
“Estamos diante de um embate ideológico”, disse o presidente do Sinpeem, ressaltando que esta é “uma ação articulada da direita conservadora”
Cláudio Fonseca, presidente do Sinpeem (Sindicato dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal de São Paulo), declarou durante a Plenária da Coeduc (Coordenação das Entidades Sindicais Específicas da Educação Municipal de São Paulo), formada pelo Sedin, Sinpeem e Sinesp, realizada nesta terça-feira (27), que o afastamento de 25 diretores de escolas municipais pela gestão Ricardo Nunes (MDB) é parte de uma articulação ideológica mais ampla. Segundo ele, “não é uma ação somente do governo Municipal – o que seria por si só suficiente para fazer a que estamos fazendo”.
Para Cláudio, a decisão de afastar os gestores escolares sob o pretexto de mau desempenho no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) é, na verdade, uma política coordenada entre a gestão municipal e o governo estadual. “O Governo do Estado anunciou a mesma medida para a rede estadual: o afastamento de diretores para supostamente fazer curso de atualização, de formação, para poder responder àquilo que eles entenderam que é o ‘fracasso’ escolar quanto aos indicadores de aprendizagem dos alunos”, afirmou.
Ele denuncia que essa ação representa um ataque direto à escola pública e à gestão democrática: “É articulado, é política da direita conservadora, dos bolsonaristas, no Estado e no Município. Isso não está descasado e merece a resistência, a luta, no tamanho que deve ser feita”. O sindicalista conclui: “Não é uma ação contra o diretor/ à diretora, é uma ação contra à educação pública, contra a gestão pública, contra a escola sob gestão do Estado, contra a gestão democrática da unidade escolar”.

AFASTAMENTO
A medida da Secretaria Municipal de Educação (SME), imposta na última sexta-feira (23), gerou forte reação entre profissionais da educação, sindicatos, acadêmicos, parlamentares e membros da comunidade escolar. Pelo menos três professores já se recusaram a assumir as vagas deixadas pelos gestores removidos. Os afastados serão obrigados a participar de um curso de “requalificação” até o fim do ano letivo, o que vem sendo criticado como uma punição disfarçada de formação.
Os novos diretores seriam indicados pelas Diretorias Regionais de Ensino, mas a resistência entre os profissionais tem crescido. A Faculdade de Educação da USP publicou uma moção de repúdio na segunda-feira (26), criticando a falta de transparência e destacando que muitas das escolas atingidas são reconhecidas por seu trabalho pedagógico de excelência.
“Algumas dessas escolas são premiadas justamente pelo tipo de gestão desenvolvida e o trabalho de seus diretores como de toda a equipe pedagógica é amplamente reconhecido não só por seus territórios, como pela comunidade científica e dentro da rede municipal”, diz o documento.
A moção também denuncia a forma covarde como Nunes vem atuando, destacando a omissão dos nomes dos diretores no Diário Oficial do Município de 22 de maio, que menciona apenas a decisão, sem citar os profissionais afastados — o que, segundo os docentes “é parte do processo de opressão em curso”.
PROTESTOS
As manifestações contrárias à medida vêm se espalhando por diferentes regiões da cidade. Só na segunda-feira (26), protestos ocorreram na EMEF Espaço de Bitita (zona norte), EMEF Ibrahim Nobre (zona oeste) e na EMEF Vinícius de Moraes (zona leste), onde a entrada foi bloqueada por manifestantes em sinal de repúdio.
O deputado estadual Antonio Donato (PT), que esteve presente na manifestação da EMEF Espaço de Bitita, criticou duramente o uso do Ideb como justificativa para os afastamentos. “A gente sabe que o que está em jogo não é o que eles alegam, que é resultado de Ideb porque Ideb é uma mera desculpa”, afirmou. “Ele é usado como instrumento de punição e de responsabilização das escolas pelas mazelas sociais que vão repercutir no resultado das crianças e jovens mais pobres. É disso que se trata”, declarou Donato.

“Nessa escola, metade dos alunos são imigrantes ou refugiados de países em guerra, além daqueles que vivem nas vilas Reencontro, criadas para abrigar famílias em situação de vulnerabilidade”, destacou o vereador Eliseu Gabriel (PSB), que também participou do ato.
“Sou testemunha do emocionante trabalho de ensino e acolhimento realizado com aquelas crianças e jovens! É completamente equivocada e ilegal a decisão da Prefeitura de afastar diretores de escolas concursados”, ressaltou.
O vereador criticou ainda a forma utilizada para afastar os diretores. “A base para isso é uma discutível nota de Português do IDEB, sem levar em conta as condições sociais dos alunos e suas diferentes realidades. Apelo ao Sr. Prefeito para que não leve adiante essa absurda intervenção na escola pública de nossa cidade!”, disse.
Em meio ao cenário de injustiça, ganha força a ideia de que a medida da prefeitura tem como verdadeiro pano de fundo a repressão às escolas que aderiram à greve dos servidores municipais entre abril e maio — e não, como alega a gestão, o desempenho nos índices educacionais.
As deputadas federais Sâmia Bomfim e Luciene Cavalcante (PSOL) e o vereador Hélio Rodrigues (PT) também estiveram na manifestação em apoio ao diretor Cláudio Marques.
Sâmia disse que “o Ricardo Nunes está utilizando o método da ditadura, que é de intervenção nos espaços escolares”. “O [Jair] Bolsonaro tinha feito isso também com os institutos federais, substituindo os diretores escolhidos pela comunidade para botar gente dele. E não é uma coincidência que seja nas escolas que estavam na greve de servidores. Então ele está fazendo uma intervenção política com objetivo de retaliar, mas também de privatizar, o que vai contra o princípio da gestão democrática e vai contra os interesses públicos”, disse a deputada.
Luciene Cavalcante, por sua vez, ressaltou que a gestão municipal está usando uma convocação para afastar os diretores. “É muito violento e criminoso o que o Ricardo Nunes está fazendo com a educação pública aqui da cidade de São Paulo e o Espaço de Bitita. Não tem legalidade para se colocar o interventor aqui dentro. Ele [Ricardo Nunes] só pode afastar depois de um processo administrativo com amplo direito de defesa”, defendeu a deputada.
Em nota, o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo – Campus São Paulo, que fica ao lado do Espaço Bitita, também repudiou o afastamento. “A atuação da escola, profundamente enraizada no território do Canindé/Pari, é referência por seu compromisso pedagógico e pelo papel social que exerce na defesa da comunidade, na promoção de uma educação antirracista, inclusiva, equitativa e emancipadora por meio da defesa e promoção dos direitos humanos”, diz a nota assinada pelo diretor-geral Wellington Pereira, que também esteve no ato.