Os chefes dos executivos de 24 unidades debateram a defesa da democracia depois dos ataques desferidos por Bolsonaro ao Supremo Tribunal Federal (STF). Doria denunciou que o “presidente flerta com o autoritarismo”. Ficaram acertadas reuniões com os três poderes para discutir a crise
O governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), sediou, nesta segunda-feira (23), reunião com 23 governadores de outras unidades da Federação no IX Fórum Nacional de Governadores. Inicialmente a pauta era a reforma tributária e as relações entre governos, mas os chefes dos executivos debateram centralmente a defesa da democracia, depois dos ataques desferidos por Bolsonaro ao Supremo Tribunal Federal (STF).
AMEAÇAS À DEMOCRACIA
O governador de São Paulo, João Doria (PSDB) defendeu, na reunião, a criação de um “Pacto pela Democracia” e afirmou que os gestores não podem “silenciar” diante das “ameaças” constantes contra a democracia feitas por Jair Bolsonaro e seus seguidores. A declaração foi feita três dias após Jair Bolsonaro enviar ao Senado um pedido de impeachment do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.
Doria bateu duro nos ataques do presidente da República à democracia e aos demais poderes. “O presidente flerta com o autoritarismo permanentemente, e muitos de seus ministros endossam isso. Nós, que fomos eleitos, temos obrigação de nos manifestar em favor da liberdade do Supremo”, afirmou Doria, lembrando que os bolsonaristas “estimulam pessoas a ir armadas para as ruas”, afirmou o governador paulista.
“Creiam, isso pode acontecer no seu estado. Aqui nós temos a inteligência da Polícia Civil, que indica claramente o crescimento desse movimento autoritário para criar limitações e restrições, com emparedamento de governadores e prefeitos”, acrescentou Doria. Para ele, o episódio ocorre “num momento gravíssimo da vida nacional”. O governador será um dos signatários de uma carta em defesa da democracia, proposta no fórum por Wellington Dias, governador do Piauí. “O Brasil vive um momento tenso, precisa de um ambiente de diálogo”, disse Dias.
REUNIÕES PARA DISCUTIR MEDIDAS CONTRA A CRISE
Parte dos governadores defendeu que o grupo emitisse a carta ou nota pública rebatendo as ameaças de Bolsonaro. A ideia era a aprovação de uma carta aberta de todos os governadores em defesa do Supremo Tribunal Federal e cobrando uma mudança de postura do chefe do Executivo. Alguns governadores, entre eles o de Santa Cataria, Goiás e Minas Gerais, consideraram melhor que, no lugar da carta, os governadores acertassem reuniões com representantes do Três Poderes para os próximos dias para discutir a crise. Foi decidida, então, consensualmente, a convocação dessas reuniões para os próximos dias dos governadores separadamente com integrantes dos três Poderes.
“Debatemos vários temas. Tratamos da situação em que vive o país, as discórdias que existem e da necessidade de se fortalecer a nossa democracia. Surgiu a proposta e foi decidido, por um consenso, o estabelecimento de uma linha direta de contato com o presidente da República. Uma linha de entendimento com a Câmara dos Deputados e do Senado Federal, e também no STF. Nessas pautas também tratamos a questão da governança climática e sobre o interesse dos Estados”, explicou Ibaneis.
MAIOR CONTROLE DAS POLÍCIAS
Ficou acertado que serão encaminhados os ofícios aos Poderes, para que, nas próximas semanas, os gestores possam reunir-se para conversar sobre a preocupação com o ambiente de instabilidade política pelo qual o país passa. Os governadores trataram também sobre a necessidade de integração entre o poder central, estados e municípios para enfrentamento à pandemia do novo coronavírus, com ações preventivas à variante delta, presente em quase todas as unidades federativas.
Foi discutido ainda a necessidade de maior controle sobre as polícias militares já que há fortes indícios de movimentações de bolsonaristas no sentido de infiltrá-las para aumentar a tensão política no país e favorecer as intenções golpistas de Bolsonaro. Foi relatado pelo governador João Doria o afastamento do coronel Aleksandro Lacerda, comandante de sete batalhões de Polícia Militar do interior paulista, que no fim de semana fez postagens convocando amigos para o ato bolsonarista marcado pelo presidente para o 7 de Setembro.
ESTADOS NÃO ACEITAM PERDAS COM REFORMA TRIBUTÁRIA
Sobre a reforma tributária, os governadores disseram que não vão aceitar perdas de receitas. O governador do Distrito Federal falou sobre esse tema representando a posição do fórum. “Existe uma previsão de perda em torno de R$ 15 bilhões. Isso é inadmissível nesse momento de retomada da economia. Vamos levar ao Senado, além da pauta de harmonia entre os Poderes, as questões que implicam em perdas aos Estados e Municípios”, afirmou Ibaneis. “É uma reforma muito ruim e por conta do Paulo Guedes. Foi ele quem a encaminhou. Essa reforma está muito mal discutida”, concluiu o governador.
O governador de Pernambuco, afirmou que as instituições têm sido agredidas diariamente, o que é preocupante. “Nós vamos olhar a história dos últimos dois anos e tem discussões sobre cloroquina, voto impresso, agora esses ataques frontais ao Supremo Tribunal Federal e a seus membros. Ataques, na verdade, à democracia”, disse Câmara. De acordo com o governador da Bahia, Rui Costa (PT) a postura do presidente Jair Bolsonaro, de ataques ao STF e “àqueles que eventualmente são defensores da democracia”, tem afetado os investimentos estrangeiros na economia brasileira, gerando prejuízo ao país.
O governador Flávio Dino (PSB-MA) afirmou que a preocupação geral dos governadores foi com “as agressões e conflitos em série, que prejudicam a economia e afastam o país da agenda real: investimentos, empregos, vacinas etc”. “A democracia deve prevalecer e as polícias não serão usadas em golpes”, disse ele.
Na semana passada, governadores de 13 estados, incluindo o DF, assinaram uma carta de apoio ao Supremo Tribunal Federal (STF) após o presidente Bolsonaro atacar a instituição. Na última terça-feira (17), o governador Ibaneis Rocha (MDB) comentou sobre a assinatura da carta de apoio e solidariedade ao STF. A nota pública foi direcionada aos ministros e às respectivas famílias, citando constantes ameaças e agressões à Corte.
“Sempre que alguém quiser atingir algum tipo de instituição no país, seja Executivo, Legislativo ou o Judiciário, [o Estado Democrático de Direito] vai ter o meu apoio. Eu sou um democrata e vou continuar defendendo isso com muita força”, disse Ibaneis, que ressaltou a importância de fortalecer as instituições.
O evento dos governadores desta segunda-feira (23) foi transmitido do Salão Nobre, no Palácio do Buriti. Participaram presencialmente da reunião, Ibaneis e o governador do Piauí e presidente do Fórum, Wellington Dias. Os demais chefes do Executivo participaram de forma virtual.