“Oficiais das três Forças, principalmente almirantes, estão morrendo de vergonha”, relata a colunista do Estadão
Em sua coluna no jornal Estadão desta terça-feira (10), a jornalista Eliane Cantanhêde revelou os bastidores do desfile de tanques e caminhões, ocorrido na Esplanada dos Ministérios no mesmo dia em que a Câmara vota, e deve derrotar, a PEC do voto impresso, defendida por Jair Bolsonaro. Apesar de terem sido chamados pelo Planalto, o desfile não contou com a presença de presidentes de outros poderes.
“A ordem para a Marinha desviar seus tanques e lançadores de mísseis para um desfile no centro da capital da República, esta terça-feira, 10, horas antes da votação do voto impresso, partiu do Palácio do Planalto e do Ministério da Defesa – e, ao contrário da versão oficial, foi dada na sexta-feira passada. Foi uma ordem política, com relação de causa e efeito com a iminência da derrota do presidente Jair Bolsonaro no plenário da Câmara” disse Cantanhêde.
A jornalista informa que quem determinou a mudança do roteiro anual do comboio da Marinha foi o presidente e o Ministro da Defesa.
“Militares discutiam também quem entregaria o convite ao presidente e ao ministro. O comandante do Batalhão, um capitão de fragata? Não faz sentido um oficial de patente média se dirigir às maiores autoridades do País. Então, o próprio comandante da Marinha, almirante de esquadra? Ele estaria no comboio? Dentro de um tanque? Com a reação, a entrega virou ‘simbólica’, prosseguiu a jornalista.
Ela destacou que “a Operação Formosa é o maior treinamento da Marinha e ocorre todos os anos, no município com esse nome, em Goiás, desde 1988”. “Nunca antes, Exército e Aeronáutica participaram, muito menos os tanques de guerra, que saem do Rio rumo a Goiás, desfilaram pelo centro político da capital da República. Só agora, nessa tensão institucional?”, indagou.
Não houve como não associar o evento atual ao vexame do pelo general Newton Cruz em 1984. “Em 23 de abril de 1984, dois dias antes da votação das “Diretas-Já” no Congresso, o comandante militar do Planalto, general Newton Cruz, protagonizou um espetáculo grotesco: num cavalo branco, à frente de tanques e soldados, saiu pela Esplanada dos Ministérios chicoteando carros de quem pedia o fim da ditadura militar. Não demonstrou força, não amedrontou ninguém, só fez um papel ridículo. E desmoralizou de vez o governo João Figueiredo”, contou Cantanhêde.
“O pretexto do general Nini foi o aniversário do Comando Militar do Planalto. Hoje, 26 anos depois, o pretexto para botar os tanques na Praça dos Três Poderes, exatamente no dia da votação na Câmara, é o treinamento anual. Ninguém acredita em coincidências, com o presidente manipulando as Forças Armadas e atacando o Supremo, o TSE e as eleições”, afirmou a colunista.
“Oficiais das três Forças, principalmente almirantes, estão morrendo de vergonha”. “Se a intenção é, como naquele 23 de abril de 1984, demonstrar força e amedrontar o Judiciário, o Legislativo e a sociedade civil, vai ser um tiro n’água, um novo ridículo histórico, com um presidente tão absurdo quanto Figueiredo, mas mais ameaçador. O pior, porém, é a submissão das Forças Armadas às pirraças infantis e irresponsáveis de Bolsonaro”, assinalou a jornalista.