Depois de chamar a Proclamação da República de “infâmia” (v. HP 15/11/2019, Weintraub diz que República foi “infâmia contra patriota iluminado”), o ministro da Educação, Abraham Weintraub, resolveu sacar aleivosias contra o seu proclamador, o Marechal Deodoro da Fonseca.
Outra vez pelo Twitter (o pensamento dele, como o de Bolsonaro, não vai além de 280 caracteres), Weintraub escreveu:
“Chegamos ao traidor: tinha a confiança do Imperador, participou do golpe e não teve coragem de falar pessoalmente com Dom Pedro II que ele e sua família seriam exilados. O Brasil foi entregue às famílias oligarcas que, além do poderio econômico, queriam a supremacia política.”
Embaixo, Weintraub colocou a imagem de Deodoro e outra, com a farda de Deodoro, mas com o rosto de Lula (ao lado).
Um oficial-general “que passou pelo Comando Militar do Planalto e pelo Comando Militar do Sudeste”, declarou ao jornal “O Estado de S. Paulo”: “Nunca vi nada igual. Faltam educação e civismo ao ministro da Educação”. “E respeito às Forças Armadas”, completou um coronel.
Entre os militares, Weintraub é chamado de “ministro da falta de educação”.
Trata-se de alguém completamente estúpido, um débil mental.
Que, aliás, ignora quem foi Deodoro da Fonseca, nosso primeiro presidente da República.
Deodoro, um nordestino de família pobre, foi um herói da Guerra do Paraguai, condecorado por bravura nas batalhas de Estero Bellaco, Potrero Obella, Taji, Tuiuti – onde perdeu dois irmãos -, Humaitá, Curupaiti, Angostura, Itororó, onde foi gravemente ferido, Piraju e Peribebuí.
Entrou na guerra como capitão e voltou ao Brasil como coronel, sempre promovido por bravura.
Foi um dos oficiais brasileiros que serviram na Guerra do Paraguai do primeiro até o último combate.
Era, no seu tempo, após a morte de Caxias e Osório, o oficial mais popular do Exército – dentro e fora dele. Daí a sua eleição para primeiro presidente do Clube Militar.
Deodoro estava em conflito aberto com o Império desde 1886, quando servia no Rio Grande do Sul – tendo como veículo do seu descontentamento o jornal republicano “A Federação”, dirigido por Júlio de Castilhos, de quem se tornou grande amigo.
Para sintetizar esse conflito com a monarquia, em artigo publicado no último dia 12, o atual comandante do Exército, general Edson Pujol, escreveu:
A chamada “questão militar” encontra-se entre os fatores que mais contribuíram para a crise que resultou na queda da monarquia. Durante a década de 1880, oficiais opuseram-se publicamente a sucessivos gabinetes imperiais, devido à insatisfação provocada pelas atitudes de desprezo em relação ao Exército, à postura abolicionista de recusa a participar da captura de escravos fugidos e ao sentimento de distanciamento e desvinculação do governo (v. general Edson Pujol, O Exército, a Nação e a República, OESP 12/11/2019).
Demitido de suas funções no Rio Grande do Sul, Deodoro foi recebido, no Rio, a 26 de janeiro de 1887, pelos cadetes da Escola Militar, que tinham por líder o tenente-coronel Benjamim Constant, oficial republicano e positivista.
Depois de um apelo ao imperador de que nada resultou, Deodoro, em manifesto publicado no jornal republicano “O País”, dirigido por Quintino Bocaiúva, advertiu a monarquia para as consequências de sua atitude em relação aos militares.
Abolicionista há muito, Deodoro presidiu a sessão do Clube Militar de 25 de outubro de 1887, em que o Exército resolveu recusar-se a caçar escravos que fugiam das plantações: “não somos capitães do mato”.
A monarquia tentou afastá-lo, nomeando-o para um comando em Mato Grosso. É então que acabam definitivamente as suas esperanças no Império.
É esse homem que um inútil – ou pior, uma bactéria patogênica – como Weintraub insultou e achincalhou.
Com o silêncio completo de Bolsonaro.
Quanto às oligarquias, o idiota não sabe que elas somente chegaram ao poder no terceiro governo republicano, o de Prudente de Moraes.
Abaixo, o artigo do comandante do Exército.
O Exército, a Nação e a República
GENERAL EDSON PUJOL*
Uma instituição à qual a Constituição do País confere status nacional e permanente obriga-se a apreciar sua própria história com a responsabilidade de extrair de cada contexto ensinamentos que contribuam para explicar sua identidade e trajetória e que forneçam indicações para sua caminhada futura. Para esse propósito, torna-se mais relevante analisar os processos que norteiam a evolução dessa instituição, que propriamente os distintos episódios em que esteve envolvida.
No caso do Exército brasileiro, cuja história se confunde com a própria História da Pátria, essa argumentação é ainda mais válida. Se a gênese da Força Terrestre pode ser identificada com o simbolismo patriótico das Batalhas dos Guararapes e se a Independência do País permitiu consubstanciar sua criação formal, foi com o advento da República que o Exército atingiu sua maioridade institucional, assim entendida como a afirmação de seu profissionalismo, requisito indispensável para manter-se à altura da estatura político-estratégica da Nação.
A chamada “questão militar” encontra-se entre os fatores que mais contribuíram para a crise que resultou na queda da monarquia. Durante a década de 1880, oficiais opuseram-se publicamente a sucessivos gabinetes imperiais, devido à insatisfação provocada pelas atitudes de desprezo em relação ao Exército, à postura abolicionista de recusa a participar da captura de escravos fugidos e ao sentimento de distanciamento e desvinculação do governo.
Tal posicionamento refletia a adesão à causa republicana de parcela da oficialidade, em grande parte jovens influenciados pelas ideias positivistas de Augusto Comte, professadas pelo tenente-coronel Benjamin Constant e difundidas em sua cátedra na Escola Militar da Praia Vermelha. Com a criação do Clube Militar, em 1887, sob a liderança do Marechal Deodoro e do próprio Benjamin Constant, fortaleceu-se a participação do Exército na mudança do regime.
Com efeito, a juventude militar não aristocrática formada na Praia Vermelha após a Guerra do Paraguai, adepta da meritocracia e empolgada pelo cientificismo positivista, via na monarquia um anacronismo a retardar a modernização do Brasil e, consequentemente, a profissionalização do Exército, objetivos a serem alcançados por uma sociedade orientada de acordo com o paradigma do “cidadão-soldado”.
Mediante a assimilação de atributos, tais como organização, articulação, planejamento estratégico, doutrina, ensino, instrução, treinamento, serviço militar, política de pessoal e liderança, essenciais ao profissionalismo de uma força armada, o Exército se consolidaria como genuína instituição republicana, síntese da nacionalidade.
Transcorridos 130 anos de experiência republicana, os integrantes do Exército de hoje encontram-se empenhados em um processo de transformação com vistas à obtenção de novas capacidades para o cumprimento de renovadas missões. Mas mantêm o compromisso legado pelas gerações passadas, calcado no culto à liberdade e à democracia e no amor à Pátria, o que confere ao Exército os mais altos índices de credibilidade junto à Nação brasileira.
*COMANDANTE DO EXÉRCITO BRASILEIRO