“Pô, eu tenho a PF que não me dá informações. Eu não vou esperar foder a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa. Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final!”, disse Bolsonaro
O vídeo da reunião ministerial do dia 22 de abril, liberado pelo ministro Celso de Mello, do STF, traz provas consistentes da intenção – confirmada depois – de Bolsonaro de interferir e controlar a Polícia Federal, particularmente a superintendência da PF no Rio de Janeiro.
“Eu não vou esperar foder a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa. Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra brincadeira”, disse o presidente.
Realmente, nos dias seguintes, ele trocou o “chefe” da PF no Rio, o diretor-geral e o ministro.
PARA MORO, VÍDEO CONFIRMA O QUE DISSE
O ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, comentou em uma rede social a divulgação do vídeo da reunião ministerial. “A verdade foi dita, exposta em vídeo, mensagens, depoimentos e comprovada com fatos posteriores, como a demissão do Diretor Geral da PF e a troca na superintendência do RJ. Quanto a outros temas exibidos no vídeo, cada um pode fazer a sua avaliação”, publicou Moro.
Além de Moro, que já conhecia o teor da reunião, grande parte dos meios políticos e jurídicos do país, e a sociedade como um todo, tiveram acesso a informações que não deixam dúvidas de quais eram as intenções de Bolsonaro. Intenções que a realidade comprovou sobejamente depois da reunião.
Para sustentar sua versão, Bolsonaro continuou atacando os governadores, particularmente o governador do Rio, Wilson Witzel. Na porta do Palácio da Alvorada, o presidente negou que tivesse pedido ao ministro Sérgio Moro interferência ou blindagem em investigações. Segundo o presidente, o pedido foi para evitar que a polícia do Rio fizesse chantagem com a família – um pedido que, segundo Bolsonaro, não foi atendido.
Moro compartilhou um trecho da entrevista. Bolsonaro diz: “O tempo vivendo sob tensão, né, possibilidade de busca e apreensão na casa de filho meu, onde provas seriam plantadas. Levantei, graças a Deus tenho policiais civis e policiais militares no Rio de Janeiro, que tava sendo armado pra cima de mim. ‘Moro, não quero que me blinde, mas você tem a missão de não deixar eu ser chantageado’. Nunca tive sucesso para nada, é obrigação dele me defender. Não é me defender de corrupção, de dinheiro no exterior. Não. É defender o presidente para que ele possa trabalhar, possa ter paz.”
E o próprio Moro respondeu: “Não cabe também ao Ministro da Justiça obstruir investigações da Justiça Estadual, ainda que envolvam supostos crimes dos filhos do Presidente. As únicas buscas da Justiça Estadual que conheço deram-se sobre um filho e um amigo em dezembro de 2019 e não cabia a mim impedir.”
WITZEL REBATE ATAQUES
O governador Witzel, acusado pelo presidente de estar por trás das investigações de sua família, também respondeu pelo Twitter: “A falta de respeito de Bolsonaro pelos poderes atinge a honra de todos. Sinto na pele seu desapreço pela independência dos poderes. E espero que num futuro breve o povo brasileiro entenda que, do que ele me chama, é essencialmente como ele próprio se vê”.
DORIA: O BRASIL ESTÁ ATÔNITO
O governador de São Paulo, João Doria (PSDB) também reagiu ao conteúdo do vídeo “O Brasil está atônito com o nível da reunião ministerial. Palavrões, ofensas e ataques a governadores, prefeitos, parlamentares e ministros do Supremo, demonstram descaso com a democracia, desprezo pela nação e agressões à institucionalidade da Presidência da República”, afirmou o governador.
Apesar de um dos ministros do governo, em depoimento, afirmar que Bolsonaro, ao reclamar da segurança, olhou em direção a Augusto Heleno, as imagens o desmentem. Não só as imagens mostraram que ele olhou para Sérgio Moro, como também as decisões tomadas nos dias seguintes, revelaram que a intenção de Bolsonaro era interferir na PF.
