Uma semana após a turnê do Secretário de Estado norte-americano, Rex Tillerson, pela América Latina, durante a qual pressionou por medidas golpistas contra o governo de Nicolás Maduro, quatorze países da região adotaram, dia 13, decisões nesse sentido. Reunido na capital peruana, o Grupo de Lima, declarou que Maduro não será bem-vindo na VIII Cúpula das Américas, que se realizará nos dias 13 e 14 de abril.
O grupo é integrado por Argentina, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Guatemala, Guiana, Honduras, México, Panamá, Paraguai, Peru e Santa Lúcia.
Em entrevista coletiva, a chanceler do Peru, Cayetana Aljovín, desfez o convite a Maduro para o encontro: “O governo do Peru, com o apoio do Grupo de Lima, decidiu que a presença de Maduro na Cúpula das Américas já não será bem-vinda”, disse. Ela justificou a desastrada decisão assinalando que na Venezuela não estava sendo respeitada a institucionalidade democrática.
A possível presença de Maduro na Cúpula das Américas foi um dos temas de sua recente conversa com Tillerson. Ao final, o Grupo, em lugar de optar pelo debate aberto e democrático das opiniões e propostas para resolver a crise que o continente enfrenta, prefere obedecer ao Império.
O governo anfitrião da próxima Cúpula, o de Pedro Pablo Kuczynski, que desqualifica o presidente venezuelano acusando-o de ser um ditador corrupto, há pouco indultou o nefasto Alberto Fujimori (condenado por crimes de lesa-humanidade e roubalheira), em acordo feito para se livrar de comprovadas acusações de corrupção, pelas quais o Congresso caminhava para destituí-lo.
O Editorial #27, que o movimento venezuelano, Marea Socialista, nos fez chegar, trata destas graves questões e, logo na abertura, enfatiza: “O previsível fracasso do “Diálogo” realizado na República Dominicana [entre o governo e a oposição direitista MUD], o adiantamento unilateral das eleições presidenciais para o dia 22 de abril por parte do governo de Maduro e o escritório eleitoral do Executivo, denominado de Conselho Nacional Eleitoral (CNE), e ainda a viagem do ex-diretor da Exxon Mobil, atual Secretário de Estado dos Estados Unidos, Rex Tillerson, pela América Latina, para por em marcha o plano de ingerência mais ambicioso deste século contra um povo da região; tudo isso somado ao colapso hiper-inflacionário que está em desenvolvimento são os pilares sobre os quais se constrói um novo cenário de desenlace à crise integral que vive a Venezuela, e que terá, sem dúvidas, como já o manifesta o extraordinário fenômeno de migração que está se desenvolvendo, um enorme impacto no continente.
O editorial conclui: “A crise na Venezuela devemos resolver de maneira democrática, sem ingerências nem intervenções, e entre venezuelanos”.
Editorial do movimento Marea Socialista
Em seu artigo, do qual trazemos ao leitor os principais trechos, Marea Socialista, alerta que a pressão norte-americana vai no sentido de gestar, através dos governos da região, medidas que levem ao aprofundamento da crise já aberta pelas medidas antipopulares e de caráter abertamente neoliberais do “governo pusilânime” de Maduro.
Assim são “as medidas anti-migratórias (incluído o fechamento parcial de fronteiras e a mobilização de tropas com a cooperação de especialistas norte-americanos no terreno) tomadas pelos governos da Colômbia e do Brasil contra cidadãos venezuelanos que buscam o exílio como saída para a penúria provocada pela crise; a suspensão de exportações da Nicarágua, tradicional sócio da ALBA, a nosso país para não cair nas sanções prometidas pelos Estados Unidos contra todos aqueles que não aderirem a seu plano”.
Há ainda iscas como “os planos de fornecimento de petróleo norte-americano a algumas ilhas do Caribe em substituição do fenecido Petrocaribe, ofertados por Tillerson em sua turnê”.
São elementos que apontam para uma “escalada intervencionista norte-americana que passou das declarações aos fatos”.
Essas medidas regionais, junto com “a prometida progressão de sanções, a exemplo da suspensão da compra de petróleo venezuelano por parte dos Estados Unidos, terão efeitos devastadores sobre nosso povo”, diz Marea.
“Buscam, no mesmo tempo, a capitulação total de um governo pusilânime que tem dado sobradas demonstrações de sua vontade de cumprir com as exigências do capital internacional, tendo como um de seus exemplos emblemáticos a entrega do Arco Mineiro do Orinoco, sem se importar para as conseqüências para o país”.
Um governo que, por essas razões “é repudiado pela maioria absoluta da população”.
O editorial alerta que “o anúncio unilateral da data das eleições presidenciais com a cumplicidade de um CNE manipulado e sem legitimidade aos olhos dos venezuelanos…trata-se de outro passo na busca de consolidação de um regime político autoritário, cada vez mais próximo de um bonapartismo clássico, contra-revolucionário”.
Uma “maquiagem eleitoral” que “se desenvolveu logo depois da instalação da fraudulenta Constituinte”.
Neste quadro, as “eleições para governadores e prefeitos, e agora esta ‘presidencial’, tentam manter uma aparência democrática onde só há repressão, amedrontamento e terror como política de Estado sobre uma população esgotada pela crise econômica e o descalabro social”.
Marea Socialista destaca que para as forças populares a participação nestas eleições só “se justifica como parte do aproveitamento dos escassos e reduzidos espaços democráticos que ainda subsistem, para tentar avançar em um processo de reorganização do movimento social hoje disperso e extremadamente reduzido, tratar de instalar no limitado debate popular a responsabilidade do governo na penúria atual e pôr em discussão um novo projeto nacional contra o da burocracia parasita e da oligarquia tradicional e para dar os passos iniciais na construção de uma nova alternativa política”.
Projeto que também se opõe à “velha oposição política organizada na MUD”, com sua “prática politiqueira” daqueles “velhos políticos mais preocupados com seu destino e vantagem pessoal que com a situação do país e seu povo”.
“A sucessão de graves erros cometidos nas últimas duas décadas por esses dirigentes e partidos se explica pela sua própria natureza, tão entreguista e antipopular como a da burocracia governante na atualidade”, prossegue.
Em um quadro em que o país desliza para “o colapso econômico”, já patente na queda vertiginosa da capacidade de produção de petróleo (de 2,6 milhões para um milhão de barris diários, prognosticada para 2018), na “brutal dinâmica hiper-inflacionária desatada” e o despenhadeiro rumo a um “default desordenado”, a “rejeição contundente às manobras imperiais que, como está demonstrado historicamente, só trarão maior destruição e penúria ao povo e ao país, não pode estar separada da luta contra um regime interior autoritário, entreguista, e que traz fome ao povo”.
Pilares
Ao final de sua análise, Marea Socialista apresenta “os pilares de uma política independente”:
a) rechaçar de maneira contundente a intervenção imperialista em todas suas variantes, incluído o Golpe de Estado; a agressão militar do governo da Colômbia, ou outras.
b) Por de pé um amplo movimento cidadão democrático, soberano e independente das cúpulas políticas atuais, que impulsione a luta direta por recuperar o marco constitucional, a defesa dos direitos humanos elementares e instale um espaço amplo de debate nacional com a participação ativa dos movimentos sociais em direção a um governo provisório.
c) articular um plano de emergência econômica soberano e independente, que dê prioridade à produção, à alimentação, saúde e trabalho dos venezuelanos por cima de qualquer outra prioridade como por exemplo os pagamentos da dívida externa.