
Entidades da Educação celebram a retomada, mas alertam que “restaurar o orçamento para 1/12 por mês alivia a crise, mas não resolve o problema”
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu blindar as universidades e institutos federais do corte orçamentário decretado pela área financeira do próprio governo. Nesta terça-feira (27), Lula convocou os reitores das instituições federais de ensino e representantes da União Nacional dos Estudantes para uma reunião no Palácio do Planalto para anunciar a exclusão das universidades do decreto que impõe restrições orçamentárias a diversos setores federais.
O governo também autorizou um repasse extra de R$ 400 milhões para recompor parcialmente o orçamento das instituições de ensino. A decisão, ainda que limitada a uma determinada área, marca um distanciamento do arrocho conduzido pelo Ministério da Fazenda, que pretende realizar um corte de cerca de R$ 31 bilhões no já combalido orçamento federal para, segundo o ministro Fernando Haddad, dar prioridade ao arcabouço fiscal.
“Após muita pressão da UNE, UBES, ANPG e entidades estudantis, o governo federal acaba de anunciar a retirada das universidades e institutos federais do decreto. Esse decreto limitou a execução orçamentária de 2025 para apenas 1/18 avos por mês, o que sufocava e colocava em risco o pleno funcionamento das universidades. Restaurar o orçamento para 1/12 por mês alivia a crise, mas não resolve o problema”, afirmou a presidente da UNE.
Durante a reunião, o Ministro da Educação, Camilo Santana, reconheceu: “O grande problema hoje é o orçamento discricionário. Precisamos resolver esse gargalo”, referindo-se à disparidade orçamentária, ainda mais evidente quando o orçamento é corrigido pelo IPCA.
Ele também citou que o contexto orçamentário tornou-se ainda mais desafiador para as universidades, devido ao aumento do número de matrículas e à crescente demanda por assistência estudantil.
Entre as medidas anunciadas estão:
- Retirada do limite orçamentário mensal de 1/18, que passa a ser de 1/12;
- R$ 400 milhões para compensar os cortes do Congresso na aprovação da LOA (distribuídos entre universidades e institutos federais);
Ainda assim, o cenário segue crítico: o déficit atual das universidades federais gira em torno de R$ 2,5 bilhões. O aporte de R$ 400 milhões representa um avanço, mas ainda está longe de suprir as necessidades operacionais básicas, como pagamento de água, luz, internet e alimentação estudantil — todos cobertos com o chamado orçamento discricionário, que permanece defasado em relação a 2014.
Também presente no encontro, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defendeu a importância das universidades para o desenvolvimento nacional. “A universidade pública tem que ser para todos e com qualidade, o que não se faz sem orçamento. Temos que refletir sobre o papel da universidade na indústria, na inovação e no desenvolvimento do país.”
A Ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, reforçou o compromisso com a valorização da pesquisa. “Ciência e educação andam de mãos dadas.”
O presidente da Andifes, José Daniel Diniz Melo, analisou as medidas apresentadas. “Foi um encontro significativo, sobretudo pela demonstração de abertura para o diálogo, no qual pudemos apresentar assuntos relevantes relacionados às nossas instituições”, disse.
“O governo fez alguns anúncios importantes. O mais urgente foi a retirada do limite mensal de 1/18 do orçamento, que havia sido imposto pelo Decreto nº 12.448. A segunda questão foi a recomposição dos cortes efetuados pelo Congresso Nacional, que, no caso das universidades, representa aproximadamente R$ 250 milhões, agora recompostos”, disse.
“Além disso, houve o anúncio, pelo ministro Camilo Santana, de buscar recursos adicionais, pois, mesmo com a recomposição daquilo que foi cortado, o orçamento ainda não é suficiente para que as instituições possam honrar com seus compromissos neste ano”, destacou.
“O mais importante, entretanto, foi o entendimento comum da necessidade de superarmos essa lógica de negociação orçamentária recorrente, e de que devemos construir, conjuntamente, uma política de financiamento permanente e estável para as universidades federais. Até lá, permaneceremos dialogando com o governo e buscando soluções para essas questões, que são fundamentais para que as nossas universidades possam se manter, cumprindo com a missão de servir ao nosso país”, avaliou.
RECUO É FRUTO DA MOBILIZAÇÃO
O diretor de Ciência e Tecnologia da UNE, Caio Guilherme, destaca que o recuo do governo se deu em consequência da pressão de estudantes e o alerta dos reitores para os riscos de arrocho no orçamento das federais. “Foi uma vitória principalmente do movimento de educação, da União Nacional dos Estudantes, da mobilização dos estudantes para que o governo voltasse atrás com isso”, disse.
“Acho que primeiro a decisão da UNE de convocar uma manifestação rápida, de cobrar o governo rápido, isso teve um efeito muito positivo e a resposta foi essa, o governo voltar atrás de uma medida que era absurda: congelar o orçamento das universidades até o final do ano iria inviabilizar o funcionamento das universidades”, disse em entrevista ao HP.
Caio ressalta que o orçamento das universidades continua insuficiente e que, por isso, a mobilização continua.
“Vamos disputar o governo Lula. Um governo popular, um governo que tenha medidas mais progressistas. É isso que a gente espera dele. Não podemos ter um orçamento para as universidades menor que o patamar de Temer e Bolsonaro antes da pandemia. Isso é um problema e ainda precisamos lutar para que esse governo invista muito mais em Educação”, alertou.
“Apesar de termos uma recomposição de R$ 400 milhões, a gente tem um déficit que ultrapassa R$ 2 bilhões, então a luta continua”, pontuou Caio.
Além da recomposição imediata, o MEC promete encaminhar ao Congresso um projeto de lei que crie um mecanismo estável de financiamento para o ensino superior, semelhante ao Fundeb na educação básica. A ideia é garantir “mais sustentabilidade, mais garantia de planejamento” às instituições, segundo Camilo Santana.