
EVA GOLINGER*
Donald Trump fez mais de 2.000 meninos e meninas reféns nos Estados Unidos. Entre 1º de outubro de 2017 e 31 de maio de 2018, 2.700 crianças foram separadas dos pais e familiares na fronteira dos EUA com o México. Quase todos são migrantes centro-americanos. Isso significa que as autoridades migratórias nos Estados Unidos retiraram, forçosamente, uma média de 45 crianças por dia dos braços dos pais.
Trump disse que impôs esta cruel e desumana medida porque o Congresso lhe negou o financiamento para o muro que quer construir na fronteira com o México para impedir a chegada de mais migrantes latinos. Trump disse inclusive publicamente que se lhe dessem o dinheiro para o muro já não teria que separar os filhos de seus pais. Trump é um sequestrador de crianças. Não há como esconder isso com palavras bonitas.
A política de “tolerância zero” imposta por Trump está causando um trauma psicológico a meninos e meninas que fogem de situações violentas e desesperadas, cruzando milhares de quilômetros em circunstâncias arriscadas em busca de uma vida melhor. E o que encontraram na fronteira da “Trumplândia” é abuso, maltrato e terror muito pior do que deixaram. Porque ao chegar nos EUA perdem até os seus pais, mães e familiares, o único que conheciam em uma terra desconhecida. Os obrigam a deixar seus ursinhos de pelúcia, não podem levar quase nada quando os “sequestram”. Bebês tão pequenos, como de quatro meses, têm sido literalmente arrancados dos braços das mães e postos em “centros de detenção infantis” ou “refúgios para a terna idade”, como são chamados oficialmente pelo governo Trump.
TRÁGICAS HISTÓRIAS
“Vamos levá-lo para lhe dar um banho”, disse na fronteira um agente a uma mãe migrante sobre seu pequeno filho de seis. E não o viu mais. A ela lhe levaram a uma prisão para migrantes sem documentação e a criança foi para outro centro de detenção para menores. A mãe foi deportada ao país de origem, Guatemala, sem seu filho e nem sequer poder se despedir ou dizer que o amava. Sem nem sequer saber onde estava, se estava bem, se estava vivo. Ela não sabia que depois de fugir da violência e da perseguição em seu país, onde acreditava que se ficassem um dia mais seriam mortos; que depois de cruzar por um terreno perigoso onde lhe roubaram todo seu dinheiro e pertences, que ao chegar onde iam buscar refúgio e um lugar seguro para estar com o seu pequeninho; que ali, nesse lugar, era onde a iriam submeter à máxima tortura possível que pode sofrer uma mãe: tirar-lhe um filho. Sequestrá-lo. “Se soubesse nunca haveríamos ido lá”, declara agora, com sua tristeza e desespero no outro lado da fronteira. Quando suplicou aos funcionários da migração que lhe devolvessem o filho, nem sequer responderam. Foi tratada como um animal, sem nenhum direito, sem nenhuma voz. Agora está sem sua criança, seu bebê. Seu coração está rompido, sua vida destruída.

Migrantes jovens e crianças em gaiolas no centro de detenção de McAllen, no Texas
Um pai que fez a perigosíssima viagem por terra desde El Salvador para chegar à fronteira estadunidense com o seu filho em busca de asilo político e de um refúgio frente à extrema violência que haviam sofrido, não pôde aguentar quando as autoridades dos EUA levaram seu menino. Se suicidou no centro de detenção onde o tinham encarcerado, sem haver podido falar ou saber de seu filho.
São histórias tristes e trágicas que mexem com as emoções nos EUA. A raiva coletiva – para além de posições partidárias – forçou Trump a se retratar sobre a medida que ordenou. No entanto, o dano está feito para milhares de crianças que já foram separadas e sequestradas. Não existe um plano concreto para sua reunificação, ainda que os oficiais do governo assegurem o contrário. Agora uma Corte Federal emitiu uma sentença que ordena a reunião das crianças separadas de seus pais em, no máximo, 30 dias. Uma decisão que seguramente o governo Trump vai apelar, porque não pode cumprir.
Há casos, como o da mãe guatemalteca, em que os pais foram deportados a seus países de origem, enquanto os filhos seguem detidos nos EUA. Há outros casos – parece que a maioria – que não houve processo de unificar os dados das crianças com o dos pais no sistema migratório antes da separação, pois são bebês ou crianças pequenas que não podem falar ou comunicar dados ou informar sobre os seus pais às autoridades, não havendo maneira de reuni-los. Ao menos que todos façam provas de DNA para encontrar seus pais, um processo que poderia demorar anos. Enquanto isso, o dano e o trauma psicológico que estão sofrendo estas crianças seguirão crescendo.
Muitos dos jovens serão introduzidos no sistema de crianças sem pais – já existente nos EUA -, que sofre com a falta de recursos e está repleto de problemas como o abuso sexual e físico, o maltrato e até o tráfico de pessoas. Segundo uma demanda legal feita recentemente pela Promotoria de Nova Iorque contra o governo Trump, uma criança separada de seu pai na fronteira com o México, logo enviada a um refúgio em Nova Iorque, tentou se suicidar saltando da janela de um edifício. Disse que preferia morrer a viver sem os pais. Dezenas de outras crianças migrantes que foram separadas de seus pais estão recebendo tratamento médico por trauma psicológico, depressão e ansiedade. A situação só vai piorar nas próximas semanas e meses.
A Promotoria de Nova Iorque acusa o governo Trump de violar os direitos constitucionais dos migrantes, incluídos seu direito ao devido processo legal e à igualdade. Também acusa o governo de violar suas obrigações internacionais por ignorar as solicitações de asilo dos migrantes vindos pela zona fronteiriça, assim como por criminalizar e encarcerar a todos. Está bem e é necessário que apresentem estas demandas e que lutem dentro dos EUA para frear estas políticas cruéis e desumanas contra os migrantes e, particularmente, contra os latino-americanos. Porém, onde está a condenação internacional contra estas graves violações dos direitos humanos dos migrantes? Onde está a condenação coletiva da América Latina?
O mundo deveria levantar a voz para denunciar Trump e a seu governo por sequestrar milhares de crianças latino-americanas, violando seus direitos humanos e causando-lhes um trauma permanente. Oxalá os governantes e líderes políticos da América Latina tenham a coragem para condenar este monstruoso acontecimento.
* Jornalista e escritora venezuelana-americana. Texto condensado de coluna publicada no portal RT em espanhol em 28/Junho/2018.
Tradução: Leonardo Severo