O afastamento de Maurício Valeixo da direção-geral da Polícia Federal, que provocou a demissão de Moro, e a troca da superintendência da PF do Rio de Janeiro, desmentiram a versão de que sua fala se referia ao Gabinete de Segurança Institucional e confirmaram inteiramente as palavras de Moro.
Bolsonaro afirmou que não tinha usado a palavra “Polícia Federal” durante toda a reunião. Mas, ao assistir o vídeo, não há dificuldades em se observar que é da PF que ele está reclamando. Vejam, por exemplo, esse trecho: “E eu tenho o poder e vou interferir em todos os ministérios, sem exceção. Nos bancos eu falo com o Paulo Guedes, se tiver que interferir. Nunca tive problema com ele, zero problema com Paulo Guedes. Agora os demais, vou! Eu não posso ser surpreendido com notícias. Pô, eu tenho a PF que não me dá informações”, afirmou Bolsonaro.
SISTEMA PARTICULAR DE INFORMAÇÃO
No mesmo trecho, Bolsonaro revela que tem um sistema “particular” de informações que funciona e que o sistema oficial desinforma. “O meu particular funciona. Os ofi… que tem oficialmente, desinforma. E voltando ao … ao tema: prefiro não ter informação do que ser desinformado por sistema de informações que eu tenho. Então, pessoal, muitos vão poder sair do Brasil, mas não quero sair e ver a minha a irmã de Eldorado, outra de Cajati, o coitado do meu irmão capitão do Exército de … de … de … lá de Miracatu se foder, porra!”, disse Bolsonaro, ao reclamar que sua família e amigos estariam sofrendo perseguições.
“Como é perseguido o tempo todo. Aí a bosta da Folha de São Paulo, diz que meu irmão foi expulso de um açougue em Registro, que tava comprando carne sem máscara. Comprovou no papel, tava em São Paulo esse dia. O dono do … do restaurante do … do pa … de … do açougue falou que ele não tava lá. E fica por isso mesmo. Eu sei que é problema dele, né? Mas é a putaria o tempo todo pra me atingir, mexendo com a minha família”, acrescentou Bolsonaro.
É nesse contexto que Bolsonaro fala na tentativa não consumada de troca de comando da Polícia Federal no Rio de Janeiro. “Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro, oficialmente, e não consegui! E isso acabou”, diz o presidente. Aí, como foi dito acima, ele diz “não vou esperar foder a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa”, afirmou.
E prosseguiu: “Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra brincadeira”, afirmou. Depois de dizer essas palavras, Bolsonaro inventou que falava da GSI, que é responsável por sua segurança e de sua família e não da Polícia Federal.
SEM PROBLEMAS PARA TROCAR GSI
Mas, como ficou comprovado depois pelo Jornal Nacional, da Rede Globo, ele não teve problemas para mudar o comando da GSI. Trocou o chefe e o sub-chefe do escritório do GSI no Rio de Janeiro. Onde ele teve muitos problemas foi quando tentou trocar, em agosto, o comando da PF do Rio. Tentou e não conseguiu. Era disso que ele estava reclamando na reunião.
Bolsonaro seguiu reclamando de que não recebe as informações que ele precisaria para levar adiante os seus planos. Além de dizer que a PF não o informa de nada, ele deixou claro que não está satisfeito com outros órgãos de espionagem do governo.
“Eu tenho as inteligências das Forças Armadas que não tenho informações. ABIN tem os seus problemas, tenho algumas informações. Só não tenho mais porque tá faltando, realmente, temos problemas, pô! Aparelhamento etc. Mas a gente num pode viver sem informação”, pontuou. Parece que a única coisa que funciona são suas milícias que ele diz que funcionam como uma estrutura paralela de espionagem.
VÍDEO CONFIRMA MORO, DIZ FLÁVIO DINO
Na opinião do governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), o vídeo da reunião ministerial de Bolsonaro, divulgado no fim da tarde desta sexta-feira (22), “é grave”. Ele enumerou os motivos de o classificar assim. Usando sua conta no Twitter, o ex-juiz federal apontou:
“Confirma Sérgio Moro, contém diversos crimes contra a honra, revela planos de “armar a população” para fins POLÍTICOS e mostra inequívocos impulsos despóticos.”
