A Ucrânia de hoje viola todas as disposições de sua própria constituição e “deixou de ser independente e soberana” após o golpe de fevereiro de 2014, quando “passou completamente para o controle externo do Ocidente”, denunciou Viktor Medvedchuk
O ex-líder exilado do maior partido de oposição da Ucrânia, Viktor Medvedchuk, afirmou em entrevista à RT que Vladimir Zelensky “destruiu a Ucrânia e a atirou no ‘fogo da guerra’” e que há “muitas pessoas que discordam do atual regime de Kiev e que representam ‘outra Ucrânia’, não a de Bandera [colaborador nazista da Segunda Guerra Mundial]” e que “nada têm a ver com as declarações e neonazismo do presidente”.
“Conquanto a guerra esteja sendo travada na Ucrânia, esta guerra não é para a Ucrânia, mas para os interesses do Ocidente, dos EUA, do Reino Unido e de muitos outros países, que estão brigando com a Rússia. Eles fizeram da Ucrânia, através do governo de Zelensky, uma espécie de campo de testes ou um posto avançado em seu confronto com a Rússia”, denunciou.
Medvedchuk foi ex-chefe de administração no governo Kuchma (2002-2005) e por quatro vezes eleito deputado; encabeçava o agora banido, assim como outros 11 partidos, Plataforma de Oposição – Pela Vida, que nas eleições na Ucrânia de 2016 conquistou a segunda maior bancada no parlamento, por defender laços mais estreitos com a Rússia e rejeitar a postura pró-Otan do regime de Kiev.
A Ucrânia de hoje viola todas as disposições de sua própria constituição, argumentou Medvedchuk, e “deixou de ser independente e soberana” após o golpe de fevereiro de 2014, quando “passou completamente para o controle externo do Ocidente”.
“Gostaria de relembrar o que muitos esquecem hoje em dia, infelizmente. Sobre o que aconteceu pouco antes de 24 de fevereiro. Eu estava dando muitas entrevistas e falava sobre isso também. Sobre a necessidade de evitar a guerra, de fazer de tudo para evitá-la. Zelensky poderia fazer alguma coisa? Tenho certeza: ele poderia. E além disso, ele tinha que fazer. Ele tinha que seguir os Acordos de Minsk. Você ouviu as revelações de [ex-chanceler alemã] Angela Merkel e de François Hollande [ex-presidente francês François]”.
Quando Zelensky afirma que a Ucrânia está unida, ele omite que essa unidade foi forçada sob a mira de uma arma, afirmou o ex-deputado. “Ele representa a Ucrânia alegando que o povo ucraniano se uniu e se manteve forte em termos de narrativa antirrussa e da russofobia idiota. Isso não é verdade. Para além do ‘anti-Rússia’, há pessoas na Ucrânia que têm medo de falar sobre isso publicamente, mas nunca apoiaram a natureza e o conteúdo da relação entre a Ucrânia e a Rússia que surgiu hoje. Essas pessoas são ucranianas. Tal como eu. Há pessoas que são contra as políticas de Zelensky. Esta outra Ucrânia deve ser ouvida.”
O objetivo do Ocidente é “incitar algum tipo de confronto dentro da Rússia, processos que possam enfraquecer a liderança russa”, que é o que Zelensky está tentando fazer, disse Medvedchuk à RT. No entanto, “é claro que a Ucrânia não pode derrotar a Rússia, devido a circunstâncias factuais bem conhecidas”.
A Ucrânia de hoje viola todas as disposições de sua própria constituição, enfatizou Medvedchuk, e “deixou de ser independente e soberana” após o golpe de fevereiro de 2014, quando “passou completamente para o controle externo do Ocidente”. Não é um Estado social com Estado de direito, como diz a constituição, ele acrescentou. “A mídia está sendo banida sem levar em consideração os procedimentos judiciais ou constitucionais aplicáveis. Aqueles que expressam opinião diferente são eliminados. É um regime sem lei: não há nada além de instruções de Zelensky e seu círculo criminoso”.
A economia está “em frangalhos”, um completo desastre, denuncia Medvedchuk. O PIB ucraniano despencou mais de 30% – em comparação, na crise econômica mundial de 2008-2009 a contração fora de 14%. A produção industrial caiu 70%. O desemprego está em 35%.
NA PRÓPRIA PELE
O próprio Medvedchuk é uma vítima da ditadura de Zelensky. Foi colocado primeiro em prisão domiciliar, depois, levado para uma masmorra da polícia política SBU, onde foi ameaçado e humilhado. Zelensky decretou a cassação da cidadania de Medvedchuk, o que viola a lei e a constituição. Seus bens e os de sua mulher foram confiscados. Em abril, sua foto algemado em uma instalação da SBU tornou-se uma espécie de troféu oficial.
Kiev acusou Medvedchuk de traição e de obter secretamente a cidadania russa. Ele rejeita ambas as alegações como falsas, dizendo que as “acusações falsificadas” estão relacionadas à sua mediação legítima com as regiões do Donbass e Moscou em 2014-15 em nome do governo ucraniano de então. Cerca de 1.500 prisioneiros de guerra ucranianos voltaram para casa como resultado de seus esforços, observou ele.
“Continuo cidadão da Ucrânia”, insistiu Medvedchuk, acrescentando que Zelensky não tinha o direito de revogar seu passaporte, uma medida que ele descartou como “completamente imprudente e eu diria insana”. Se ele quisesse obter um passaporte russo ou se mudar para a Rússia, disse o político, já o teria feito anos atrás. “Mas eu não saí. E eu não me rendi.”
TROCADO EM SETEMBRO
Em setembro de 2022, Medvedchuk acabou incluído em uma lista de troca de presos, foi levado para a Turquia e, dali, para Moscou. A troca foi por dez mercenários estrangeiros capturados pelos russos e não por cativos do batalhão Azov de Mariupol.
“Sou muito grato à liderança da Rússia por essa troca — eles ajudaram a mim e à minha família. Sou grato por não ter passado pelo que poderia ter passado na Ucrânia. Por causa dos processos criminais forjados contra mim entre 2019 e 2020, eu teria sido condenado a 15 anos de prisão — foi o que me disseram e acredito que o teriam feito, mesmo que não houvesse fundamento legal para a acusação”.
Medvedchuk revelou, ainda, que está aglutinando um grupo de ucranianos insatisfeitos com o regime Zelensky e seus asseclas e com os rumos do país, para debaterem alternativas ao que aí está e se contraporem à narrativa ocidental, baseada, fundamentalmente, na russofobia e nos interesses bélicos e geopolíticos dos países do Ocidente.
“Proponho falar sobre o futuro dos ucranianos. Ucranianos que ficaram no país e não concordam com a política de Zelensky. Ucranianos que tiveram que sair pelos motivos que mencionei anteriormente e agora vivem no exterior. Sua perspectiva de desacordo e confronto em questões políticas precisa de representação. Esse time está se expandindo a cada dia e ganhando novos apoiadores”, assegurou.
O ucraniano Viktor Medvedchuk, em entrevista à RT, denuncia a intervenção dos EUA/Otan no seu país e fala dos riscos dessa política para levar a uma guerra mundial (vídeo divulgado pela Agência Sputnik)
Matéria fantástica. Interessante o posicionamento colocado por um ucraniano. Um país dividido.