua vez, o mais lucrativo. Em 2017, a área de aviação comercial da Embraer respondia por 57,6% da receita líquida da companhia, com US$ 10,7 bilhões de um total de US$ 18,7 bilhões, valor portanto, muito inferior ao que será pago pela Boeing para adquirir o setor.
“Todos os termos evidenciam que a operação fere a Lei da Sociedade Anônima (6404/76), a chamada Lei das S/A. Ainda, ao contrário do que está descrito no acordo, não se trata de joint-venture, mas de aquisição”.
“Se ficarmos apenas nos termos jurídicos, a operação não poderia acontecer porque uma empresa de capital aberto (Embraer) não pode se juntar a uma de capital fechado (a Boeing, no Brasil). Mais do que isso: uma joint-venture presume que as duas empresas envolvidas tenham uma parceria comercial e industrial. Não é isto que vai acontecer. A Boeing terá 80% do capital social e 100% do controle operacional e de gestão da nova empresa. A Embraer não terá nem mesmo direito à voto no Conselho de Administração, exceto em alguns temas. Trata-se, portanto, de venda.”, destaca nota dos sindicatos de metalúrgicos de São José dos Campos, Araraquara e Botucatu.
VENDA TOTAL
Os termos divulgados pelas empresas demonstram ainda mais o objetivo da Boeing de, assumir o controle total da Embraer.
De acordo com o contrato, a diretoria da Embraer, poderá a qualquer momento se desfazer dos 20% restantes da participação da joint venture. Desde que esta participação seja vendida exclusivamente para a Boeing.
“Mas é preciso ir além. A Embraer é uma empresa construída por trabalhadores brasileiros e com recursos públicos. Perdê-la seria perder a soberania nacional, seria entregar décadas de conhecimentos em tecnologia de ponta desenvolvida pela terceira maior fabricante de aeronaves do mundo”, ressalta a nota dos sindicatos.
“Está nas mãos do governo federal aprovar ou não a concretização deste crime de lesa-pátria. Em nome dos trabalhadores da Embraer, os sindicatos lutarão para que a venda seja vetada pelo atual ou pelo futuro governo”, afirmam os sindicatos em nota.
SOBERANIA
Defensores da entrega da Embraer para a Boeing alegam que, com a “parceria”, a soberania nacional está garantida, já que, o setor estratégico da empresa, a Embraer Defesa, que produz aviões para as Forças Armadas, ficaria nas mãos dos brasileiros.
O próprio Hamilton Mourão, general da reserva, que foi eleito vice-presidente na chapa de Bolsonaro, disse que o acordo é bem-vindo. “Vai permitir que sejamos mais agressivos neste mercado no plano internacional”, disse o vice eleito, destacando que a parte de defesa da Embraer seguirá com os brasileiros.
Novamente, o contrato entre as empresas já desmonta esta versão.
O principal projeto do setor de defesa da Embraer, o cargueiro KC-390 (que já recebeu investimentos do governo brasileiro de US$ 2 bilhões, além da garantia de compra de 28 aeronaves), também é alvo da múlti Boeing.
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O acordo prevê a criação de uma segunda joint venture para “promover e desenvolver novos mercados para o avião multimissão KC-390”. De acordo com a parceria proposta, a Embraer deterá, inicialmente 51% de participação e a Boeing, os 49% restantes.
“Construímos um projeto de defesa de sucesso e estamos dando isso para o governo norte-americano. O KC-390 foi construído 80% com verba federal e estamos dando 49% disso para o exterior. A soberania nacional está afetada com isso. Os Estados Unidos não dão nada de graça para a gente, por que vamos fazer isso?”, indagou o diretor do Sindicato dos Metalúrgicos e funcionário da Embraer, Hebert Carlos.
“Esse não é um acordo de cooperação, é uma venda. A porcentagem entregue da empresa para a Boeing é muito maior. Tiramos das mãos do Brasil a força intelectual de produção”, denuncia Hebert.
Outro argumento utilizado pelos entreguistas é o de que o governo federal continuará com a posse da chamada “golden share”, que garante o poder de veto, caso a decisão tomada pela empresa vá contra os interesses do país.
Com a venda dos setores estratégicos da Embraer, a chamada “golden share” deixa de ter qualquer validade. As decisões ficarão a cargo da Boeing e restará ao governo brasileiro, bater continência aos norte-americanos.
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