Propinas no MEC, compras superfaturadas da Engefort, Covaxin, Orçamento Secreto, orgia na Caixa, tudo isso jogou por terra a conversa fiada de que não havia corrupção no governo. Até o chefe do bando admitiu que os roubos “estão pipocando aqui e ali”
A enxurrada de escândalos de corrupção envolvendo o governo Bolsonaro, que se intensificaram nas últimas semanas, fez o “chefe” da roubalheira mudar sua narrativa fantasiosa de que em seu governo não haveria corrupção. Esta versão estava ficando tão farisaica que ele resolveu admitir aquilo que todo mudo já sabia: que “estão pipocando focos de corrupção dentro do governo”. E haja pipoca!
CORRUPÇÃO ENDÊMICA
“Não temos nenhuma corrupção endêmica no governo”, tentou explicar Bolsonaro. “Tem casos isolados que pipocam e a gente busca solução para isso”, acrescentou ele, em sua nova versão, adotada em evento na Confederação Nacional da Indústria (CNI). A “solução do governo” a que Bolsonaro se refere é um grande esforço para impedir as investigações das denúncias, é perseguir quem denuncia a roubalheira e controlar os órgãos de combate à corrupção, como Coaf e Receita Federal, PGR, PF, etc.
Servidores destes órgãos foram perseguidos, o Coaf foi completamente esvaziado, a PGR foi colocada na mão de um engavetador e Bolsonaro não se cansa de tentar aparelhar a Polícia Federal. Todos os escândalos que vieram à tona até agora mostraram tentáculos dentro do Planalto.
Sobre o escândalo do MEC, Bolsonaro tentou minimizar o roubo, que envolvia até propina em ouro. Disse no domingo (26), em entrevista ao programa 4 por 4, da Jovem Pan, que a cobrança de propina de prefeitos por parte de pastores ligados a ele – e que nem eram servidores do Ministério da Educação – não caracterizou corrupção. Ele considerou “injusta” a prisão preventiva dos criminosos feita pela operação Acesso Pago da Polícia Federal.
Segundo Bolsonaro, o relatório enviado pela CGU (Controladoria-Geral da União), que serviu de base para a abertura do inquérito do PF, foi solicitado pelo próprio ex-ministro para fazer um “pente-fino” dentro do MEC. “Não há indícios mínimos de corrupção”, afirmou. “Não foi corrupção da forma que está acostumado a ver em governos anteriores. Foi de história de fazer tráfico de influência. É comum”, disse Bolsonaro. Mentira. Foi a imprensa que denunciou o esquema. O ex-ministro, como ficou comprovado, dava total guarida aos pastores ladrões.
SUPERFATURAMETO DA ENGEFORT
Mas a roubalheira não parou por aí. O mais novo escândalo de roubo do dinheiro público saiu nesta quinta-feira (30), em denúncia da Folha de S. Paulo, e envolve a empreiteira Engefort. A construtora tem conquistado a maioria das concorrências de pavimentação do governo Bolsonaro em diferentes obras nas quais, segundo a Folha, participou sozinha ou na companhia de uma empresa de fachada registrada em nome do irmão de seus sócios.
A empreiteira fez obras superfaturadas em 87% no Tocantins, 71% na Bahia e 31% em Minas Gerais. Ela não levou em conta os próprios preços mínimos das licitações fixados pela Codevasf, o órgão usado pelos ladrões para desovar as verbas do “orçamento secreto”. As diferenças de valores nas compras indicam que houve irregularidades.
Segundo a Folha, no pregão para pavimentação com blocos de concreto no Tocantins, o preço vencedor da Engefort foi de R$ 144,40 por metro quadrado. Já na licitação similar do Piauí, vencida por outra empresa, o valor foi de R$ 77,34. Os dois Estados fazem divisa, mas a diferença entre os preços foi de 87%.
Já no pregão feito pela 2ª Superintendência da Codevasf na Bahia para asfalto do tipo CBUQ (Concreto Betuminoso Usinado a Quente), a Engefort ganhou com o preço de R$ 110,15 por metro quadrado. Em Sergipe, estado vizinho, uma concorrente levou o contrato oferecendo R$ 64,40. A diferença foi de 71%. Caso o contrato na Bahia tivesse empregado o montante de R$ 64,40, a pavimentação para 448 mil metros quadrados teria custo de cerca de R$ 29 milhões, e não R$ 49 milhões, como efetivamente ocorreu.
