Bloqueio de Israel impede retirada de bombas não detonadas de Gaza

Em meio aos restos das milhares de bombas de Israel que não explodiram, crianças de Gaza brincam entre a sorte e a morte (AFP)

Limpeza do meio milhão de toneladas de bombas da superfície de Gaza demorará duas ou três décadas, avalia grupo humanitário Humanity & Inclusion, que descreveu a Faixa de Gaza transformada pelos sionistas em um “campo minado”

Gêmeos de seis anos, o menino Yahya e sua irmã Nabila pensaram em aproveitar o cessar-fogo para correr e brincar na Faixa de Gaza, nesta sexta-feira (24), quando ficaram gravemente feridos ao tocar numa bomba israelense que não havia explodido.

O menino, Yahya, estava deitado em uma cama de hospital com o braço e a perna direitos envoltos em bandagens. Nabila está recebendo cuidados no Hospital Patient Friends, com um curativo na testa. Um médico de emergência e pediatra britânico informou que as crianças têm ferimentos com risco de vida, incluindo a perda de uma mão, um intestino perfurado, várias fraturas e a possível perda de uma perna.

A situação é catastrófica, avalia o Centro de Direitos Humanos de Gaza, uma organização civil independente que monitora violações, estimando que cerca de 20.000 bombas e mísseis não detonados permanecem espalhados pelo território. A “armadilha mortal”, conforme apontam as organizações médicas, é que “falamos de um cessar-fogo, mas a matança continua”.

“Voltamos na semana passada”, disse a avó, Hanan Shakshk, em meio à dor. “A vida deles foi arruinada para sempre”, afirmou. Para o avô, Tawfiq Shorbasi, “era como um brinquedo”, frisando que está sendo “extremamente difícil” a luta pela vida, ainda mais com o bloqueio de alimentos e medicamentos.

A família estava limpando os escombros quando ouviu uma grande explosão. “Corremos e encontramos Yahya e Nabila caídos no chão, cobertos de sangue. Eles estavam brincando com um objeto redondo que explodiu no momento em que tocaram”, disse o avô Abu Mohammed, relembrando o caos e a dificuldade de deslocamento.

EXPLOSÕES E PERDAS DE OLHOS E ÓRGÃOS SÃO ROTINA EM GAZA

Em Sheikh Radwan, no norte da Cidade de Gaza, Ahmed, de 10 anos, também foi atingido quando um objeto de metal explodiu perto da barraca temporária da família. “Ahmed achou que era um brinquedo”, disse sua mãe, Salwa Hasanat. “Ouvi a explosão e o encontrei inconsciente, sem a mão direita. Nenhum de nós sabia que esses restos ainda podiam matar”, relatou.

Foi a mesma tragédia que ocorreu com Samer Bahloul, de 13 anos, da área de Tal al-Hawa, que perdeu o olho esquerdo após ter achado uma pequena caixa de metal próximo à sua barraca. Ao tocá-la, explodiu. “Achei que fosse algo útil. Quando acordei, meu pai me disse que eu tinha perdido o olho. Os médicos contaram que era parte de uma bomba”, lamentou.

MEIO MILHÃO DE TONELADAS DE BOMBAS QUE AINDA NÃO EXPLODIRAM

Munições não detonadas durante os ataques e bombardeios do exército israelense em Gaza desde 7 de outubro de 2023 totalizam meio milhão de toneladas de bombas e representam um perigo iminente para os palestinos que buscam nos escombros por seus familiares e pertences, em meio a uma situação devastadora durante a pausa na brutalidade sionista.

“Para eliminar completamente a ameaça de munições não detonadas em Gaza, precisamos da permissão das autoridades israelenses para trazer o equipamento necessário para desarmar os dispositivos”, disse Anna Simonson, oficial do programa do Serviço de Ação contra Minas das Nações Unidas (Unmas) nos territórios palestinos ocupados, neste sábado (25).

Devido às imensas limitações impostas pelo governo de Benjamin Netanyahu, esclareceu a agência, o Serviço de Ação contra Minas não dispõe sequer de um panorama da ameaça de munições não detonadas na Faixa de Gaza. “Até o momento, nossas equipes encontraram mais de 560 dispositivos nas áreas às quais conseguimos acessar sozinhos”, acrescentou.

“Se você estiver considerando uma limpeza completa, isso nunca acontecerá, é subterrâneo. Nós o encontraremos por gerações futuras”, disse Nick Orr, especialista em Descarte de Explosivos da Humanity & Inclusion, comparando a situação com as cidades britânicas após a Segunda Guerra Mundial. “A limpeza da superfície é algo que pode ser alcançado em uma geração, acho que de 20 a 30 anos”, assinalou.

PRÁTICA ISRAELENSE É DE TERRORISMO DE ESTADO

Os restos em decomposição, os sinais de tortura e sofrimento dos seres queridos têm saltado aos olhos na prática israelense de terrorismo de Estado, quando da entrega de corpos de palestinos falecidos sob suas garras.

Pelas fotos, Wahiba Shabat reconheceu de imediato a presença do filho. “O coração de uma mãe sabe”, declarou, mas quando finalmente viu o corpo em decomposição, não teve mais tanta certeza. Afinal, o exército de Israel o entregou nu, com as mãos amarradas nas costas, o maxilar quebrado e sinais evidentes de tortura.

Embora Israel tenha devolvido os corpos como sendo de supostamente “combatentes” palestinos, inúmeras famílias que identificaram os corpos, incluído o de Shabat, asseguraram que eram civis.

O porta-voz do Fundo de Emergência Internacional para Crianças das Nações Unidas (Unicef) alertou que a Faixa de Gaza, região que abriga mais de 2 milhões de habitantes, tem se tornado um “cemitério para crianças e adolescentes”

O governo de Gaza qualificou os ataques de “uma política terrorista organizada” visando terras palestinas, pessoas e todos os aspectos da vida, tanto na Faixa quanto na Cisjordânia reocupada.

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