Achou que podia desconversar, mas o Brasil quer saber é do preço da gasolina e por que pastores ligados ao Planalto estavam cobrando propinas de prefeitos para liberar verbas do MEC
Pressionado pelos escândalos de corrupção envolvendo o seu governo, Jair Bolsonaro (PL) tenta desviar o assunto e pautar outros temas. Criticou, nesta segunda-feira (11), a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF), a quem acusou de interferir “em tudo”. “Até quando quero nomear uma pessoa para um cargo comissionado aqui eles interferem”, reclamou o chefe do Executivo.
SUSPENÇÃO DE NOMEAÇÕES SUSPEITAS
Ele se referia à suspensão, em abril de 2020, da nomeação de Alexandre Ramagem para a Polícia Federal (PF), após decisão do ministro Alexandre de Moraes. Ramagem era íntimo dos filhos – quase todos investigados – e chefe da segurança de sua campanha. Na época, o ex-ministro Sérgio Moro denunciou que Bolsonaro estava querendo aparelhar a PF para impedir investigações de familiares e amigos.
Diante das denúncias e fatos que vieram à tona na época, entre eles a própria fala de Bolsonaro na famosa reunião ministerial de 22 de abril – que a Justiça obrigou que fosse divulgada -, Alexandre de Moraes impediu que o chefe da segurança da campanha de Bolsonaro e amigo íntimo dos filhos investigados se tornasse diretor-geral da Polícia Federal. É por isso que, até hoje, Bolsonaro reclama dos ministros do STF. Em setembro, tentou até dar um golpe, mas fracassou.
O chefe do Executivo não só buscava aparelhar a PF como abriu uma perseguição feroz a todos os órgãos do governo responsáveis pela repressão à corrupção. A começar pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiro), que havia apresentado um relatório em que Flávio Bolsonaro, filho “02” do capitão cloroquina, tinha desviado R$ 7 milhões da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) entre 2016 e 2018. O crime, segundo o MP-RJ, se dava através de um esquema de lavagem de dinheiro com funcionários fantasmas e com a milícia de Rio das Pedras, Zona Oeste do Rio.
Depois, começou a perseguir os servidores e a direção da Receita Federal pelo fato do órgão ter revelado aos investigadores que Flávio Bolsonaro estaria lavando dinheiro roubado da Alerj através de compra e venda de imóveis e de uma loja de chocolate localizada num Shopping na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio. Se utilizou do chefe da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), por acaso dirigida pelo mesmo Alexandre Ramagem, que ele queria na direção da PF, para pressionar os servidores da Receita que elaboraram a análise das falcatruas do filho.
QUERIA QUE POPULAÇÃO SE INFECTASSE
Além de se queixar das ações de fiscalização e correção de rumos adotadas pelo Supremo Tribunal Federal, muitas vezes acionado pelo Congresso Nacional, Bolsonaro também discorreu sobre a pandemia de Covid-19. Reclamou pela milésima vez que o STF atrapalhou seu trabalho. Na época, o que ele chama de “seu trabalho” se resumia a pura sabotagem à compra de vacinas e ao combate das medidas de proteção da população, contribuindo, assim, em espalhar o vírus pelo pais à fora, através de aglomerações de todo tipo.
Não fosse a ação firme dos parlamentares, dos governadores e dos ministros do STF, a tragédia da pandemia seria ainda maior. Bolsonaro defendia – e defende até hoje – a tese genocida de que toda a população devia se infectar o mais rapidamente possível (Imunidade de rebanho). Combateu de todas as formas a vacinação. Chegou a espalhar fake news dizendo que as vacinas poderiam causar doenças graves e até matar. Ainda hoje, responde na Justiça por ter dito que a vacina da Covid-19 poderia causar Aids.
Defensor do desmatamento, do garimpo ilegal, do genocídio indígena e da destruição do meio ambiente, Bolsonaro também atacou o STF por ele ter impedido um estrago ainda maior neste setor. O Supremo derrubou diversas medidas de Bolsonaro que facilitavam o garimpo ilegal, a invasão de terras indígenas e a destruição das florestas.
“Aqui no Brasil um grande problema que nós temos é uma parte dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Eles estavam julgando, na semana passada, seis ações que mexem com as questões ambientais. Ou seja, eles queriam amarrar o governo federal, nos proibir completamente de investir e buscar melhorias para a região”, disse o chefe do Executivo nacional.
“Melhorias para a região” é a senha de Bolsonaro para a devastação da Amazônia, do Cerrado e de outros biomas do país. Ele quer entregar a Amazônia para mineradoras estrangeiras, de preferência americanas.
TUMULTO NAS ELEIÇÕES
Ele também ataca as Cortes superiores porque essas instituições querem impedir as fraudes e as ameaças que Bolsonaro faz de tumultuar o pleito presidencial deste ano. Fez campanha contra as urnas eletrônicas, tentou voltar à era na contagem manual dos votos, onde são mais fáceis as fraudes. Ameaçou não respeitar o resultado das eleições. Recentemente, chegou a afirmar que não aceitaria que uma só pessoa fizesse a apuração das eleições, numa referência direta ao presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), responsável maior pelas eleições no país.
Em suma, como o país inteiro está esperando explicações sobre os pastores pedindo propina em seu nome no Ministério da Educação, dos ônibus superfaturados que o Tribunal de Contas da União (TCU) teve que embargar, do filho mais novo que ganhou um carrão de luxo de presente por fazer lobby para empresários junto ao Ministério do Desenvolvimento Regional, mas Bolsonaro tenta desconversar e não toca nesses assuntos. Fica tentando emplacar sua agenda de enrolação e ataques indiscriminados.
Isso sem falar nas explicações que ele tem que dar para a disparada incontrolável dos preços dos combustíveis e dos alimentos no país. Ninguém consegue mais encher o tanque dos carros, a passagens de ônibus, trens, metrôs e aviões não param de subir.
O gás de cozinha está sendo vendido a mais de R$ 120 em várias capitais. Em algumas delas chega a R$ 160. As pessoas já não compram mais carne e, agora, já não conseguem nem cozinhar mais. Tudo isso são temas que Bolsonaro tem que falar. Vai ter que se explicar sobre isso tudo. Não vai adiantar mudar de assunto.