“A frente não é de esquerda, é uma frente pela democracia”, defendeu.
O ex-governador e ex-ministro Ciro Gomes (PDT) afirmou na sexta-feira (13), em entrevista à BBC Brasil (veja a íntegra abaixo), que está pedindo para que Jair Bolsonaro “fale claramente sobre isso [a fala de seu filho sobre a democracia], porque esse menininho [Carlos] é um percevejo, é irrelevante”, diz.
“Agora, se é isso que pensa o Bolsonaro, a gente precisa dizer com clareza para ele que a imoralidade do PT nos divide, a agenda de costumes tosca nos divide, mas na defesa da democracia nós vamos tocar fogo na rua, fique seu Bolsonaro sabendo. Ele que não avance na direção disso, porque a minha geração sabe o que custou retomar a democracia e ele se elegeu por conta de democracia”, continua Gomes, que afirma estar viajando pelo país em defesa da democracia.
Ciro disse que “o que já está acontecendo e o que vai acontecer no Brasil é tão caloroso, é uma confusão tão gigantesca, que há um poder de combustão imenso nessa crise”.
“Haverá momentos gravíssimos nos próximos seis meses, um ano, um ano e meio, na medida que a ilusão da retórica do Bolsonaro se revelará completamente vã e eu não sei como ele vai reagir a isso, não escapa da minha visão uma renúncia, porque ele não tem psicologia para isso, não tem formação para o contraditório”, disse ele.
Bolsonaro “é uma figura gravemente despreparada e o mundo está, lamentavelmente, vendo isso de uma forma tosca, grosseira, de maneira que o que vai restar do que está hoje ninguém sabe”, prosseguiu o ex-ministro.
O ex-governador disse que a situação está pior do que ele imaginava. “Eu imaginava que, uma vez eleito, e muito despreparado, como sempre soube que ele era, o Bolsonaro iria fazer um esforço, dentro dessa engrenagem da Presidência da República, de acionar a inteligência, a reflexão, para poder minimizar os erros”, afirmou.
“E qual não é minha desagradabilíssima surpresa, eu, que já não esperava nada a não ser o que eu já conheço do Bolsonaro, quando vejo ele montar um governo que tem uma fração, liderada pelo Guedes, que não conhece o Brasil. E que firma uma agenda absolutamente destruidora do nosso tecido econômico (…)”, acrescentou.
“O guru intelectual dessa gente põe em dúvida a esfericidade do planeta, é adepto ou pelo menos acha que precisamos pôr em perspectiva a teoria da Terra plana e, recentemente, só para ficar na última declaração, disse que os Beatles são semianalfabetos e tocavam muito porcamente. Dizer isso para um inglês é de rir para não chorar”, ironizou Ciro.
Ciro criticou os setores que, num momento em que a democracia está ameaçada, optam por uma frente de esquerda. “A frente não é de esquerda, é uma frente pela democracia”, defendeu.
Atacado pelo PT por estar em campanha pela frente democrática contra as ameaças do bolsonarismo, Ciro rebateu. “Quem disse que esse PT é de esquerda? É uma pergunta muito simples. O que é ser de esquerda? Olha aqui, eles governaram o Brasil por 14 anos e nós temos o sistema tributário mais regressivo do planeta Terra. Que o inglês fique sabendo que o imposto aqui sobre lucros e dividendos empresariais não existe. Só no Brasil e na pequena Estônia, no leste da Europa, não tem esse imposto. (…)”, observou.
O ex-governador disse que sempre foi de centro-esquerda e destacou a destruição da indústria brasileira nos últimos anos para questionar a postura do PT. “Onde está o esquerdismo? O Brasil tinha 30% do PIB industrial e hoje é 11%. O Brasil tem a maior crise de endividamento das famílias e das empresas da história. Isso tudo foi política do Lula e da Dilma. Isso não tem nada de esquerda, é populismo, caudilhismo, culto à personalidade”, salientou o ex-ministro.
“No Brasil, é tudo fraude. Então, o PT é um partido de centro-direita, na prática. Por quê? Porque aplicou o neoliberalismo e tentou humanizá-lo. Não tem nenhuma percepção de estratégia de desenvolvimento. Nenhuma. Tanto que a indústria brasileira era 30% do PIB no ano 1980 e hoje é 11%. São números, pelo amor de Deus. Vamos tentar usar a inteligência, para gente se proteger dessa loucura. Então o Bolsonaro, um fascista, um projetinho de Hitler tropical, burro que só uma porta, se afirma de centro. Bolsonaro é ultradireita e não é tão ultradireita porque nem liberal é. É um fascista”, prosseguiu Ciro.
Aos repórteres da BBC, Ciro afirmou que “todas as tentativas do PT de anunciar uma frente de esquerda têm dois vícios. Primeiro: não é nenhuma intenção boa do PT de fazer frente de esquerda, eles querem subjugar o pensamento progressista ao pragmatismo deles, ao hegemonismo deles. Sem nenhuma visão de Brasil”.
“Podemos fazer essa discussão: qual é a visão de Brasil do PT? Qual é a proposta? Qual é a matriz? Qual é o projeto? Para gente poder refletir se isso é progressista radical, progressista moderado, centrista e tal. Não tem esse projeto, nunca teve”, observou.
Comparando o bolsonarismo e o petismo, Ciro disse que “são rigorosamente as duas faces da mesma moeda. Você vê agora, o Bolsonaro está em crise de popularidade. [Ele diz] ‘se vocês falarem mal de mim, o PT vai voltar’. Aí a Gleisi (Hoffmann), presidente do PT, entende a mensagem e diz: ‘não tenho dúvida, 22 vai ser nós contra o Bolsonaro'”.
“Porque agora soubemos pela Vaza Jato que, em pleno galope do golpe, o Lula estava conversando com o Michel Temer, como eu sei concretamente. Eu estava lá nas antecedências do impeachment e vi que a petezada estava já entregando a Dilma”, afirmou Ciro Gomes.
Íntegra da entrevista de Ciro Gomes à BBC Brasil
E a minha geração sabe muito bem o que custou para todos essa falsa democracia onde virou farra para políticos e pessoas de vários escalões do poder público.
Nós compreendemos o seu sentimento. Mas não é bom – porque não é real e verdadeiro – esquecer que foi sob essa democracia que a Operação Lava Jato colocou na cadeia um ex-presidente da República, um ex-presidente da Câmara, dois ex-governadores de um dos Estados mais importantes da federação etc., etc., etc. A mesma Lava Jato que, agora, Bolsonaro quer exterminar para proteger a corrupção da família.