Também pelas redes ele ressaltou que os problemas estão no conteúdo e também na forma.
“A tal reunião ministerial revela um repertório inacreditável de crimes, quebras de decoro e infrações administrativas. Além de uma imensa desmoralização e perda de legitimidade desse tipo de gente no comando da nossa Nação”, escreveu.
ARMAS PARA AS MILÍCIAS
Em outra parte da reunião, Bolsonaro deixa claro que pretende armar sua milícia em todo o país. Provavelmente o controle da Polícia Federal, com alguém íntimo na direção-geral, fazia parte desses planos beligerantes do presidente. Ele cobra do ministro Moro a assinatura do decreto de armas.
“O que esses filha de uma égua quer, ô Weintraub (ministro da Educação), é a nossa liberdade. Olha como é fácil impor uma ditadura no Brasil. Como é fácil. O povo tá dentro de casa. Por isso que eu quero, ministro da Justiça (Sergio Moro) e ministro da Defesa (general Fernando Azevedo), que o povo se arme! Que é a garantia que não vai ter um filho da puta aparecer pra impor uma ditadura aqui!”, disse.
OPOSIÇÃO REPUDIA INTENÇÕES DE BOLSONARO
“A reunião ministerial revela o baixo nível dos integrantes do atual governo. Como bárbaros, jogam a República no caos, desrespeitam as leis, as instituições e ignoram a Constituição”, diz nota assinada por PDT, PSB, PCdoB, PT. Rede e PSOL.
“O vídeo desfaz qualquer legitimidade do atual governo no comando dos destinos da Nação, pois escancara o desprezo à democracia, à vida e às conquistas civilizatórias do povo brasileiro. Ademais, indica a tentativa de formação de milícias em defesa de um projeto antinacional e antidemocrático.
O presidente da República e o general Heleno não percebem que nenhuma autoridade está acima da Constituição e das leis. As manifestações do general, contrárias aos preceitos democráticos, não são novidade e se colocam em sintonia com a postura do presidente da República, que há tempos demonstra seu pouco apreço pela democracia”, diz a nota.
O senador Jaques Wagner (PT-BA) disse que Bolsonaro não está preparado para governar. “O vídeo foi requisitado como prova. E como prova, mostra a tentativa de interferência na Polícia Federal do Rio de Janeiro. E revela, definitivamente, que ele não é uma pessoa preparada para comandar uma equipe, muito menos para governar um país. Fica nítido o constrangimento de vários ministros”, disse o senador.
PSDB: PARECIA REUNIÃO DE GANGUE
“A reunião ministerial do dia 22 de abril ficará marcada como um dos momentos mais baixos e deprimentes da história recente brasileira. Nenhum apego à liturgia do cargo, linguagem chula, ameaças gratuitas. Em alguns momentos parecia mais uma reunião de uma gangue armamentista”.
Para o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, são inaceitáveis os ataques do governo ao STF. “Que palavrório chulo na reunião ministerial! E que reações desencontradas. Que nível do debate: cabem as expressões sobre o STF? Cabe não saber que “diante de vara” é modo tradicional da fala jurídica?Pobre dos cidadãos brasileiros. A escolha foi da maioria. Se repetirá? Duvido”, disse ele.
Eu li toda da transcrição da reunião no site do El Pais e também vi a exibição da reunião. Destaco que assim que o presidente fala “tenho uma PF que não me da informação ” , na sequência ( 3 parágrafo) ele questiona”quem nunca ouviu atrás da porta para se antecipar? Depois que a FILHA engravida é tarde, depois que o FILHO encher os cornos de droga, é tarde”. Penso que esses exemplos sobre filhos, são evidências de que o interesse em ter informação antecipada da PF era sobre OS FILHOS.