“É achar que, como pobre consome pouco, tem que morrer”, rebate o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) a proposta de acabar com a quarentena contra a Covid-19
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, afirmou que “voltar a atividade econômica normal agora é achar que, como pobre consome pouco, tem que morrer”.
“É genocídio, é visão errada da vida. Não dá para colocar tema de saúde pública no varejo da política”, disse o ministro em entrevista ao UOL.
O ministro acredita que a quarentena, que é orientada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), é a “política correta” e que ela foi adotada no prazo limite no Brasil.
“Nós, talvez até antes de outros países, passamos a adotar a política correta, que é o achatamento da curva, impedir com que muitas pessoas contraiam a doença simultaneamente, porque aí você sobrecarrega o sistema de saúde, não vai ter leito para todo mundo, não vai ter respirador para todo mundo. Você vai dar aos profissionais de saúde a horrorosa missão de ter de escolher quem vai viver e quem vai morrer”.
“Se essa doença se espalha pelas comunidades pobres brasileiras com velocidade extrema, nós vamos ter um genocídio. Nós adotamos a política correta”, afirmou.
Questionado sobre a possibilidade de Jair Bolsonaro decretar o fim da quarentena em todo o país, Barroso respondeu que tem “a expectativa de que o presidente ouça a área científica e a área técnica do próprio governo e não expeça um decreto nesse sentido, que contraria todas as diretrizes mundiais”.
“A Itália e a Espanha não tomaram essas providências drásticas no início e sofreram dramáticas consequências. E os Estados Unidos também. E eles têm mais dinheiro do que a gente”, lembrou o ministro.
“Depois que esses países começaram a adotar o isolamento social, a curva já começa a cair”.
Para ele, a crise do coronavírus está mostrando a importância do Sistema Único de Saúde (SUS) para o país. “O bicho vai pegar e nós vamos depender mesmo é do SUS”.
Depois da crise, ele espera que o “SUS receba o foco de luz que ele efetivamente merece e que a saúde pública tenha a expressão que merece ter em um país ainda pobre como é o Brasil”.
PROPAGANDA ANTIQUARENTENA
Barroso impediu, há uma semana, a veiculação de uma propaganda da Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom) contra o isolamento social.
A propaganda usava o slogan “o Brasil não pode parar” e chegou a ser publicada nas redes sociais da Secom e pelo perfil do senador Flávio Bolsonaro, filho de Jair Bolsonaro.
“Preferi me valer de posições científicas muito consolidadas do que de posições políticas sem embasamento nos fatos”, disse Barroso.
“Se nós vivemos um momento em que a OMS, grandes epidemiologistas e as principais instituições médicas brasileiras, pregavam o distanciamento social e o recolhimento domiciliar como grande solução para impedir um genocídio de pessoas pobres no Brasil, eu achei que era meu papel, em nome do direito constitucional à vida, à saúde, intervir”, continuou.
Segundo ele, “nós estamos vivendo um momento de resgate da importância da ciência, de você levar os fatos, com evidências, e não com opiniões, ideologias ou superstições”.
ELEIÇÕES MUNICIPAIS
Barroso, que é hoje vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), assumirá a presidência da Corte a partir de maio e admitiu o adiamento das eleições municipais deste ano, porém sem prorrogação de mandatos.
Ele disse que “ainda não é preciso decidir isso neste momento, mas acho que não podemos fechar os olhos para esta possibilidade, para esse risco”.
Segundo ele, o limite para tomar essa decisão é junho. “Se for necessário, mudar do primeiro domingo de outubro para o primeiro domingo de dezembro”.