A arma de fogo utilizada pelo adolescente de 14 anos, que matou a estudante cadeirante Geane da Silva de Brito, de 19 anos, na Escola Municipal Eurides Sant’anna, localizada na cidade de Barreiras, no oeste da Bahia, pertence ao seu pai, que é subtenente da reserva do Distrito Federal.
Na delegacia da cidade, o militar disse que ainda não sabe como o filho teve acesso ao revólver, que ficava escondido dentro de casa. O atirador chegou a postar em seu perfil nas redes sociais que estava em busca por munições para realizar o ataque.
O assassino anunciou nas redes sociais, dias antes, detalhes do que estava planejando para o dia da ação, que incluía um massacre aos colegas antes de ser morto em ação. O ataque terminou com o estudante baleado e apreendido pela polícia.
Em seu perfil onde propagava ódio foi suspenso pelo Twitter nesta segunda-feira (26) e o conteúdo, apagado. Na conta que usava, o garoto mostrava o rosto, criticava professores, fazia comentários xenófobos, assumia ter ódio para liberar e ainda demonstrava tristeza pela reação esperada de sua de sua família, uma vez que acreditava estar fadado a ser morto na ação. “Se eu matar pelo menos dois, já vou estar feliz”, escreveu.
O agressor era recém-chegado do Distrito Federal (DF) e não mantinha frequência escolar desde a transferência para a Bahia. Ele foi até a direção de Geane, que estava perto da cantina, e atirou duas vezes contra ela. Depois, partiu para cima da aluna com as facas. Geane morreu ainda no local. Assessor especial da Secretaria Municipal de Educação, Aparecido Freitas diz que o invasor chegou a realizar outros disparos, porém, não chegou a atingir outros estudantes.
Ao tentar fugir, o agressor foi baleado por uma pessoa não identificada, segundo a Polícia Militar. Ele foi socorrido pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e está sob custódia policial em uma unidade de saúde.
O atirador publicou e fixou uma “carta de despedida” na última quinta-feira (22), no texto, ele afirma que não tem problemas mentais e tem tendências homicidas desde pequeno. No último domingo (25) ele postou na rede social dizendo que deu o último abraço no pai.
Após ser baleado, o jovem foi atendido no local pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e levado para o Hospital Geral do Oeste. Não há detalhes sobre o estado de saúde dele.
Com o suspeito, foram achados um revólver calibre 38, duas armas brancas e aparentemente uma bomba caseira. O material apreendido foi apresentado na 11ª Coordenadoria Regional do Interior (Coorpin). A Polícia Civil diz que o atirador está sob custódia policial na unidade de saúde.
Em nota, a prefeitura de Barreiras lamentou a “tragédia inimaginável” que aconteceu na escola, que tem gestão compartilhada com a Polícia Militar. Segundo a Secretaria de Educação da cidade, o agressor era um “indivíduo estranho à comunidade escolar” e chegou pulando o muro e indo na direção da cadeirante.
“A Secretaria de Educação com todo seu corpo técnico e a Polícia Militar acompanham o caso promovendo todo apoio e assistência aos estudantes e seus familiares com toda a responsabilidade que a situação requer, diante de tão inesperada tragédia. Em tempo, solidarizam-se com a família da aluna vitimada, expressando os mais profundos sentimentos neste momento de profunda dor e consternação”, diz a nota.
A PM comunicou que, em relação aos questionamentos referentes à segurança da escola municipal, a unidade apenas adota o sistema de ensino da PM e a corporação dá o “suporte disciplinar”.
Em 2002, um adolescente de 17 anos matou duas colegas com um revólver .38 dentro da sala de aula, no colégio Sigma, em Salvador. Segundo testemunhas, o ato foi uma vingança porque as duas vítimas teriam dado uma nota baixa para o agressor em uma gincana escolar. O revólver usado pelo adolescente era do pai dele, um agente de segurança pública.
ARMAS USADAS EM ATAQUES ESTÃO EM CASA
Um levantamento feito pelo Instituto Sou da Paz, em 2019, mostra que em metade dos ataques dentro escolas, os atiradores usaram armas que estavam guardadas em suas casas. “Em quase metade dos casos o estudante não precisou ir no mercado ilegal para comprar uma arma porque ela estava dentro de sua própria casa”, disse à época Bruno Langeani, gerente do Sou da Paz.
Ainda de acordo com o instituto, o decreto presidencial 9.685, que permite a posse de armas para a população civil pode ter gerado um efeito facilitador. “A flexibilização na compra de armamentos, proposta pelo decreto, tende aumentar a presença de armas nas residências do país, o que pode vir também a aumentar a incidência desses atentados”, completou Langeani.
A quantidade de armas novas registradas na Bahia deu um salto nos últimos quatro anos. Nos três primeiros meses de 2019, foram 400 registros novos de armas de fogo no estado. Neste ano, o número cresceu para 1.363, o que representa um aumento de 240%, segundo dados da Polícia Federal. A escalada se dá em um momento em que o governo federal se mostra favorável ao armamento da população.
Em fevereiro do ano passado, o presidente Jair Bolsonaro assinou quatro decretos que flexibilizaram o uso e a compra de armas de fogo no Brasil. Uma das medidas foi justamente o aumento do número de armas que o cidadão comum pode adquirir, que subiu de quatro para seis. O governo também passou a permitir o porte simultâneo de duas armas.
No perfil, o atirador postava fotos com roupas e máscara preta, vestido do mesmo modo que invadiu a escola. Legendas mostravam que o crime foi planejado há meses. Com frequência o agressor escrevia sobre conseguir munição, além de postar fotos com facas. Ele também usava a rede social para xingar nordestinos, judeus e público LGBTQIAP+.
“Sai da capital do Brasil para o ‘merdeste’ e nunca pensei que aqui fosse tão repugnante. Lésbicas, gays e marginais aos montes, acham que são dignos de me conhecer e conhecer minha santidade. Os farei clamar pela minha misericórdia, sentirão a ira divina”, declarou.
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP) informou que os perfis das redes sociais do autor do ataque serão analisados pelo Departamento de Polícia do Interior (Depin) da Polícia Civil. O acesso que o adolescente teve a arma de fogo está sendo investigado pela 11ª Coordenadoria Regional de Polícia do Interior (Coorpin) de Barreiras.
A Polícia Civil e a Superintendência de Inteligência da SSP analisam se houve participação de mais alguma pessoa no ataque. Além de prestar solidariedade à família de Geane de Brito, o secretário de Segurança Pública, Ricardo Mandarino, criticou o acesso às armas que vem sendo facilitado pelo Governo Federal.
“Estamos importando o que há de pior nos EUA, em matéria de segurança pública. Essa cultura armamentista, que muito tem infelicitado o país irmão, com a alta incidência de homicídios por motivos fúteis. Com mais armas circulando, outros jovens poderão ter acesso”, afirma.