CORRUPÇÃO PIPOCANDO
A Engefort recebeu um recorde de verbas no atual governo e, com Bolsonaro, foge de toda a sua tradição ao obter também contratos para asfaltamento longe de sua sede em Imperatriz (MA). Até abril, o governo havia reservado cerca de R$ 620 milhões do Orçamento para pagamentos à empresa – o valor total quitado a ela já somava R$ 84,6 milhões.
Este escândalo atropelou outro que já tinha gerado até um pedido de instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). A CPI, que teve 31 assinaturas, é para investigar o escândalo de corrupção no Ministério da Educação. Ali, dois pastores indicados por Bolsonaro cobravam propina de prefeitos para liberar verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Foi o próprio ex-ministro, demitido após o escândalo, que, gravado numa reunião, admitiu que a força dos pastores ladrões no órgão era um pedido especial de Bolsonaro.
Neste episódio, diversos prefeitos denunciaram a cobrança de propinas por parte dos dois pastores com a anuência do ministro. De acordo com o prefeito de Luís Domingues (MA), Gilberto Braga, em 7 de abril do ano passado, ele foi a Brasília para participar de reunião no MEC. O objetivo do encontro seria discutir obras inacabadas vinculadas à pasta. Após a reunião, disse Braga, o pastor Arilton Moura convidou os prefeitos para almoço.
PREFEITOS DENUNCIARAM PROPINAS
“Até então, eu não conhecia o ministro da Educação. O pastor estava, sim, sentado à mesa na hora da palestra no MEC e, em seguida, nós fomos para esse almoço. E, lá nesse almoço, que não estava o ministro, só estavam os dois pastores, tinha uma faixa de uns 20 a 30 prefeitos. E a conversa era muito bem aberta. Ele virou para mim e disse: ‘Cadê suas demandas?’”, disse. E seguiu: “E ele falou rapidamente: ‘Você vai me arrumar os R$ 15 mil para eu protocolar as demandas e depois que o recurso tiver empenhado, depois, como a sua região é de mineração, vai me trazer 1 quilo de ouro’. Eu não disse nem que sim nem que não, me afastei da mesa e fui almoçar”, acrescentou Gilberto Braga. (Leia aqui)
O prefeito de Boa Esperança do Sul (SP), José Manoel de Souza, durante uma audiência pública no Ceará, reiterou que o pastor Arilton Moura pediu R$ 40 mil de propina, também para conseguir a liberação de recursos no MEC.
“O Arilton perguntou: ‘você sabe muito bem como funciona, né? O Brasil é muito grande, não dá para ajudar todos os municípios. Mas eu consigo te ajudar com uma escola profissionalizante. Eu faço um ofício agora, chamo a Nely, você assina um ofício, coloco no sistema e, em contrapartida, você deposita R$ 40 mil na conta da igreja evangélica’”, relatou o prefeito na audiência pública.
O mar de lama de corrupção no governo Bolsonaro já vem desde os primeiros dias de sua administração. Aliás, as rachadinhas dele de seus filhos já vinham de muito antes. Para ser preciso, desde a década de 80 do século passado, quando eles entraram para a política. Mas, esses roubos ainda eram pequenos comparados com o que eles estão fazendo agora. É só ver o exemplo da compra da vacina indiana Covaxin. Não fosse a coragem do servidor Luiz Ricardo Miranda, que denunciou ao MP e à CPI da Pandemia o esquema criminoso de propina montado no MS, de um dólar por cada dose comprada, e os cofres públicos seriam sangrados em bilhões de reais.
INTERFERÊNCIA NAS INVESTIGAÇÕES
Também não estão computadas aqui as roubalheiras e os prejuízos causados ao país com as vendas escandalosas do patrimônio público, como as subsidiárias da Petrobrás e da Eletrobrás. As negociatas sombrias e os preços subfaturados em troca de propinas lesaram o país em bilhões de reais. Ou o criminoso “orçamento secreto”, a maior corrupção já inventada na história do Brasil. Criada por auxiliares de Bolsonaro, ele permite que o Palácio use cerca de R$ 16 bilhões em chantagens e compras de votos, sem prestar contas a ninguém.
Como se vê, a corrupção endêmica aumentou muito no governo Bolsonaro. O que se reduziu foram a fiscalização, a investigação e a punição dos responsáveis. Isto foi conseguido graças às ameaças, as perseguições, ao desmonte dos órgãos de fiscalização e ao aparelhamento da PGR, da CGU e de alguns tribunais. Bem que Bolsonaro tentou aparelhar a Polícia Federal, mas esta resiste heroicamente às suas investidas. Este foi o caso, por exemplo, do delegado Bruno Calandrini, responsável pelo inquérito do MEC e que mandou prender o ex-ministro e seus comparsas. Ele denunciou a interferência de Bolsonaro no inquérito.
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