O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), criticou, no sábado, em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”, a decisão de Jair Bolsonaro de reeditar medida provisória que foi rejeitada pelo Parlamento, sobre a responsabilidade pela demarcação de terras indígenas no Brasil. O Congresso Nacional decidira que esta responsabilidade era da Fundação Nacional do Índio (Funai) – e Bolsonaro queria que fosse do Ministério da Agricultura.
“No momento em que o presidente da República, qualquer que ele seja, descumpre essa regra, transgride o princípio da separação de Poderes, ele minimiza perigosamente a importância que é fundamental da Constituição da República e degrada a autoridade do Parlamento brasileiro”, afirmou o decano do STF.
“No momento em que se transgride a autoridade da Constituição da República, vulnera-se a própria legitimidade do estado democrático de direito”, acrescentou.
As afirmações do ministro foram feitas depois que o STF derrubou a decisão do governo sobre a demarcação das terras indígenas e obrigou Bolsonaro a recuar da medida, inicialmente tentando culpar assessores, mas, depois, sendo obrigado a admitir que a responsabilidade pela tentativa de atropelo do Congresso Nacional, com a reedição da MP, era dele mesmo.
Celso de Mello ressaltou que “o regime democrático, muitas vezes, se expõe a situações de risco, mas eu confio que o regime democrático vai ser preservado em plenitude, ao menos enquanto o Supremo Tribunal Federal julgar com independência, como tem efetivamente julgado”. “A finalidade maior da Constituição é estabelecer um modelo de institucionalidade que deva ser observado e que deva ser respeitado por todos”, prosseguiu o ministro.
“A história do Supremo Tribunal Federal, desde a primeira década republicana, nos tem revelado que tentativas de intimidação não têm efeito algum. O Supremo tem se mantido fiel ao cumprimento de sua alta missão institucional, que consiste na tarefa de ser o guardião da ordem constitucional”, lembrou Celso de Mello.
Diante das últimas derrotas que o Supremo tem imposto ao governo, o órgão passou a ser atacado por milícias digitais incentivadas por bolsonaristas. O decano alertou que o STF não se deixa intimidar.
“Pedidos de impeachment sem causa legítima não podem ter e jamais terão qualquer efeito inibitório sobre o exercício independente pelo Supremo Tribunal Federal de suas funções constitucionais. O direito de o público protestar é legítimo, ninguém neste país pode ser calado. Qualquer cidadão tem, sim, o direito de protestar. É o direito legítimo. Agora, intimidações, não são”, observou.