“Isso significa perda do abono para uma grande massa de trabalhadores”, apontou o economista David Deccache
O pacote fiscal anunciado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na última quarta-feira (27) foi classificado como “aberração” pelo economista David Deccache, diretor do Instituto de Finanças Funcionais para o Desenvolvimento (IFFD) e assessor técnico da Câmara dos Deputados. No programa Faixa Livre, da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (Aepet), Deccache condenou as medidas que, em suas palavras, constituem um ataque às conquistas da classe trabalhadora.
Entre outras propostas, Haddad apresentou um pacote que limita a valorização do salário mínimo a um teto fiscal, aplicando a mesma medida a benefícios sociais, como o abono salarial e ao BCP – Benefício de Prestação Continuada. Segundo o economista, a isenção do imposto de renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil e o aumento da alíquota para quem recebe mais de R$ 50 mil, apresentados como medidas “compensatórias” do ajuste, não compensam em nenhuma hipótese os prejuízos para os trabalhadores.
“Se você tem uma medida que prejudica todos, absolutamente todos os trabalhadores que ganham até dois salários mínimos, há algo que compense isso? Não”.
Segundo a proposta, o pagamento do abono salarial, atualmente benefício de todos os trabalhadores que ganham até dois salários mínimos, seria reduzido à faixa de trabalhadores que recebem até R$ 2.640. Além disso, a correção do abono não estará mais vinculada ao reajuste do salário mínimo. Ele será reajustado pela inflação nos próximos anos até que o benefício atinja o limite de um salário mínimo e meio.
“Isso significa perda do abono para uma grande massa de trabalhadores: garçons, motoristas de ônibus, trabalhadoras domésticas, da saúde. Isso é factual, o Haddad anunciou”, completa.
“O governo ainda propôs a redução da taxa de crescimento do salário mínimo. Nesses moldes, o salário mínimo cresceria muito inferior à taxa de crescimento observada historicamente nos governos de Lula”, afirma Deccache.
“A classe trabalhadora está sendo atacada, mas eis aqui o mais grave: qual é a parcela da população mais vulnerável hoje no país? São os beneficiários do BPC que recebem um salário mínimo e que ganham até um quarto do salário mínimo por pessoa da família. São pessoas idosas, deficientes e, cumulativamente, em situação de extrema pobreza. O BPC foi duplamente atacado, primeiro porque está atrelado à valorização do salário mínimo cuja taxa será reduzida. E isso ao longo do tempo importa muito”.
“Em termos macroeconômicos, globais, o valor destinado ao BPC no Brasil será reduzido. Se você vai cortar do BPC, quer dizer objetivamente que pessoas em extrema pobreza vão perder. Se a intenção de cortar bilhões do BPC é justiça dentro do programa e não austeridade fiscal, você pega os R$ 5 bi e incorpora novas pessoas que precisam do benefício”, argumenta.
Concluindo a análise do pacote, Deccache afirma que as propostas de aumento de arrecadação para promoção do “ajuste fiscal”, como a taxação dos mais ricos e estabelecimento de um teto para supersalários parecem apenas legitimar a redução de direitos dos mais pobres.
“O discurso sempre foi: vamos taxar os mais ricos para dar aos mais pobres. Pela primeira vez na história uma medida propõe taxar os mais ricos para legitimar a redução de direito dos mais pobres. Eu nunca vi isso na minha vida, é uma aberração você falar que vai taxar os mais ricos para poder tirar dos mais pobres”.
Assista a entrevista na íntegra: